Em um gesto sem precedentes, congressistas norte-americanos independentes e do Partido Democrata apresentaram uma resolução legislativa que pede desculpas pelo papel dos Estados Unidos no golpe de 11 de setembro de 1973. Há 50 anos, as Forças Armadas chilenas, apoiadas pela Agência Central de Inteligência (CIA), derrubaram o presidente socialista Salvador Allende e instituíram no poder o general Augusto Pinochet.
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A ruptura institucional deu lugar a 17 anos de uma ditadura que deixou mais de 40 mil vítimas, entre mortos, desaparecidos, torturados e exilados. O documento também insta a divulgação de dossiês confidenciais relacionados ao papel dos EUA no golpe militar. Entre os autores da resolução, estão os senadores Bernie Sanders e Tim Kaine, e os deputados Alexandria Ocasio-Cortez, Joaquín Castro, Greg Casar e Nydia Velázquez.
"Deixe-me ser claro: devemos defender a democracia aqui nos Estados Unidos e em outros lugares, Ao assinalarmos o 50º aniversário do horrível golpe de Estado no Chile, temos de deixar claro que lamentamos o nosso envolvimento e comprometemo-nos a apoiar a democracia chilena", declarou Sanders. Ele defendeu "a responsabilização total pelo golpe e pelas suas consequências". Por sua vez, Kaine disse ser importante o reconhecimento do papel dos Estados Unidos no golpe e destacou os esforços do Congresso norte-americano para "trazer à luz as atrocidades do regime de Pinochet".
Por telefone, de Santiago do Chile, Pedro Felipe Ramírez, 82 anos, ex-ministro da Habitação do governo de Salvador Allende, afirmou ao Correio que considera "muito positiva" a iniciativa dos congressistas norte-americanos. "Nunca aconteceu algo assim. Os políticos que propiciam essa resolução são legisladores progressistas, que sempre condenaram a intervenção dos Estados Unidos no golpe", lembrou.
Ao ser questionado se aceitaria o pedido de desculpas dos EUA, na condição de vítima direta da queda de Allende, Ramírez explicou que uma resolução apresentada no Congresso tem uma força muito importante. "Isso deve ser aceito, mas precisa vir acompanhado de uma decisão de que os EUA jamais apoiarão golpes em nenhum país democrático", respondeu. O ex-ministro de Allende sublinhou que Washington sempre teve "interesses múltiplos" nos golpes de Estado ocorridos na América Latina.
Moy de Tohá — viúva de José Tohá, ex-ministro da Defesa de Allende que foi torturado e morto durante o golpe — disse ao Correio que espera uma resposta do governo do Chile, caso a resolução seja aprovada pelo Congresso. "A partir da definição dos Estados Unidos, considero importante que haja um acordo, nas Nações Unidas, para que esse tipo de situação não volte a ocorrer", comentou a chilena de 87 anos. "Estou muito agradecida pelo gesto desses congressistas. Parece-me um fato de destaque, tanto na história dos Estados Unidos quanto na do Chile. Alegro-me enormemente que o façam, mas aguardo a resposta do governo de meu país."