Os hospitais do norte da Faixa de Gaza alertaram ontem que sua situação é cada vez mais crítica, em meio aos combates nas imediações entre tropas israelenses e milicianos do Hamas, e pela falta de recursos.
Além de pacientes e médicos, os hospitais abrigam milhares de civis que tentavam fugir dos incessantes bombardeios. "Se sairmos, seremos alvejados", afirma Ahmed al Shawa, de 18 anos, que chegou a Al Shifa após fugir de seu bairro Tel al Hawa, na Cidade de Gaza, onde as tropas israelenses lutam contra os integrantes do movimento palestino Hamas.
Como todos os demais deslocados em Al Shifa, Ahmed abandonou o pátio do hospital para se instalar em uma enfermaria lotada dentro do centro médico. O jovem contou que estilhaços caíram no pátio, onde os refugiados estavam instalados em barracas precárias. Nos corredores e entre os leitos do hospital se amontoam doentes, feridos e deslocados.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), 20 dos 36 hospitais de Gaza "não funcionam mais", na quinta semana do conflito deflagrado pelo ataque sem precedentes do movimento islamista palestino Hamas.
O hospital Al Shifa, na cidade de Gaza, o mais importante do território, "foi alvo, durante toda a noite, de intensos disparos de artilharia, assim como outros hospitais da cidade", declarou seu diretor, Mohammed Abu Salmiya neste sábado, acrescentando que, por causa disso, as ambulâncias não conseguiram buscar dezenas de mortos e centenas de feridos.
O governo do Hamas anunciou que os "ataques" e "bombardeios" israelenses contra Al Shifa ocorreram em dois momentos distintos, com cerca de 20 minutos de diferença entre um e outro.
O Exército israelense negou ter atacado o perímetro hospitalar. "Nas últimas horas, informações falsas foram divulgadas de que estamos cercando e atacando o hospital Al Shifa", disse o porta-voz do Exército israelense, Daniel Hagari, aos jornalistas. Ele também sustentou que o ataque ao hospital, na sexta-feira, foi na verdade "um foguete mal disparado pertencente a organizações terroristas na Faixa de Gaza".
Há anos o exército israelense acusa o Hamas de utilizar os hospitais para esconder seus combatentes, armas e túneis. O primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu afirmou que "a responsabilidade por qualquer dano aos civis recai sobre o Hamas", pois, segundo ele, o movimento usa a população "como escudos humanos".
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Morte de bebês
Dois bebês prematuros morreram em Al Shifa, ao longo do sábado, devido à interrupção de seu tratamento causada por cortes de energia, e as vidas de outros 37 estão "em risco real", afirmou a ONG israelense Médicos pelos Direitos Humanos, citando médicos do complexo hospitalar palestino. "Devido à falta de energia elétrica, podemos informar que a unidade neonatal de cuidados intensivos parou de funcionar", informou nota emitida pela ONG na noite de ontem.
Apesar de negar os ataques, o exército israelense afirmou que ajudará a evacuar bebês do Hospital Al Shifa. "A equipe do Hospital Al Shifa solicitou nossa ajuda para transferir os bebês da unidade de pediatria para outro hospital mais seguro amanhã", declarou, ontem, o porta-voz do Exército israelense, Daniel Hagari.
Israel também anunciou a abertura, até meados da tarde de ontem, das duas rotas de saída da Cidade de Gaza para o sul, como fez no dia anterior. Mas os deslocados refugiados em Al Shifa acreditam que esses corredores estão fora de seu alcance.
"Não vamos sair"
Mohamed Abu Salmiya, motorista de ambulância do Al Shifa, afirma que permanecerá ali "até o final, aconteça o que acontecer", apesar de, neste momento, não ser possível fazer o seu trabalho. "Desde ontem, os franco-atiradores disparam diretamente contra nossas ambulâncias", disse.
"Não vamos sair daqui. Funcionaremos à luz de velas se necessário", promete o diretor do hospital, Mohamed Abu Salmiya, que relatou que, durante a noite, "a eletricidade foi cortada durante quatro horas" depois que um "gerador foi atingido pelos ataques".
A médica Marwa Abu Sada, chefe da unidade de cirurgia, disse à ONG Medical Aid for Palestinians que "ninguém pode sair do hospital. As pessoas que tentaram sair foram baleadas. Alguns morreram, outros ficaram feridos."
Assassinatos na ONU
Segundo o balanço revisado pelas autoridades israelenses, 1.200 pessoas, a maioria civis, morreram em seu território durante o ataque do Hamas, em 7 de outubro. Do outro lado da fronteira, os bombardeios e a operação terrestre lançada em represália por Israel deixaram mais de 11.000 mortos na Faixa de Gaza, incluindo mais de 4.500 crianças, segundo o Ministério da Saúde do Hamas.
Nas estimativas da Organização das Nações Unidas, desde o início da guerra, 10.818 pessoas foram mortas em Gaza. Entre elas estão 100 funcionários da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados Palestinos (UNRWA, na sigla em inglês), nove dos quais foram mortos somente neste sábado.
O número corresponde ao recorde de trabalhadores humanitários mortos em conflito na história das Nações Unidas, segundo dados divulgados ontem pela organização. "A proteção dos civis é fundamental, inclusive em tempos de conflito. Eles deveriam ser protegidos de acordo com as leis de guerra", afirmou Juliette Touma, porta-voz da UNRWA.
Pós-guerra
Em pronunciamento na televisão ontem, o premier israelense disse que exclui a possibilidade de que a Autoridade Palestina, que atualmente administra de forma parcial a Cisjordânia ocupada, tenha um papel em Gaza quando a guerra entre Israel e o movimento islamista Hamas nesse território se encerrar.
"Não pode haver lá uma autoridade dirigida por alguém que, mais de 30 dias após o massacre [cometido pelo Hamas em 7 de outubro], ainda não o tenha condenado. Haverá algo diferente lá. Em todo caso, terá que haver um controle sobre a segurança", disse Netanyahu.
*Com informações da AFP
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