Luisa González — candidata da esquerda, afilhada política do ex-presidente Rafael Correa e representante do Movimento Revolução Cidadã — e o empresário de direita Daniel Noboa, anticorreísta, têm até 15 de outubro para traçar estratégias, costurar alianças e travar um duelo de opostos. Noboa chega ao segundo turno como a surpresa da eleição. Seu nome não constava entre os favoritos. Nesta segunda-feira (21/8), os dois adversários não participaram de eventos públicos e realizaram consultas internas. Com 98,58% dos votos válidos, Luisa obteve 33,4% contra 23,6% para Daniel Noboa. O nome de Fernando Villavicencio, candidato assassinado em 9 de agosto passado, após um comício, em Quito, ficou com 16,46%. O nome de Christian Zurita, também jornalista e amigo de Villavicencio, não o substituiu nas cédulas eleitorais.
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Filho do magnata Alvaro Noboa, Daniel, 35 anos, fez um agradecimento aos eleitores e se disse pronto a "devolver a paz" a cada família equatoriana. "Venceram todas as pessoas que desejam uma mudança. Venceu o jovem, que coloca a esperança em ter um diploma universitário, um emprego. A família, para que tenha segurança em seu bairro", declarou. Luisa, 45, disse a jornalistas que "o Equador votou pela esperança de dias melhores". "Essa vitória no primeiro turno é histórica", admitiu.
Diretor da Faculdade de Relações Internacionais da Universidad Internacional de Ecuador (UIE), Arturo Moscoso explicou ao Correio que o assassinato do candidato de centro-direita Villavicencio fez com que muitos reconsiderassem o voto. "O número de indecisos voltou a subir. A atuação de Noboa no último debate levou-o a captar muitos votos", comentou. Além disso, ele crê que a juventude de Noboa e o fato de ele ser quase um outsider atraíram os jovens. "Muitos votos que iriam para Yaku Pérez (esquerda) e para o empresário Xavier Hervas (também outsider) foram canalizados para Noboa. É importante destacar o forte trabalho de Noboa em todo o país, somado a uma grande verba de campanha e a muito clientelismo", observou.
Alianças
Moscoso lembrou que, para o segundo turno, Noboa garantiu que não precisa de alianças. "Parece blefe. Ele necessita construir uma frente, mas que vá para além das eleições. Mais do que uma aliança, um acordo de governabilidade. Novamente, temos uma Assembleia Nacional com uma primeira minoria correísta. Com as coalizões, o correísmo poderia conseguir uma maioria absoluta e bloquear as iniciativas de Noboa."
Para o especialista da UIE, a ausência de Christian Zurita — candidato que substituiu Villavicencio — do debate e das cédulas eleitorais influenciou a votação. "Apesar disso, a aliança pela qual Zurita concorreu ficou com o segundo maior número de assentos na Assembleia", disse. Noboa apostou as fichas nas redes sociais, como TikTok; no fato de ser um rosto novo na política; e no apelo entre os mais jovens — a população com idade entre 18 e 29 anos representa 25% do eleitorado. Conseguiu uma ascensão meteórica.
Simón Pachano, professor de ciência política da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), reconhece que a votação de Noboa foi "surpreendente". "Ninguém esperava por isso. Possivelmente, trata-se de um voto de protesto, contrário aos políticos tradicionais. Ainda que Noboa faça parte de um dos grupos empresariais mais fortes do país, este pode ser um voto antissistema, especialmente vindo dos jovens. É preciso estudar esse fenômeno cuidadosamente", afirmou ao Correio.
De acordo com Pachano, o sucesso de Daniel Noboa no segundo turno dependerá, em grande medida, da campanha que ele fizer, e não dos partidos políticos que ficarem de fora da disputa eleitoral. "Isso porque esses partidos derrotados não têm capacidade de endossar os votos — talvez a exceção sejam os eleitores de Fernando Villavicencio, pois deram um voto contundente de protesto e de viés totalmente anticorreísta."
Promessas na Guatemala
Em dois meses, Bernardo Arévalo passou de quase um desconhecido à posição de vencedor na eleição da Guatemala com sua promessa de empreender um combate frontal à corrupção, problema endêmico no país. O sociólogo e deputado social-democrata de 64 anos é filho de Juan José Arévalo (1945-1951), o primeiro presidente democrata de Guatemala e que estimulou reformas sociais. O líder eleito promete seguir os passos do pai, com forte agenda social.
O líder do partido Semilla superou a ex-primeira-dama Sandra Torres, que perdeu a terceira eleição, apesar do apoio do governo, de partidos de direita, de grandes empresários e de pastores evangélicos. Arévalo teve 58% dos votos, enquanto Torres ficou com 37%.
Em nota, o governo do Brasil desejou sucesso a Arévalo e reafirmou sua disposição de estreitar os vínculos de amizade e cooperação. Também expressou sua expectativa de que o processo de transição no país centro-americano seja pacífico.
"O povo guatemalteco semeou a 'Semilla' (nome do partido, que significa 'semente' em português) da esperança democrática, com o grande triunfo de Arévalo. É uma mudança institucional pela transparência e a estabilidade", declarou o reitor da Universidade para a Paz da Costa Rica, Francisco Rojas.