Em maio de 2022, três meses depois de a Rússia invadir a Ucrânia, Dmytro Kovalchuk ajudou a fundar a empresa Warbirds of Ukraine ("Pássaros de guerra da Ucrânia"). A companhia produz drones de reconhecimento, de ajuste de artilharia e camicases. "Fabricamos mais de 400 drones, de vários tipos, por mês. Nosso principal modelo, o Galka, ajuda a artilharia a atingir o alvo", explicou ao Correio, por meio do WhatsApp. "Tenho bastante experiência em comandar drones. No começo da guerra, controlei algumas dessas aeronaves não tripuladas e ajudei nossos soldados em operações perto de Kiev e em Donestk", acrescentou o executivo, que vive com a família na capital ucraniana. A Warbirds of Ukraine mantém contratos com o Ministério da Defesa e é um dos componentes do esforço bélico do governo de Volodymyr Zelensky.
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Além de empresas locais, os Estados Unidos também fornecem os aparelhos voadores para a Ucrânia — o principal modelo é o MQ-9 Reaper, com mais de 24 horas de autonomia de voo e velocidade máxima de 480km/h. Em junho passado, os ucranianos anunciaram que tinham perdido 10 mil drones em um único mês, ou mais de 300 por dia.
Do outro lado do conflito, a Rússia tem utilizado drones para infligir danos no território do vizinho, inclusive iranianos, como o Shahed (Gerânio) e o Mado MD-550. Também mantém fabricação própria, como o Lancet-3, um equipamento capaz de levar 3kg de carga explosiva e de alcançar até 40km, voando a 110km/h. A guerra entre russos e ucranianos tem se destacado por seu caráter tecnológico. Drones capazes de mergulhar no alvo e causar destruição e mortes revolucionaram o campo de batalha.
A Rússia anunciou, na quarta-feira (9/8), que derrubou dois drones ucranianos que voavam em direção a Moscou. O governo de Vladimir Putin prometeu uma "resposta adequada" à multiplicação de "ameaças" em sua fronteira ocidental. Em 29 de julho passado, um drone atingiu um complexo de escritórios em um arranha-céu de Moscou. Um vídeo divulgado pelas redes sociais mostra uma criança, aos gritos, observando a aproximação da aeronave tripulada e uma violenta explosão.
No dia seguinte, Zelensky advertiu: "A guerra está voltando gradualmente ao território da Rússia, aos seus centros simbólicos e bases militares, e este é um processo inevitável, natural e absolutamente justo". O Kremlin foi alvo de um ataque com drone, em 3 de maio deste ano, e o porta-voz de Putin, Dmitry Peskov, chegou a denunciar uma tentativa de assassinato contra o presidente. O Mar Negro e a Penínsuila da Crimeia também se tornaram teatros de operações desse tipo de armamento, em sua versão aquática.
Papel decisivo
Mykola Volkivskyi — ex-conselheiro do presidente do Parlamento da Ucrânia — admite que os drones navais recém-desenvolvidos pela Ucrânia podem desempenhar um papel decisivo na planejada libertação dessas duas áreas. "Cada drone está equipado com dispositivos de visão noturna e com comunicação especial protegida da vigilância eletrônica, além de piloto automático. Eles mostraram sua eficácia em destruir alvos inimigos no mar", disse ao Correio. Em 4 de agosto, um desses equipamentos atingiu o SIG, um dos maiores petroleiros russos, no Estreito de Kerch, no Mar Negro. Todo o ataque foi gravado e transmitido pelas redes sociais.
Ainda segundo Volkivskyi, é importante destacar que cada ataque feito por drones ucranianos em alvos na Rússia reduz, de forma significativa, a capacidade do Kremlin de guerrear contra a Ucrânia. "Há uma discordância crescente entre os comandantes russos e o Ministério da Defesa em relação a esses precedenntes", alertou. "Desde o começo da guerra, o Exército russo tem usado drones camicazes vendidos pelo Irã, como o Shahed. Por sua vez, a Ucrânia vem aumentando a produção de seus drones. A guerra de drones também ocorre em solo. Muitos empreendimentos estão em fase de finalização. Em breve, veremos como eles serão eficientes."
Kovalchuk assegura que, em 532 dias de guerra, os drones ajudaram a Ucrânia a economizar projéteis de artilharia e a salvar a vida de soldados. "Os drones estão mudando muito e se tornando mais inteligentes. Muitos são dotados de computadores especiais, com softwares e inteligência artificial. Os drones que fabricamos podem atingir o alvo por conta própria e voar sem o auxílio de GPS."
"Os principais drones que vendemos para o Ministério da Defesa são o Galka e o FPV. O primeiro deles é um aparelho de reconhecimento e de ajuste de artilharia, que pode ser controlado remotamente, a até 50km de distância. Tem autonomia de três horas de voo, faz fotos e vídeos online e custa cerca de US$ 10 mil (ou R$ 49 mil). O FPV, por sua vez, tem característica de ser camicase e é vendido a US$ 650 (ou R$ 3,18 mil). Ele voa por até 15 minutos em uma única direção, com uma bomba, como se fosse um quadricóptero", acrescentou o empresário.
Em entrevista ao jornal francês Le Monde, Ulrike Franke, pesquisadora do Conselho Europeu sobre Relações Exteriores e especialista em veículos aéreos não tripulados, classificou de "excepcional" a quantidade de drones utilizados na guerra entre Moscou e Kiev. "A Ucrânia é claramente o conflito onde esses aparelhos são usados de forma mais massiva, com muitos modelos diferentes", afirmou.