Equipes de resgate libanesas chegam a um local de bombardeio israelense em caminhões velhos e sem equipamentos de proteção, um exemplo que ilustra a falta de preparo em um país atingido por uma longa crise e que teme a escalada do conflito entre Israel e Hamas.
"Estamos na linha de frente, entretanto, não temos equipamento para nos proteger e salvar as pessoas", afirma Anis Abla, chefe da Defesa Civil de Marjayoun, a menos de 10 quilômetros da fronteira com Israel.
Ele afirma não ter meios para comprar capacetes ou coletes à prova de balas para sua equipe de 37 personas, a maioria voluntários.
Desde o ataque do grupo islamista palestino Hamas contra Israel, em 7 de outubro, as trocas de tiros são quase diários na fronteira. O movimento pró-Irã Hezbollah e seus aliados afirmam bombardear Israel em apoio ao Hamas, mas até o momento os confrontos são limitados.
Em meio a um colapso econômico que já dura quatro anos, o Líbano teme ser arrastado para o conflito. O país não está preparado para enfrentar uma guerra, o que faz com que voluntários e ONGs tenham que preencher a lacuna com recursos limitados.
"Se a guerra eclodir, poderemos não ser capazes de fornecer água suficiente para os nossos caminhões (para combater incêndios) ou comida para as nossas equipes", informou Abla.
"Repetição de 2006"
Considerando que o Estado está quebrando e só consegue fornecer eletricidade durante algumas horas por dia, bombas de água mal funcionam, o que faz com que caminhões dos bombeiros tenham acesso limitado à água, explica Hussein Fakih, chefe da Defesa Civil da região sul de Nabatiyé, onde Marjayoun está localizado.
"Nosso veículo mais novo tem uns 30 anos", lamenta Fakih, acrescentando que estes caminhões quebram regularmente. "Se a situação piorar (...), não poderemos cumprir com todas as nossas tarefas".
Os confrontos transfronteiriços deixaram pelo menos 62 mortos no Líbano, segundo contagem da AFP, a maioria combatentes do Hezbollah, e obrigaram quase 29 mil pessoas a deixarem suas casas.
A alguns quilômetros de Marjayoun, Hasbaya acolheu centenas de deslocados, dos quais 150 foram instalados em um hotel cuja construção ainda não foi concluída, segundo o prefeito da cidade, Lalbib al-Hamra.
As autoridades locais tiveram que recorrer ao envio de dinheiro de cidadãos de seu país, associações e doadores para conseguir fornecer colchões, alimentos e medicamentos aos deslocados, explica o prefeito.
"Meu maior medo é que se repita o cenário de 2006, mas pior. Atualmente o Estado libanês não está preparado para enfrentar este tipo de calamidade", disse al-Hamra.
Em 2006, uma guerra entre Hezbollah e Israel deixou mais de 1.200 mortos no Líbano, sobretudo civis, e 160 em Israel, a maioria soldados.
"Nosso Estado está morto"
O governo interino elaborou um plano de emergência e está dialogando para "garantir que a comunidade humanitária contribua" com financiamento, segundo o primeiro-ministro Najib Mikati, que afirmou à AFP na segunda-feira estar fazendo tudo o possível "para que o Estado e seus modestos meios estejam preparados" em caso de conflito.
O ministro da Saúde, Firas Abiad, destacou, por sua vez, que o país enfrenta obstáculos sem precedentes, sendo necessários entre US$ 30 a 40 milhões (de R$ 150 a 200 milhões, na cotação atual) para elaborar o plano, acrescentando que "o Líbano está fazendo tudo o possível para aumentar o seu nível de preparação", apesar de ter recursos "muito mais limitados".
Muitos libaneses, porém, perderam a confiança na capacidade de proteção fornecida pelo Estado. Entre eles, Ali Khalil Awada, 74 anos, que está abrigado no hotel Hasbaya com sua esposa em um quarto estreito e mal mobiliado.
"Nosso Estado está morto... E nossa economia foi embora. Não temos nem como comprar pão", lamenta ele, que já foi deslocado diversas vezes, mas garante que agora "é a pior".
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