Ante a mais grave crise de segurança das últimas décadas em Israel, adversários políticos uniram fileiras para combater um inimigo em comum. O premiê Benjamin Netanyahu e o líder do partido Unidade Nacional, Benny Gantz, decidiram formar um governo de emergência, que funcionará como um gabinete de guerra. "O destino do país está em jogo. (...) A unidade entre as pessoas em momentos de dor e de tristeza ressoa em todo o mundo. O Hamas é o Daesh (acrônimo para Estado Islâmico) e nós vamos esmagá-los, assim como o mundo destruiu o Daesh", avisou Netanyahu.
- Guerra Israel-Hamas: Ministro levanta restrições na invasão a Gaza
- Ao Correio, israelense diz que reconheceu família sequestrada em vídeo do Hamas
- Cerca de US$ 1 bi e drones: saiba como é a segurança da fronteira em Gaza
O primeiro-ministro também enviou um recado ao grupo terrorista que controla a Faixa de Gaza: qualquer membro do Hamas será considerado um "homem morto". "Há um tempo para a paz e um tempo para a guerra; agora, é o momento da guerra", disse Gantz, ao ressaltar que Israel enfrenta sua hora mais dura e que a parceria irá assegurar a vitória. "O inimigo será aniquilado com todos os meios necessários." A reportagem tentou entrar em contato com Mutee Abu Musabeh, chefe do Departamento de Mídia Estrangeira do Hamas, mas não obteve resposta.
Além dos 1,2 mil mortos nos atentados da manhã de sábado (7/10), os bombardeios israelenses na Faixa de Gaza mataram pelo menos 1,1 mil e deixaram 5,3 mil feridos. Até a noite desta quarta-feira (11/10), o cerco ao enclave estava prestes a ser completado, com 300 mil soldados das Forças de Defesa de Israel (IDF) posicionados na fronteira. Uma fonte do Exército isralense admitiu ao Correio que a invasão terrestre provavelmente ocorrerá entre quinta-feira (12) e sexta-feira (13).
Um porta-voz das Nações Unidas anunciou que 11 funcionários da organização — cinco professores, um ginecologista, um engenheiro, um conselheiro e três membros do pessoal de apoio — e 30 estudantes da UNRWA agência de assistência aos refugiados palestinos morreram desde o sábado.
Os 2,3 milhões de palestinos concentrados em uma das áreas de maior densidade demográfica do planeta estão à beira de uma catástrofe humanitária. O bloqueio imposto por Israel, que proibiu a entrada de combustível e desconectou a única central elétrica, deixou a Faixa de Gaza praticamente às escuras, à exceção de poucas casas e prédios supridos com gerador.
Ahmed Abu Artema, 36 anos, morador da Cidade de Gaza, descreveu a situação como "horrorosa" e "desastrosa". "Israel está produzindo mais e mais pogroms", afirmou ao Correio, ao citar um termo russo usado para designar um comportamento cruel organizado ou o assassinato de um grande grupo de pessoas por sua raça ou religião. "Há pouco, os aviões bombardearam uma casa da família Alkurd e muitos morreram."
Abu Artema lembrou que Israel interrompeu o fornecimento de diesel para geradores, de eletricidade e de todos os suprimentos para Gaza. "Estamos sem energia elétrica, o acesso à internet é muito ruim. O pior ainda está por vir. Também não temos água e há escassez de alimentos nos mercados. Cerca de 250 mil palestinos estão desabrigadas."
O presidente dos EUA, Joe Biden, instou Netanyahu a "seguir as normas da guerra". Existe o temor de que Israel intensifique a ofensiva e aumente ainda mais o número de baixas civis. "O único que lhe disse é sobre a real importância de que Israel, com toda a raiva e frustração... existentes, atue sob as normas da guerra", comentou Biden, ao falar sobre a conversa por telefone que teve com o premiê israelense.
Holocausto
Ante líderes da comunidade judaica dos EUA, na Casa Branca, o democrata disse que os ataques terroristas do último sábado (7) correspondem ao "dia mais mortal para os judeus desde o Holocausto". Biden advertiu Teerã, que apoia e é acusado de financiar o Hamas e o Hezbollah no Líbano: "Deixamos claro aos iranianos: tenham cuidado".
