Horror no Oriente Médio

Guerra Israel-Hamas: Tensão com a ONU coloca a diplomacia em xeque

Embaixador israelense na ONU pede renúncia do secretário-geral António Guterres e anuncia que país negará vistos a funcionários da organização

António Guterres, secretário-geral da ONU, em recente visita à passagem de Rafah -  (crédito: Kerolos Salah/AFP)
António Guterres, secretário-geral da ONU, em recente visita à passagem de Rafah - (crédito: Kerolos Salah/AFP)
postado em 26/10/2023 06:05

Uma escalada de tensão entre Israel e a Organização das Nações Unidas (ONU) põe em xeque a diplomacia para a costura de um cessar-fogo na Faixa de Gaza. O embaixador israelense na entidade, Gilad Erdan, subiu o tom e pediu a renúncia do secretário-geral, António Guterres. Também anunciou que o país negará vistos a membros da ONU. A atitude é uma resposta às declarações de Guterres sobre a guerra entre Israel e Hamas.

Durante reunião do Conselho de Segurança, na terça-feira (24/10), Guterres denunciou "claras violações do direito humanitário internacional", sem mencionar diretamente o governo de Benjamin Netanyahu. O secretário-geral afirmou que os ataques de 7 de outubro "não vieram do nada" e citou os "56 anos de ocupação sufocante" — uma referência à presença israelense nos territórios palestinos de Gaza e da Cisjordânia desde 1967, após a Guerra dos Seis Dias.

Guterres também condenou, explicitamente, os ataques terroristas do Hamas. Apesar disso, os membros do governo israelense se revoltaram com as falas. "Senhor secretário-geral, em que mundo você vive?", provocou o chanceler de Israel, Eli Cohen. Por sua vez, Erdan foi além e disse que "é hora de dar uma lição" às Nações Unidas.

Vistos

Alon Ben-Meir, professor de relações internacionais da Universidade de Nova York e especialista em negociações de paz entre Israel e nações árabes, entende que, na prática, a recusa de vistos ameaçada pelos israelenses "certamente não significa barrar a entrada de ajuda da ONU" e ficaria "limitada aos indivíduos". "Guterres não tentou, de forma alguma, justificar as atrocidades do Hamas", afirmou ao Correio. "Os ataques não podem ser tirados do contexto de 75 anos de conflito entre israelenses e palestinos." Ben-Meir observa que, não fosse o impasse de décadas entre os dois povos, "a selvageria do Hamas não teria ocorrido".

Colunas de fumaça no norte da Faixa de Gaza, depois de bombardeio, vistas da cidade de Sderot, no sul de Israel
Colunas de fumaça no norte da Faixa de Gaza, depois de bombardeio, vistas da cidade de Sderot, no sul de Israel (foto: Ronaldo Schemidt/AFP)

Guterres se disse "chocado com as deturpações" de suas declarações, "como se estivesse justificando atos de terrorismo do Hamas". Ele completou, reafirmando que condena, de forma inequívoca, os atos "horríveis e sem precedentes" do grupo extremista. Os israelenses cancelaram a reunião bilateral marcada com o secretário-geral.

Resolução empacada

A crise entre a cúpula da ONU e o governo israelense é mais um capítulo da série de tensões que envolvem a atuação das Nações Unidas no conflito. O Conselho de Segurança, atualmente presidido pelo Brasil, ainda não conseguiu aprovar uma resolução desde o início dos ataques, há mais de duas semanas.

Nesta quarta-feira (25/10), duas propostas foram apresentadas, ambas fracassaram. A dos Estados Unidos, aliados principais de Israel, foi vetada pelos chineses e russos. A da Rússia, que apresentou seu segundo texto desde o início do conflito, nem sequer conseguiu o número mínimo de votos para a aprovação, além de ter recebido veto dos EUA.

O impasse diz respeito a um pedido de cessar-fogo — adaptado para "pausa humanitária", em um esforço para a aprovação do texto, e rechaçado pelos Estados Unidos. Também a uma exigência dos americanos para incluir na proposta uma "garantia de autodefesa" de Israel, trecho rejeitado pelos russos. 

A proposta encaminhada pelo Brasil, votada no último dia 18, foi a mais bem recebida pelo Conselho de Segurança, com 12 votos a favor, duas abstenções e o veto dos Estados Unidos, que derrubou automaticamente o projeto. Segundo Ben-Meir, os pontos para que uma resolução seja aprovada no Conselho passam por uma condenação do Hamas "nos termos mais fortes", pela libertação de todos os  220 reféns, pela permissão de entrada de ajuda humanitária — incluindo água, comida, combustível e medicamentos — em Gaza e a declaração de um "cessar-fogo temporário”, que permita restar socorros aos civis palestinos. "Qualquer coisa além disso terá que ser consistente com esses pontos", completou. 

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