Gaza

Al-Shifa: BBC entra no maior hospital de Gaza com Exército de Israel

Israel acusa Hamas de operar rede de túneis subterrâneos, inclusive sob o complexo hospital de Al-Shifa; não foram autorizadas entrevistas com médicos, pacientes ou desalojados.

Acesso da equipe da BBC ao hospital Al-Shifa foi limitado pelas Forças de Defesa de Israel; jornalista não foi autorizada a falar com médicos ou pacientes -  (crédito: BBC)
Acesso da equipe da BBC ao hospital Al-Shifa foi limitado pelas Forças de Defesa de Israel; jornalista não foi autorizada a falar com médicos ou pacientes - (crédito: BBC)
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Lucy Williamson - BBC News
postado em 16/11/2023 13:34 / atualizado em 16/11/2023 15:18

Entramos no hospital Al-Shifa, o maior da Faixa de Gaza, na escuridão, por cima de um muro na cerca perimetral que separa o território palestino de Israel – ele foi derrubado por uma escavadeira blindada na terça-feira (14/11) para permitir um acesso mais seguro às forças israelenses.

A BBC e mais outra emissora foram os primeiros veículos de comunicação convidados pelos militares israelenses para ver, em primeira mão, o que Israel diz ter encontrado no local.

Qualquer luz extra aqui é arriscada, então tateamos pelo complexo hospitalar, seguindo as tropas fortemente armadas enviadas para nos escoltar — contornando tendas improvisadas, escombros e pessoas dormindo.

Os médicos do hospital dizem que trabalham há dias sem energia, comida ou água — e que, como resultado, pacientes gravemente doentes morreram, incluindo bebês recém-nascidos. As pessoas deslocadas pelos combates em Gaza estão abrigadas no complexo hospitalar.

Já Israel alega que o Hamas opera uma rede de túneis subterrâneos, inclusive sob o hospital Al-Shifa.

Os militares mascarados que nos conduzem para dentro do prédio, por meio de escombros e vidros quebrados, são um sinal de que a situação ainda é muito tensa aqui.

A nossa presença, apenas um dia depois de Israel ter tomado o controle do hospital, diz muito sobre sua motivação para mostrar ao mundo porque está neste local.

Nos corredores bem iluminados da unidade de ressonância magnética, o tenente-coronel Jonathan Conricus, porta-voz das Forças de Defesa de Israel, nos mostra três pequenos esconderijos de Kalashnikovs, munições e coletes à prova de balas — ele alega que foram encontradas cerca de 15 armas ao todo, junto com algumas granadas.

Conricus também nos mostra alguns livretos e panfletos militares, e um mapa que ele diz estar marcado com possíveis rotas de entrada e saída do hospital.

Segundo Conricus, isso é uma prova de que o Hamas utiliza hospitais para fins militares.

"[E] descobrimos muitos computadores e outros equipamentos que poderiam realmente esclarecer o que está acontecendo agora e também, com esperança, a situação dos reféns."

Os laptops, diz ele, contêm fotos e vídeos de reféns, registrados após serem levados para Gaza.

Também foram recentemente divulgadas imagens, compartilhadas pelas autoridades israelenses, dos interrogatórios dos combatentes do Hamas detidos após os ataques de 7 de outubro.

A BBC não teve acesso ao conteúdo dos laptops.

Segundo Conricus, trata-se de uma indicação de que o Hamas esteve aqui "nos últimos dias".

"No fim das contas, esta é apenas a ponta do iceberg", afirma ele. "O Hamas não está aqui porque viu que estávamos chegando. Provavelmente foi isso que eles foram forçados a deixar para trás. Nossa avaliação é que há muito mais."

O Exército de Israel passou semanas lutando para chegar aos portões do hospital. As ruas ao redor foram palco de alguns dos combates mais violentos em Gaza nos últimos dias.

Nossa visita foi rigidamente controlada; tínhamos um tempo muito limitado no local e não fomos autorizados a falar com médicos ou pacientes.

A nossa viagem a Gaza, num veículo blindado de transporte de pessoal hermeticamente protegido da escuridão exterior, seguiu o caminho das primeiras grandes incursões terrestres de Israel em Gaza, semanas atrás.

Nas telas dentro do veículo militar, as fazendas se transformavam gradativamente em um cenário desolador, com ruas repletas de destroços e edifícios completamente desmoronados.

Ao sul da Cidade de Gaza, paramos para trocar de veículo, escalando montanhas ondulantes de metal retorcido e grandes pedaços de entulho e concreto.

Pequenos grupos de soldados agachavam-se perto de pequenas fogueiras, preparando um jantar improvisado ao lado das fileiras de tanques. “É uma receita secreta”, brinca um deles.

Acima deles, edifícios em ruínas. Pude ver a porta de metal de uma loja amassada, meio aberta.

Uma Estrela de Davi estava rabiscada numa parede com tinta spray vermelha; dentro dela alguém havia escrito IDF (sigla em inglês para Forças de Defesa de Israel), e acima dela, as palavras: "Nunca Mais".

Os ataques de 7 de Outubro forçaram uma mudança no cálculo estratégico de Israel no seu duradouro conflito com o Hamas.

O governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu prometeu pôr fim a anos de um impasse apreensivo, reivindicando destruir o poder militar e político do grupo palestino, designado como organização terrorista pelo Reino Unido, pelos EUA e outros países.

Isso significa chegar ao coração da Cidade de Gaza, incluindo o interior de Al-Shifa.

As forças israelenses ainda estão buscando os túneis sob o hospital para onde acreditam que os combatentes do Hamas possam ter fugido, talvez com alguns dos reféns.

Esse edifício tornou-se um foco central da guerra de Israel, descrito como um importante centro de comando, e até mesmo o "coração pulsante" das operações do Hamas.

E na brutal guerra de informação que acompanha este conflito, este é a hora da verdade para Israel.

Depois de quase 24 horas revirando o hospital de cabeça para baixo, Israel diz ter encontrado armas e outros equipamentos que poderiam ajudar a fornecer informações sobre os combatentes do Hamas e os reféns. Mas, por enquanto, ainda está de mãos vazias.

Deixamos o hospital e descemos a larga avenida que leva à estrada que margeia a costa de Gaza. A Cidade de Gaza é agora governada por tanques. As avenidas fantasmagóricas em alguns lugares parecem uma zona de terremoto, tamanha a destruição.

Está claro o que foi necessário para Israel assumir o controle destas ruas.

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