SOCIEDADE

O movimento separatista no centro das tensões entre Índia e Canadá

O assassinato de um ativista separatista no Canadá alimenta tensões entre a Índia e as comunidades sikhs fora da Índia.

Manifestantes separatistas sikhs protestaram em frente ao Consulado Indiano em Toronto em julho -  (crédito: Getty Images)
Manifestantes separatistas sikhs protestaram em frente ao Consulado Indiano em Toronto em julho - (crédito: Getty Images)
BBC
BBC Geral
postado em 19/09/2023 14:14 / atualizado em 19/09/2023 14:23

As tensões diplomáticas entre Índia e Canadá aumentaram, em meio a apelos por uma pátria independente para os sikhs na Índia.

O Canadá disse nesta terça-feira (19/9) que está analisando "alegações críveis que potencialmente ligam" o Estado indiano ao assassinato do líder separatista Hardeep Singh Nijjar na Colúmbia Britânica, Província localizada no extremo oeste do Canadá.

A Índia negou as acusações, descrevendo-as como "absurdas".

Para quem é novo nesta controvérsia de longa data, aqui está um resumo dessa história e do contexto atual:

Quem são os sikhs e onde eles vivem?

O sikhismo é uma das principais religiões do mundo, fundada no século 16 na região de Punjab, onde hoje estão a Índia e o Paquistão — que foi dividida entre os dois países após o fim do domínio britânico em 1947.

Existem cerca de 25 milhões de sikhs em todo o mundo, tornando-os o quinto maior grupo religioso do planeta.

A grande maioria vive na Índia, onde representam cerca de 2% do 1,4 bilhão de habitantes do país.

Mas também existem populações significativas em diáspora – isto é, espalhadas em diversas outras partes do mundo.

O Canadá abriga a maior população fora da Índia, com cerca de 780 mil sikhs – mais de 2% da população do país – enquanto tanto os EUA como o Reino Unido abrigam cerca de 500 mil e a Austrália, em torno de 200 mil.

Por que alguns sikhs estão clamando por uma nação independente?

O movimento Calistão apela por uma pátria independente para os sikhs na Índia.

O movimento atingiu o seu auge na década de 1980, no Estado indiano de Punjab, quando a região sofreu uma série de ataques violentos e milhares de mortes.

A mobilização perdeu fôlego depois que as Forças Armadas indianas realizaram operações especiais contra o movimento.

A política no Punjab moderno afastou-se do movimento e os apelos por independência não são uma posição majoritária, de acordo com o professor Shruti Kapila, da Universidade de Cambridge, no Reino Unido.

Mas os apoiadores do movimento que vivem fora da Índia continuaram a defender um Estado separado, com os apelos à independência se intensificando em anos recentes.

Por que o Calistão é uma questão tão sensível para o governo indiano?

A Índia se opõe fortemente ao movimento Calistão. Todos os principais partidos políticos do país, incluindo no Punjab, repudiam a violência e o separatismo.

As tensões de longa data foram a causa de dois dos incidentes mais controversos da história moderna da Índia – a tomada do Templo Dourado e o assassinato de Indira Gandhi.

Em junho de 1984, os militares indianos invadiram o local mais sagrado para os sikhs e expulsaram militantes separatistas que estavam abrigados no complexo do templo na cidade de Amritsar.

O ataque, que resultou em muitas mortes e danos significativos ao Templo Dourado, foi ordenado pela então primeira-ministra Indira Gandhi.

Poucos meses depois da operação, Gandhi foi morta por dois dos seus guarda-costas sikhs, o que levou a quatro dias de tumultos e violência generalizada.

Milhares de pessoas foram mortas - na maioria, sikhs. As estimativas variam de cerca de 3 mil mortos a até 17 mil.

O Calistão é um tabu para a Índia porque as cicatrizes da violência na década de 1980 ainda estão frescas.

Quem foi Hardeep Singh Nijjar?

Hardeep Singh Nijjar era um cidadão canadense e foi morto a tiros aos 45 anos, em frente a um templo sikh no Canadá, em 18 de junho.

Ele nasceu na vila de Bharsinghpur, no Punjab, e mudou-se para o Canadá em 1997.

Primeiro, trabalhou como encanador e mais tarde se tornou um líder sikh importante na Província canadense da Colúmbia Britânica, no oeste do Canadá.

A Índia classificou-o como terrorista em 2020, pelas suas alegadas ligações com a Khalistan Tiger Force – um grupo que faz campanha pelo Calistão independente.

Seus apoiadores qualificaram estas acusações como "infundadas" e afirmaram que ele já tinha sido alvo de ameaças no passado devido ao seu ativismo.

Relatos na imprensa indiana dizem que, no momento de sua morte, ele estava trabalhando na organização de um referendo não oficial na Índia por um Estado sikh independente.

Nijjar é a terceira figura sikh proeminente que morreu inesperadamente nos últimos meses.

Como a Índia pressiona os sikhs em outros países?

O pano de fundo das tensões diplomáticas é a pressão crescente que a Índia exerce sobre os governos de três países com populações sikh consideráveis: Canadá, Austrália e Reino Unido.

O governo da Índia diz abertamente que o fracasso em combater o que chama de "extremismo sikh" seria um obstáculo às boas relações.

Autoridades australianas disseram que investigariam o vandalismo de templos hindus por ativistas pró-Calistão, mas não impediriam os sikhs australianos de expressarem suas opiniões sobre uma pátria independente.

O Canadá foi alvo das críticas mais abertas de Déli pelo que considera um fracasso na oposição ao movimento pró-Calistão naquele país. Embora o primeiro-ministro canadense, Justin Trudeau, tenha dito que acabará com a violência em curso, ele também reagiu contra a "interferência estrangeira".

No Reino Unido, uma disputa começou em março, após protestos em frente ao Alto Comissariado Indiano em Londres, que viram multidões agitarem faixas amarelas com a inscrição "Calistão" e um homem retirar a bandeira indiana da varanda do primeiro andar do edifício.

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