Na opinião de Eytan Gilboa — professor de ciência política da Universidade Bar-Illan (em Ramat Gan, subúrbio de Tel Aviv) —, o fato de Gantz e Gadi Eizenkot, ex-chefe do Estado-Maior de Israel, terem aderido ao gabinete de guerra de Netanyahu ajudará a planejar os próximos passos da campanha militar contra o Hamas e a Jihad Islâmica. "A etapa seguinte será concebida para destruir as capacidades militares e de governo das duas organizações terroristas. O gabinete está autorizado pelo governo a tomar decisões", explicou ao Correio.
Gilboa adverte que a destruição da infraestrutura e da cadeia de comando do Hamas será uma tarefa difícil. "As IDF estão planejando uma surpresa tática que reduzirá substancialmente o poder de combate do Hamas e da Jihad Islâmica. A manobra terrestre poderá ser lenta, para evitar o maior número de baixas entre as tropas israelenses e os civis palestinos", observou. Ele aposta que a meta será remover as duas organizações do poder em Gaza e transferir o controle para a Autoridade Palestina.
A invasão a Gaza precisa ser bem planejada para preservar os cerca de 150 reféns de várias nacionalidades mantidos pelo Hamas. O secretário-geral da ONU, António Guterres, exortou o Hamas a imediatamente liberar todos os sequestrados mantidos no território palestino. "Os civis devem ser protegidos todas as vezes. O direito humanitário internacional deve ser respeitado e mantido." O presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, negocia com o Hamas para tentar conseguir a libertação de sequestrados.
Cientista político da Universidade de Tel Aviv, Uriel Abulof vê a possibilidade de o Hamas mostrar-se disposto a libertar mulheres, crianças e idosos, em troca de prisioneiros palestinos. Ele advertiu sobre o risco de espalhamento do conflito. "Se Israel entrar de forma substancial em Gaza, será atacado em sua fronteira norte. Talvez vejamos uma escalada também na Cisjordânia. Acho que isso é parte de um plano do Irã para Israel", afirmou ao Correio.
DEPOIMENTO
"Sou soldado e minha mãe foi executada pelo Hamas"
"Esta é uma guerra entre o bem e o mal. No sábado pela manhã, minha irmã me ligou e me disse que nossa casa estava sob ataque de grupos terroristas. Coloquei munições nas armas e fomos para lá. Apenas eu e meu irmão. No caminho, vimos corpos em todos os lugares. Armados, fomos procurar por ela. Esperávamos levar nossa mãe para casa em segurança. Chegamos ao kibbutz de Ein Haslusah e vimos um corpo na rua. Era nossa mãe. Com balas da cabeça aos pés. Uma bola e um lanche que ela levaria para as crianças estavam cheios de sangue. Ela caiu quando as bombas atingiram o assentamento. Os terroristas a executaram. Vimos corpos de idosas, queimados. Abriram o gás e acenderam o fogo."
Betzalel Taljah, soldado israelense, 30 anos. A mãe, de 63, foi morta ao visitar familiares no kibbutz de Ein Haslusah, a 4km de Gaza. Ele está na fronteira de Gaza e aguarda a invasão. Depoimento ao Correio
EU ACHO...
"Israel está destruindo bairros residencias completos. O Ministério da Saúde informou que 60% das vítimas dos ataques israelenses são crianças e mulheres. A destruição está em todos os lugares.Eu não encontro palavras para descrever o que está acontecendo agora."
Ahmed Abu Artema, 36 anos, escritor, morador da Cidade de Gaza
"Na condição de primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu é o responsável pelas falhas de inteligência e de operação de seu governo. A adição de um dos partidos da oposição durante a guerra não eliminaria a sua responsabilidade pelos fracassos. É provável que ele se demita ou seja forçado a abandonar o seu posto, e que a sua carreira política terminará."
Eytan Gilboa, professor de ciência política da Universidade Bar-Illan (em Ramat Gan, subúrbio de Tel Aviv)