Estados Unidos

Trump adota foto de detento como símbolo da campanha eleitoral

Equipe de marketing de Donald Trump aposta na imagem para ganhar votos em 2024. Especialista vê estratégia surpreendente e incomum do republicano em tentar reforçar a própria marca e reunir sua base de apoio

Em um exemplo de "fazer do limão a limonada", a equipe de Donald Trump não perdeu tempo e transformou a mug shot (foto como detento) do ex-presidente em símbolo de resistência. Poucas horas depois de o republicano ser fichado, ter as digitais colhidas e ficar 20 minutos na condição de detento, na prisão do condado de Fulton (em Atlanta), a imagem histórica tirada pela Justiça da Geórgia começou a estampar vários objetos, vendidos no site oficial da campanha, intitulado Trump — Make America Great Again! ("Trump — Torne a América Grande Novamente!"). Por US$ 34, cerca de R$ 165, o eleitor norte-americano pode adquirir uma camiseta de algodão premium branca que ostenta a mug shot e as palavras Never surrender ("Jamais se render"). O traje unissex também é comercializado na cor preta e na versão de manga comprida. Um pôster com a mesma foto e o autógrafo do magnata custa US$ 28 (ou R$ 136). A caneca sai por US$ 25 (cerca de R$ 121), enquanto o cooler para lata de cerveja está sendo vendido a US$ 15 (ou R$ 72).

"Essa foto policial vai para sempre ficar na história como um símbolo do desafio dos Estados Unidos à tirania", declarou, em um e-mail de arrecadação de fundos, a campanha Trump 2024, pedindo a apoiadores que enviassem US$ 47 (R$ 229) em troca de uma camiseta com a imagem.

Por outro lado, a oposição democrata também aproveitou para capitalizar apoio político. Na noite de quinta-feira (24/8), pouco antes de a mug shot de Trump ser divulgada, o presidente Joe Biden fez uma publicação sugestiva no X, o antigo Twitter rebatizado por Elon Musk. "A propósito de nada, hoje é um grande dia para doar à minha campanha", escreveu o líder de 80 anos. A mensagem era acompanhada de um link para uma página em que o eleitor poderia escolher os valores de doação entre US$ 10 e US$ 2 mil ou preencher com o montante desejado em um campo.

MAGA/Reprodução - Caneca com a foto de Trump detido

Professora da Faculdade de Direito da Universidade de Michigan e ex-procuradora federal chefe para o Distrito Leste de Michigan, Barbara McQuade disse ao Correio acreditar que a foto de detento de Trump deverá polarizar ainda mais o eleitorado norte-americano. "Alguns a verão como prova de que ninguém está acima da lei. Outros como uma vitimização adicional de Donald Trump", observou. "Penso que qualquer esforço para politizar a Justiça Criminal mina a confiança da opinião pública no sistema", advertiu, ao comentar a utilização da mug shot do ex-presidente na campanha. 

McQuade vê um risco real de que Trump seja condenado pelos crimes pelos quais é acusado na Geórgia — tentativa de reverter o resultado das eleições — e sentenciado à prisão. "No entanto, não está claro se ele será realmente encarcerado numa prisão, à luz de preocupações genuínas de segurança nacional. Em vez disso, parece mais provável que ele seja condenado à prisão domiciliar", afirmou. A ex-procuradora admite que a eventual pena, ainda que cumprida em casa, criaria um cenário bastante estranho, caso a condenação ocorra depois da possível eleição à Presidência dos EUA. "Se isso acontecesse, acho que ele precisaria ser libertado durante o seu governo, a fim de exercer as funções do cargo. Vivemos em tempos sem precedentes."

Evanston Photographic Studios - Timothy Calkins, professor clínico de marketing da Kellogg School of Management da Northwestern University(em Evanston, Illinois): decisão surpreendente
 

Timothy Calkins, professor clínico de marketing da Kellogg School of Management da Northwestern University(em Evanston, Illinois), classificou como "surpreendente" a decisão de Trump de usar a foto na campanha. "É incomum que um candidato seja objeto de uma foto de detento. É ainda mais incomum que a utilize como uma peça de marketing", alertou ao Correio. De acordo com ele, Trump tenta reunir sua base eleitoral e usa a mug shot para reforçar a história de sua marca. "Ele sempre se retratou com um outsider, alguém de fora do sistema. Não creio que a estratégia possa minguar o apoio de seus eleitores. Provavelmente, eles veem isso como uma razão para apoiá-lo ainda mais", acrescentou. 

Pelo fato de Trump estar muito à frente nas pesquisas, Calkins acredita que os Estados Unidos caminham para uma revanche nas urnas com Biden, apesar de todos os problemas jurídicos enfrentados pelo republicano. "O maior risco de Trump nas primárias é que surja um jogador moderado, como Nikki Haley (ex-embaixadora dos EUA nas Nações Unidas), capaz de abraçar plenamente o argumento da elegibilidade."

No fichamento de Trump, um dado nos registros da prisão causou polêmica: o peso. O magnata informou ter 98kg. Nas redes sociais, anônimos que dizem pesar 98kg reagiram publicando fotos de si mesmos, nas quais aparecem mais magros que o republicano. Alguns sugerem que o peso do ex-presidente seja de 115kg a 120kg. Internautas ironizaram a cor do cabelo de Trump, que em seu registro ele descreveu como "loiro veneziano".

MAGA/Reprodução - Caneca com a foto de Trump detido
Evanston Photographic Studios - Timothy Calkins, professor clínico de marketing da Kellogg School of Management da Northwestern University(em Evanston, Illinois): decisão surpreendente

De volta ao (antigo) Twitter

A última publicação no então Twitter tinha sido feita em 8 de janeiro de 2021: "Para todos aqueles que perguntaram: eu não irei à cerimônia de posse no dia 20". Depois de 958 dias de silêncio na rede social, Donald Trump voltou anteontem à agora X para publicar a mug shot tirada pouco antes na prisão do condado de Fulton. Abaixo da imagem, ele escreveu "Interferência eleitoral. Nunca se render!" e o endereço do site de sua campanha.