"Acordamos todos os dias nos preparando para morrer. A ideia de morte se tornou algo mais próximo do que a vida em Gaza", desabafou ao Correio a ativista de direitos humanos e jornalista palestina Maha Hussaini, moradora da Cidade de Gaza. "Cada dia é pior do que o anterior. A escala dos ataques aumenta; mais civis são mortos; prédios, derrubados; e mais bairros, destruídos", afirmou. Um alívio momentâneo nos bombardeios esbarra em Israel.
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Depois de o Conselho de Segurança da ONU aprovar uma resolução que pede "pausas humanitárias e corredores humanitários amplos e urgentes" para permitirem a chegada de ajuda à Faixa de Gaza, o governo de Benjamin Netanyahu se opôs à medida. A chancelaria israelense declarou que pausas prolongadas são "insustentáveis, enquanto 238 reféns permanecem nas mãos dos terroristas do Hamas".
O corpo de Yehudit Weiss, 65 anos, um dos civis capturados pelo grupo, em 7 de outubro, foi encontrado próximo ao Hospital Al-Shifa, no centro da Cidade de Gaza. Yehudit morava no kibbutz de Be'eri, tratava um câncer de mama e teve o marido executado pelo Hamas.
Em meio aos bombardeios, pelo menos 1,65 milhão de pessoas foram forçadas a deixarem suas casas. Segundo a ONU, isso equivale a dois terços da população do enclave, que correm risco de morrer de fome. Em entrevista ao Correio, Alon Ben-Meir — professor de relações internacionais da Universidade de Nova York — classifica como "importante" a resolução, mas duvida de sua implementação por Israel. "De qualquer forma, haverá uma pressão intensificada para que Israel a obedeça e, no mínimo, interrompa os combates por um ou dois dias. Isso também ajudará nas negociações para a libertação de alguns dos sequestrados, especialmente mulheres e crianças". Ben-Meir acredita que Israel deve interromper a campanha militar para permitir que a ajuda humanitária chegue a dezenas de milhares de palestinos. "Muitos deles estão prestes a morrer de fome."
Pelo segundo dia consecutivo, as Forças de Defesa de Israel (IDF) realizaram revistas no Al-Shifa, o maior hospital da Faixa de Gaza. O Exército afirma que, na quarta-feira, encontrou no local "munições, armas e equipamento militar" pertencentes ao Hamas, inclusive coletes usados por homens-bomba. Israel também disse que, no Al-Shifa, foram recuperados computadores com informações e "imagens relacionadas aos reféns" de 7 de outubro. "Os soldados estão revistando cada andar, prédio por prédio, embora centenas de pacientes e pessoal médico ainda estejam no local", informou um responsável das forças de segurança de Israel.
Ante a suposta destruição do serviço de radiologia e os danos aos serviços de tratamento de queimaduras e de diálise do complexo hospitalar, o porta-voz do Ministério da Saúde do Hamas, Ashraf Al Quedra, advertiu que "milhares de mulheres, crianças, doentes e feridos estão em perigo de morte".
"Assassinada"
De acordo com as IDF, o corpo da refém Yehudit Weiss "foi retirado pelas tropas de uma estrutura adjacente ao Hospital Al Shifa e transportado até o território israelense". "Yehudit foi assasssinada pelos terroristas da Faixa de Gaza. Não conseguimos chegar a tempo para resgatá-la", lamentou Daniel Hagari, porta-voz das IDF. No local onde o corpo foi encontrado, os soldados também encontraram fuzis Kalashnikov e lança-foguetes. A notícia da morte de Yehudit causou comoção entre os familiares de sequestrados que participam de uma marcha de 63km entre Telavive e Jerusalém, com o objetivo de pressionar Netanyahu.
"Estou com o coração partido, agora, para falar", desabafou Yuval Haran, 36 anos, organizador da marcha e morador também do kibbutz de Be'eri. "Eu só choro", acrescentou ele, que teve o pai e dois tios assassinados, e sete membros da família sequestrados, inclusive a mãe e a irmã. Também participante da marcha, o estudante Ilay David, 26, pede pela libertação do irmão Evyatar David, 22, sequestrado durante a festa rave Super Nova no kibbutz de Re'im, na manhã de 7 de outubro. "Sentimos muito pela morte de Yehudit. É uma notícia terrível e triste. Enviamos conforto e apoio à família dela. Esperamos que seja a última notícia ruim", disse ao Correio, por telefone.
Ilay explicou que o fato de cidadãos de várias partes de Israel se unirem à marcha, prevista para chegar ao Knesset (Parlamento) amanhã, aquece os corações das famílias. "O evento simboliza nossa intenção de nunca pararmos até que os reféns voltem para casa", comentou. Ele perdeu o contato com Evyatar às 5h45 (hora local). "Meu irmão foi sequestrado com o melhor amigo. Dois outros amigos foram assassinados. Ele é gerente de uma cafeteria em Kfar Saba, perto de Tel Aviv, e estava economizando dinheiro para uma viagem à Tailândia, em duas semanas. Ele ama a vida, boa comida e uma noite de sono. É o tipo de cara que aproveita a vida ao máximo, além de ser sensível e amar a dança." As únicas informações sobre Evyatar são vídeos publicados pelo Hamas no Telegram, nos quais ele aparece caminhando, aterrorizado, amarrado e humilhado.
EU ACHO...
"A criação de uma zona segura em Gaza poderia ser feita pelas agências da ONU. Além de aceitável para os dois lados do conflito, a medida seria complementar à resolução das Nações Unidas aprovada na terça-feira, desde queatenda à 'preocupação' israelense de que extremistas do Hamas não se infiltrariam entre os palestinos necessitados. Essa é uma forma dealiviar a pressão horrível sobre os palestinos, especificamente sobre mulheres e crianças. Catar e EUA, que fazem a mediação entre Israel e Egito, são os únicos capazes de garantir que as zonas segurassejamaceitas por ambos os lados."
Alon Ben-Meir, professor de relações internacionais da Universidade de Nova York