EMBATE

Congresso dos EUA: deposição de presidente republicano mergulha Câmara em caos

A Câmara dos Representantes é uma instituição em crise após destituição de Kevin McCarthy, segundo análise do correspondente Anthony Zurcher.

Reuters
Kevin McCarthy dá entrevista coletiva depois de ser destituído do cargo de presidente da Câmara dos Representantes

Em janeiro, o deputado republicano Kevin McCarthy fechou um acordo para se tornar presidente da Câmara que dava a qualquer membro do Congresso o poder de forçar uma votação sobre a possibilidade de destituí-lo.

Na terça-feira (03/10), um republicano — Matt Gaetz — fez exatamente isso. E, com a ajuda dos democratas, conseguiu tirar McCarthy do cargo.

Agora, a maioria dos republicanos está perguntando qual será o rumo da Casa. Quase todos votaram para manter McCarthy no cargo, mas bastaram alguns rebeldes para mergulhar a Câmara no caos.

Por meses, McCarthy trabalhou para manter a direita sob seu comando.

Ele concordou em abrir uma investigação de impeachment contra o presidente Joe Biden, que é democrata. Ele desistiu de um acordo que havia selado com os democratas no início do ano para aumentar o limite da dívida. Ele permitiu que os conservadores incluíssem trechos alinhados à direita em projetos de lei relacionados ao orçamento e a outros assuntos.

Mas todos os seus esforços foram em vão. Quando o presidente da Câmara precisou contar com o apoio democrata para evitar o chamado shutdown (paralisação dos pagamentos federais em função da falta de aprovação do novo orçamento), seu destino político mudou.

McCarthy ainda poderia ter lutado reconquistar o poder — por exemplo convencendo os republicanos que se viraram contra ele a mudarem de ideia, como fez em janeiro. Mas parece que restavam poucas opções, e na noite de terça-feira (3/10), ele indicou que não concorreria novamente.

O cargo de presidente da Câmara que ele buscou durante grande parte de sua carreira política acabou sendo um cavalo de Troia — e, após o término da votação para destituí-lo, ele parecia quase aliviado quando colegas republicanos foram lhe cumprimentar.

Não importa qual republicano venha a substituí-lo, as divisões dentro do partido, que tem maioria na Casa, permanecerão. E os desafios para gerir a Câmara continuam os mesmos.

Embora a destituição tenha sido histórica — McCarthy foi o primeiro presidente da Câmara a ser retirado por votação na Casa —, ela também é sintoma de uma luta feroz entre os republicanos, divididos entre uma ala tradicional e uma base radical que surgiu com o movimento Tea Party, de 2010.

É um embate entre pureza de valores e pragmatismo; entre trabalhar dentro do sistema e mudá-lo.

JIM LO SCALZO/EPA-EFE/REX/Shutterstock
Matt Gaetz foi o responsável pela moção que derrubou o presidente da Câmara, republicano como ele

Foi por pouco que McCarthy conseguiu ser eleito presidente da Câmara em janeiro, graças ao apoio de alguns poucos rebeldes republicanos. E foram justamente esses rebeldes republicanos que derrubaram McCarthy na terça-feira.

Mas o grande protagonista da noite foi seu rival, Matt Gaetz, que entrou com a "moção para desocupar a cadeira".

Enquanto os republicanos que defendiam McCarthy se revezavam durante uma hora de debate antes da votação final, foi Gaetz — posicionado no lado democrata da Câmara, mas conversando com seus colegas republicanos — quem aproveitou a maior parte do tempo para defender a destituição de seu correligionário e antagonista.

O que ficou claro foi que ambos os lados da divisão republicana acham que Washington está com um grave problema financeiro.

Para Gaetz, o processo pelo qual os gastos federais são aprovados é o maior motivo para isso. Ele criticou a forma como o Congresso aprova projetos de lei de grandes gastos para diferentes partes do governo federal, que muitas vezes são negociados a portas fechadas e depois votados em um grande pacote.

Ele também criticou McCarthy por fazer concessões aos democratas — que controlam o Senado e a Casa Branca — durante as negociações sobre o orçamento e o limite da dívida. Gaetz defendeu que, se o seu partido não adotasse uma linha mais dura, nada em Washington mudaria.

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Sala da Câmara agitada; no centro, aparece McCarthy, que foi destituído nessa terça-feira (03)

Os defensores de McCarthy, por outro lado, disseram que chegar a um acordo faz parte do processo — e que o então presidente da Casa tinha conseguido, apesar de tudo, avançar com a agenda conservadora.

O congressista republicano Kelly Armstrong acusou políticos como Gaetz de colocar a arrogância e a arrecadação de fundos acima da governabilidade.

“Nos rebaixamos para um lugar onde cliques, o sucesso na TV e a busca incessante pelo gosto mais medíocre das celebridades impulsionam decisões e incentivam o comportamento juvenil."

Neste momento, a Câmara dos Representantes dos EUA é uma instituição em crise — sem presidente e sem um caminho claro para se eleger um novo nome para o cargo.

O processo de destituição terminou na tarde de terça-feira. Os republicanos, parecendo em estado de choque, encontraram-se a portas fechadas para pensar no que querem fazer agora.

Já os democratas riram de tudo — aparentemente com a crença de que este caos os beneficiará.

Mas a Casa está navegando por águas desconhecidas. E com a iminência de uma paralisação do governo em meados de novembro, deve haver mais turbulência no horizonte.

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