Diplomacia

EUA, Coreia do Sul e Japão enviam mensagem contra a ameaça da China

Em Camp David (Maryland), líderes dos três países realizam cúpula histórica para abordar ameaças à segurança. Analistas veem aprofundamento de parceria

O local escolhido foi Camp David, a casa de campo do chefe de Estado dos EUA, onde acordos históricos sobre o Oriente Médio foram firmados, quase cinco décadas atrás. O presidente norte-americano, Joe Biden, foi o anfitrião de uma cúpula com o colega da Coreia do Sul, Yoon Suk Yeol, e o primeiro-ministro do Japão, Fumio Kishida. O encontro serviu para reforçar a parceria entre os três aliados e criar uma frente única contra a ameaça representada pela China. A ideia é que os países se consultem mutuamente, de forma sistemática e "rápida". "Temos a intenção de compartilhar informações e coordenar nossas mensagens e respostas", declararam em um comunicado conjunto. Biden enalteceu a importância da cúpula. "Não estamos falando de um dia, uma semana ou um mês, mas de décadas de cooperação", ressaltou o democrata sobre esse diálogo, amplamente criticado pela China.

Na declaração conjunta, intitulada O espírito de Camp David, EUA, Japão e Coreia do Sul condenaram o "comportamento perigoso e agressivo" e as reivindicações marítimas "ilegais" da China na região do Indo-Pacífico. A área é foco de tensões entre Pequim e Filipinas sobre um atol disputado. As relações delicadas entre China e o arquipélago capitalista de Taiwan também foram abordadas pelos líderes. "Reiteramos a importância da paz e da estabilidade através do Estreito de Taiwan como um elemento indispensável para a segurança e prosperidade na comunidade internacional", disse Biden. "Há nenhuma mudança em nossas posições básicas sobre Taiwan e pedimos uma solução pacífica para os problemas no estreito." Sobre a Coreia do Norte, eles pediram que o país comunista "abandone seus programas nucleares e de mísseis balísticos".

Professor de assuntos nacionais e analista do Programa de Segurança Internacional da Faculdade Kennedy da Universidade de Harvard, Terence Roehrig explicou ao Correio que, embora os EUA encorajassem  a cooperação trilateral havia algum tempo, a decisão de realizar uma cúpula partiu dos três países. O estudioso interpreta a reunião tripartite como uma resposta a um ambiente de segurança em mutação. "Ela demonstra os importantes interesses em segurança e em economia partilhados por Washington, Tóquio e Seul", lembrou. Em relação à China, Biden, Yook Suk e Kishida abordaram o conflito no Mar do Sul da China e, indiretamente, o apoio pela paz e pela estabilidade no Estreito de Taiwan. Nesse sentido, fizeram um pedido expresso para que não ocorram mudanças unilaterais no status quo do arquipélago capitalista. 

Roehrig ressaltou que as preocupações dos aliados não envolvem apenas a China. "A Coreia do Norte é uma grave ameaça para as três nações. Na declaração, eles concordaram em adotar medidas tangíveis, como o aumento de exercícios militares especialmente voltados à defesa antimísseis, compartilhamento de dados sobre lançamentos de mísseis por Pyongyang, formação de um grupo de trabalho para lidar com o regime de Kim Jong-un, e a concordância em realizar consultas em situações de crise", enumerou. Indicativos importantes da disposição dos três líderes em ampliar a cooperação de forma significativa, acrescentou. 

Apesar das reclamações da China, que chamou a cúpula de mini-Otan, Roehrig prefere classificá-la como um arranjo de segurança mais amplo, sem cláusulas de segurança que compõem uma aliança. "A cúpula mostra uma relação de segurança muito mais estreita. É uma plataforma para levantar objeções ao comportamento chinês e uma maneira de trabalharem, juntos, sob uma plataforma de normas e de valores comuns fundamentados no direito internacional."

Economia e direitos

Os documentos firmados durante a cúpula contemplam itens além das preocupações com a segurança. Neles, há menções e promessas de parceria em desenvolvimento econômico, incluindo a região do Indo-Pacífico; em pesquisa e tecnologia; em direitos das mulheres e em direitos humanos. Roehrig entende que essas medidas demonstram a amplitude da parceria entre EUA, Japão e Coreia do Sul. 

