Imagine uma batalha na diretoria de uma empresa multibilionária cuja tecnologia futurista pode salvar ou destruir o mundo.
O seu principal executivo, que é ouvido por líderes mundiais, foi derrubado quando colegas seniores se voltaram contra ele - apenas para o resto da empresa exigir que eles próprios fossem demitidos.
Não, esse não é o roteiro de um drama da Netflix, mas os últimos dias na OpenAI, a empresa criadora do ChatGPT.
Jornalistas de tecnologia, entusiastas e investidores têm observado o desenrolar dos fatos - mas as opiniões divergem sobre a situação é um thriller ou uma farsa.
Pegos de surpresa
A batalha no topo da OpenAI, criadora do chatbot ChatGPT, começou muito repentinamente na sexta-feira (17/11), quando o conselho de administração anunciou que estava demitindo o cofundador e presidente da empresa, Sam Altman.
Em uma postagem no blog da empresa, o conselho acusou Altman de não ser “consistentemente sincero em suas comunicações” e disse que, como resultado, o conselho “perdeu a confiança” em sua liderança.
Há apenas seis pessoas nesse conselho – e duas delas eram Sam Altman e o cofundador Greg Brockman, que pediu demissão depois que Altman foi demitido.
Assim, quatro pessoas que conheciam bem Altman e a empresa chegaram a um ponto de ruptura tão sério que entraram em ação imediatamente, surpreendendo toda a comunidade tecnológica, incluindo, alegadamente, os seus próprios investidores.
Elon Musk – também cofundador original da OpenAI – escreveu no X, antigo Twitter, que estava “muito preocupado”.
Ilya Sutskever, o cientista-chefe da empresa, era membro desse conselho e disse que “não tomaria medidas tão drásticas a menos que sentisse que era absolutamente necessário.”
Sutskever depois se arrependeu e postou que “não tinha a intenção de destruir a empresa”.
Ele é um dos muitos signatários de uma carta-dinamite ao conselho pedindo o regresso de Altman e Brockman e sugerindo que os funcionários vão deixar a OpenAI se os dois executivos não voltarem aos seus cargos.
Qual o motivo da briga?
Na verdade, ainda não se sabe exatamente o que desencadeou essa briga, mas existem algumas hipóteses.
Há relatos de que Altman estava considerando alguns projetos de hardware, incluindo o financiamento e o desenvolvimento de um chip de inteligência Artificial, o que seria uma direção bem diferente da qual a OpenAI está indo atualmente.
Há suspeita de que ele havia assumido alguns compromissos dos quais o conselho não tinha conhecimento.
Ou então a briga poderia resumir-se a uma questão de dinheiro.
Em um memorando interno, que depois foi amplamente divulgado, o conselho deixou claro que não acusava Altman de qualquer “prejuízo financeiro”.
Mas sabemos que a OpenAI foi fundada como uma organização sem fins lucrativos. Isso significa uma empresa que não tem como objetivo ganhar dinheiro.
Ela retira o suficiente do que traz para cobrir seus próprios custos operacionais - e qualquer extra é investido de volta no negócio. A maioria das instituições de caridade não tem fins lucrativos.
Em 2019, foi formado um novo braço da empresa – e esta parte era orientada para o lucro. A empresa definiu como os dois coexistiriam.
O lado do lucro seria liderado pelo lado sem fins lucrativos, e haveria um limite imposto aos retornos que os investidores poderiam obter.
Nem todo mundo ficou feliz com isso - isso foi apontado como um dos principais motivos por trás da decisão de Elon Musk de se afastar da empresa.
A OpenAI, no entanto, agora se encontra na situação bastante favorável de valer muito dinheiro.
Uma venda de ações de funcionários, que acabou não acontecendo, foi avaliada em US$ 86 bilhões.
Será que havia ambições de tornar o lado lucrativo do negócio mais poderoso?
Como isso vai acabar?
A OpenAI tem o objetivo de desenvolver uma inteligência artificial geral.
Esse tipo de inteligência artificial ainda não existe e gera apreensão e admiração.
As inteligências artificiais que existem hoje são capazes de realizar apenas uma tarefa.
O ChatGPT, por exemplo, é um robô de produção de textos em forma de conversas, mas não é capaz de pensar por si próprio.
Uma inteligência artificial geral seria capaz de realizar diversas tarefas ao mesmo tempo, de pensar e executar ações como um humano.
Ela teria o potencial de mudar todas as áreas do conhecimento e da atividade humana.
Será que a OpenAI está mais perto disso do que imaginamos, e Altman sabe disso? É bastante improvável.
Em uma palestra recente, ele disse que o que estava por vir no próximo ano faria o atual ChatGPT parecer “um parente distante”.
Emmett Shear, o novo presidente-executivo interino da OpenAI, postou no X que “o conselho *não* removeu Sam (do cargo) por causa de qualquer discordância específica sobre segurança”.
Ele diz que haverá uma investigação sobre o que aconteceu.
Mas a Microsoft, a maior investidora da OpenAI, decidiu não arriscar que Altman leve esta tecnologia para outro lugar.
Foi anunciado que ele se juntará à gigante da tecnologia para liderar uma equipe de pesquisa de inteligência artificial ainda a ser criada.
Seu cofundador Greg Brockman vai com ele, e, a julgar pelo número de membros da equipe postando no X hoje, parece que ele também levará alguns dos principais talentos da OpenAI.
Muitos membros da equipe da OpenAI estão compartilhando a mesma postagem no X que diz que a OpenAI “não é nada sem seus funcionários”.
Isso é um aviso a Shear de que ele pode ter contratações a fazer? Pode ser.
Na manhã de segunda-feira (20/11), na sede da OpenAI em São Francisco, não havia sinais de pessoas chegando para trabalhar.
Mas pode ser também um lembrete de que, apesar de toda esta saga ter sido sobre uma forma como a tecnologia que está remodelando o mundo, ela é, no fundo, um drama muito humano.
Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores pelo e-mail sredat.df@dabr.com.br