A maior parte da comissão técnica da Espanha que comandou a vitória da seleção feminina do país na Copa do Mundo, com exceção do técnico Jorge Vilda, renunciou ao cargo diante da disputa envolvendo Luis Rubiales, presidente da Federação Espanhola de Futebol (RFEF, na sigla em espanhol). O anúncio foi feito neste sábado.
Esse é mais um capítulo da grave crise pela qual passa o futebol espanhol depois que a seleção feminina do país venceu a Copa do Mundo, no domingo (20/8), por 1 a 0, contra a Inglaterra.
Na comemoração do título, Rubiales beijou os lábios da jogadora Jenni Hermoso. Ela diz que o beijo não foi consensual. Já o dirigente afirma que a atacante, de 33 anos, permitiu o ato.
Os assistentes técnicos Montse Tome, Javier Lerga e Eugenio Gonzalo Martin, juntamente com a fisioterapeuta Blanca Romero Moraleda e o treinador de goleiros Carlos Sanchez, se demitiram.
Seis outros profissionais que atuam na seleção também se renunciaram aos seus cargos.
Mesmo com o título inédito, a conquista foi ofuscada pelo episódio. Abaixo, listamos os momentos que refletem a grave crise no futebol espanhol.
1 - Título e beijo
A Espanha venceu sua primeira Copa do Mundo em Sydney, na Austrália, no domingo.
Momentos após o fim da partida, na comemoração do conquista inéditao, o presidente da Federação Espanhola, Luis Rubiales, beijou a atacante Jenni Hermoso.
Hermoso inicialmente disse no Instagram que "não gostou" das ações de Rubiales. Ela disse que o beijo não foi consensual, mas a versão dos acontecimentos da jogadora é contestada por Rubiales.
A federação afirma que tomará medidas legais contra a jogadora.
Na sexta-feira, a Hermoso divulgou um longo comunicado nas redes sociais:
“Quero deixar claro que em nenhum momento ocorreu a conversa a que o senhor Luis Rubiales se refere em seu discurso e, acima de tudo, que o beijo nunca foi consensual”.
A atacante, que joga no clube mexicano Pachuca, acrescentou que as afirmações do dirigente são "categoricamente falsas e fazem parte da cultura manipuladora que ele gerou. Simplesmente, não fui respeitada."
2 - Repercussão e protestos
O comportamento de Rubiales atraiu muitas críticas e protestos, com ministros do governo espanhol exigindo sua renúncia.
Rubiales pediu desculpas pelo beijo na segunda-feira (21/8), mas o primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sánchez, disse que isso "não foi suficiente" e a segunda vice-primeira-ministra, Yolanda Diaz, juntou-se aos que pediram sua renúncia.
Beatriz Alvarez, presidente da Liga F, principal liga feminina da Espanha, criticou o dirigente: “Seu ego é maior que sua dignidade e honra."
“Acho que mais pessoas vão aderir [às mobilizações de protesto contra o cartola], dada a falta de determinação de Luis Rubiales [em renunciar], outras pessoas estão começando a se manifestar”, afirmou.
Na quinta-feira, a Fifa disse ter aberto um processo disciplinar contra Rubiales, e a RFEF convocou uma assembleia geral extraordinária na sexta-feira.
3 - ‘Não vou renunciar’
Na sexta-feira (25/8), durante a assembleia extraordinária da Federação Espanhola de Futebol, Luis Rubiales afirmou novamente que o beijo foi consentido e que ele não iria renunciar ao cargo.
“O falso feminismo é um grande flagelo deste país. Isso é um assassinato social. Vocês acreditam que é preciso fazer essa caça às bruxas? Eu não vou renunciar, não vou renunciar”, disse Rubiales.
Ele também afirmou que o beijo foi “apenas um selinho” como o que ele dá em uma de suas filhas.
Após o discurso, Rubiales foi aplaudido de pé pela plateia do evento. Entre os espectadores que o aplaudiram estava o técnico da seleção masculina da Espanha, Luis De la Fuente.
Neste sábado, De la Fuente se posicionou de maneira contrária, criticando o dirigente. “O comportamento de Luis Rubiales não respeitou o protocolo mínimo que deve ser seguido nestes atos comemorativos.”
"Não são edificantes nem apropriados para uma pessoa que representava todo o futebol espanhol. Ele próprio reconheceu publicamente a inadequação do seu comportamento", escreveu o treinador.
4 - Demissão da comissão técnica e gancho da Fifa
Em comunicado de demissão, os 11 profissionais da comissão técnica criticaram a postura de Rubiales e defenderam Jenni Hermoso:
“Os abaixo mencionados expressam a sua firme e contundente condenação à conduta demonstrada pelo presidente da RFEF. Ele contou uma história que não reflete de forma alguma o que Jenni Hermoso sentiu, que afirmou expressamente que se sentia ‘vítima de agressão’. Dadas as atitudes e declarações inaceitáveis ??do presidente, eles tomaram a decisão de se demitirem de suas funções”.
O técnico da seleção feminina, Jorge Vilda, é aliado de Rubiales e até o momento permanece no cargo.
Na sexta-feira, o dirigente afirmou que queria assinar um novo contrato de quatro anos com o treinador. O salário seria de 500 mil euros (cerca de R$ 2,6 milhões) por ano.
No ano passado, Vilda se segurou no comando do time mesmo após uma revolta das jogadoras. Na ocasião, 15 atletas enviaram e-mails idênticos à direção da equipe dizendo que não jogariam a menos que preocupações “significativas” sobre “estado emocional” e “saúde” fossem abordadas.
Na noite deste sábado, porém, Vilda emitiu um comunicado classificando o momento do beijo como “inapropriado e inaceitável”.
“Não há dúvida de que é inaceitável e não reflete em nada os princípios e valores que defendo na minha vida, no desporto em geral e no futebol em particular. Gerou-se um clima claramente indesejável, longe do que deveria ter sido uma grande celebração do desporto espanhol e do desporto feminino”, afirmou.
No início do sábado, a Fifa anunciou a decisão de “suspender provisoriamente Luis Rubiales de todas as atividades relacionadas com o futebol a nível nacional e internacional”.
Em resposta, a RFEF disse que Rubiales iria “se defender legalmente”.
A entidade máxima do futebol mundial também ordenou que Rubiales ou qualquer representante da federação espanhola se abstivessem de tentar entrar em contato com Jenni Hermoso.
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