Por sua vez, Thomas Cymkin — analista da Iniciativa de Segurança Indo-Pacífica e especialista em política da Ásia pelo think tank Atlantic Council (em Washington) — destacou que esta é a primeira cúpula trilateral independente entre as três nações, fora da margem de uma reunião maior. "Também se trata da primeira cúpula de Camp David organizada por Biden durante seu governo. Isso tudo confere ao encontro um simbolismo e um signifciado histórico especial", ressaltou à reportagem. 

Como os EUA têm uma aliança com o Japão e outra com a Coreia do Sul, Cymkin avalia a cúpula como a afirmação de uma parceria estratégica e um arranjo defensivo contra vários desafios, incluindo a China e a Coreia do Norte. Em termos de efeitos práticos, o analista aponta o fortalecimento da cooperação e da coordenação em muitas áreas, desde reuniões presidenciais e ministeriais trilaterais institucionalizadas até exercícios militares conjuntos. Na visão dele, os termos da parceria são duradouros. "Nas democracias, governos vão e vêm. Os três líderes buscam estabelecer um legado que tende a perdurar. Os interesses de segurança nacional transcendem governos."

EU ACHO...

Fotos: Arquivo pessoal - Terence Roehrig, professor de assuntos nacionais e analista do Programa de Segurança Internacional da Faculdade Kennedy da Universidade de Harvard
 

"É importante lembrar que, embora a cúpula tenha sido resultado da melhoria das relações entre o Japão e a Coreia do Sul, a animosidade subjacente em relação à história permanece, principalmente no que diz respeito à disputa por uma ilha. A cúpula foi um passo crucial em frente, mas é frágil, com muito potencial para que algumas das questões subjacentes surjam e descarrilem o progresso que foi feito."

Terence Roehrig, professor de assuntos nacionais e analista do Programa de Segurança Internacional da Faculdade Kennedy da Universidade de Harvard


Arquivo pessoal - Thomas Cymkin, analista da Iniciativa de Segurança Indo-Pacífica e especialista em política da Ásia pelo think tank Atlantic Council (em Washington)

"A declaração O Espírito de Camp David, emitida pelos três líderes, é um acordo político, em vez de um acordo legal que exige assinatura, mas é em si um documento poderoso. Representa um grande esforço para estabelecer precedentes, criar impulso e definir o rumo para a cooperação de segurança trilateral entre os três países."

Thomas Cymkin, analista da Iniciativa de Segurança Indo-Pacífica e especialista em política da Ásia pelo think tank Atlantic Council (em Washington)

 

 

  

Fotos: Arquivo pessoal - Terence Roehrig, professor de assuntos nacionais e analista do Programa de Segurança Internacional da Faculdade Kennedy da Universidade de Harvard
Arquivo pessoal - Thomas Cymkin, analista da Iniciativa de Segurança Indo-Pacífica e especialista em política da Ásia pelo think tank Atlantic Council (em Washington)

Eu acho...

"É importante lembrar que, embora a cúpula tenha sido resultado da melhoria das relações entre o Japão e a Coreia do Sul, a animosidade subjacente em relação à história permanece, principalmente no que diz respeito à disputa por uma ilha. A cúpula foi um passo crucial em frente, mas é frágil, com muito potencial para que algumas das questões subjacentes surjam e descarrilem o progresso que foi feito."

Terence Roehrig, professor de assuntos nacionais e analista do Programa de Segurança Internacional da Faculdade Kennedy da Universidade de Harvard

 

"A declaração O Espírito de Camp David, emitida pelos três líderes, é um acordo político, em vez de um acordo legal que exige assinatura, mas é em si um documento poderoso. Representa um grande esforço para estabelecer precedentes, criar impulso e definir o rumo para a cooperação de segurança trilateral entre os três países."

Thomas Cymkin, analista da Iniciativa de Segurança Indo-Pacífica e especialista em política da Ásia pelo think tank Atlantic Council (em Washington)