O presidente Daniel Ortega deu seu último golpe nos jesuítas na Nicarágua, despojando a Companhia de Jesus no país do seu estatuto jurídico e dos seus bens, segundo um decreto publicado no La Gaceta, o jornal oficial do país.
Ortega – que está no poder há 14 anos – ataca frequentemente o clero da Igreja Católica, dizendo tratar-se de uma "máfia" e uma organização antidemocrática.
Nos últimos anos, diversas organizações religiosas foram fechadas e seus líderes presos ou exilados.
Segundo informações oficiais, o governo alegou que ordenou a dissolução da ordem jesuíta por não reportar demonstrações financeiras de 2020, 2021 e 2022.
Além disso, a administração afirmou não ter renovado o conselho de administração que expirou em 27 de março de 2020.
A medida também implica a transferência dos bens e imóveis da companhia religiosa para o Estado da Nicarágua, o que afetará as escolas jesuítas no país.
A decisão foi divulgada apenas uma semana depois de o governo de Daniel Ortega ter ordenado o confisco da Universidade Centro-Americana (UCA), que era administrada pela ordem religiosa há mais de 60 anos e que agora se chamará Universidade Nacional Casimiro Sotelo Montenegro.
Em resposta, a Associação de Universidades Confiadas à Companhia de Jesus na América Latina (AUSJAL) emitiu um comunicado para manifestar o seu repúdio por considerar que a UCA foi "caluniada e hostilizada".
"A denúncia dos acontecimentos classificados como crimes contra a humanidade para o Grupo de Peritos em Direitos Humanos da Nicarágua, da Organização das Nações Unidas, tornou [a universidade] vítima de ataques múltiplos desde 2018", afirma o comunicado.
"O confisco de fato dos bens da UCA é uma represália ao trabalho que esta instituição tem realizado na busca de uma sociedade mais justa, bem como ao seu compromisso de proteger a vida, a verdade e a liberdade do povo nicaraguense", diz.
Sequência de ataques
Em 15 de agosto, o governo Ortega abriu um processo criminal contra a UCA pelo crime político de "terrorismo".
Professores e dirigentes estudantis viram a ação como uma retaliação pela participação da instituição na onde de manifestações de abril de 2018.
Na época, protestos foram realizados em várias cidades da Nicarágua contra as reformas da seguridade social decretadas por Ortega. Os atos foram duramente reprimidos e centenas de pessoas morreram.
"Fomos notificados da apreensão de imóveis, móveis, dinheiro em moeda nacional ou estrangeira de contas bancárias, produtos financeiros em moeda nacional ou estrangeira de propriedade da UCA", denunciaram as autoridades universitárias em comunicado.
Quatro dias depois, foi dada ordem de confisco da residência Villa del Carmen, onde moram as freiras que trabalham na UCA.
A polícia apareceu na residência para exigir que os jesuítas desocupassem o imóvel. Apesar de o imóvel não pertencer à universidade, os religiosos tiveram que sair.
Conforme denunciado pela AUSJAL, foram negadas injustificadamente à UCA "certificações para cumprir a sua missão de educar, produzir conhecimento e laços sociais, como foi o caso de outros 27 centros de ensino superior cujos bens foram confiscados".
Ao ser excluída destes órgãos, a UCA perdeu o acesso ao orçamento público, o que afetou os estudantes que necessitavam deste orçamento para financiar os seus estudos.