Na última década, incêndios florestais tornaram-se cada vez mais comuns devido às mudanças climáticas causadas pelo homem e às práticas destrutivas de manejo da terra. O sul da Califórnia, nos Estados Unidos, foi especialmente afetado por esse problema.
O sul da Califórnia também teve uma onda de incêndios florestais há cerca de 13 mil anos. Esses incêndios transformaram permanentemente a vegetação da região e contribuíram para o maior evento de extinção em massa da Terra em mais de 60 milhões de anos.
Como paleontólogos, temos uma perspectiva única sobre as causas e consequências de longo prazo das mudanças ambientais, tanto as ligadas a flutuações climáticas naturais quanto as causadas pelo homem.
Em um novo estudo, publicado neste mês de agosto, buscamos entender as mudanças que estavam acontecendo na Califórnia durante o último grande evento de extinção, no final do Pleistoceno, período conhecido como Idade do Gelo.
O evento eliminou a maioria dos grandes mamíferos da Terra entre cerca de 10 mil e 50 mil anos atrás. Foi uma época marcada por mudanças climáticas dramáticas e populações humanas em rápida expansão.
A última grande extinção
Os cientistas costumam chamar os últimos 66 milhões de anos da história da Terra de Era dos Mamíferos. Durante esse tempo, os mamíferos aproveitaram a extinção dos dinossauros para se tornar os animais dominantes do planeta.
Durante o Pleistoceno, a Eurásia e as Américas estavam cheias de enormes animais como mamutes lanudos, ursos gigantes e lobos enormes. Duas espécies de camelos, três espécies de preguiças terrestres e cinco espécies de grandes felinos viviam na região onde hoje é Los Angeles.
Então, abruptamente, eles começaram a morrer. Em todo o mundo, os grandes mamíferos que caracterizaram os ecossistemas globais por dezenas de milhões de anos desapareceram. A América do Norte perdeu mais de 70% dos mamíferos com peso superior a 44 quilos. A América do Sul perdeu mais de 80%, a Austrália quase 90%. Apenas a África, a Antártica e algumas ilhas remotas mantêm o que poderia ser considerado comunidades de animais como as que existiam antes.
A razão para essas extinções permanece desconhecida. Durante décadas, paleontólogos e arqueólogos debateram as possíveis causas. O que complica a análise dos cientistas não é que não haja culpados óbvios — pelo contrário, existem muitos.
Com o fim da última era glacial, um clima mais quente levou a padrões climáticos alterados e à reorganização das cadeias vegetais. Ao mesmo tempo, as populações humanas estavam aumentando rapidamente e se espalhando pelo globo.
Um ou ambos os processos podem ter resultado no evento de extinção. Mas o registro fóssil de qualquer região geralmente é muito escasso para saber exatamente quando grandes espécies de mamíferos desapareceram de diferentes regiões.
Isso dificulta determinar se a culpa é da perda de habitat, da escassez de recursos, de desastres naturais, da caça humana ou de uma combinação desses fatores.
Uma combinação mortal
Alguns registros oferecem pistas. Os poços de piche de La Brea, em Los Angeles, são o local do mundo mais cheio de fósseis da era do gelo. Eles preservam os ossos de milhares de grandes mamíferos que ficaram presos em betume nos últimos 60 mil anos.
As proteínas nesses ossos podem ser datadas com precisão usando carbono radioativo, dando aos cientistas uma visão sem precedentes de um ecossistema antigo e uma oportunidade de iluminar o momento — e as causas — de seu colapso.
Nosso estudo recente em La Brea e nas proximidades do Lago Elsinore desenterrou evidências de um evento dramático 13 mil anos atrás que transformou permanentemente a vegetação do sul da Califórnia e causou o desaparecimento dos icônicos megamamíferos de La Brea.
Arquivos de sedimentos do fundo do lago e registros arqueológicos fornecem evidências de uma combinação mortal — um clima mais quente pontuado por décadas de secas e populações humanas em rápido crescimento. Esses fatores levaram o ecossistema do sul da Califórnia a um ponto crítico.
Combinações semelhantes de aquecimento climático e impactos humanos foram responsáveis por extinções da era do gelo em outros lugares, mas nosso estudo encontrou algo novo. O catalisador para essa transformação dramática parece ter sido um aumento sem precedentes de incêndios florestais, provavelmente provocados por humanos.
Os processos que levaram a esse colapso são familiares hoje.
À medida que a Califórnia se aqueceu saindo da última era glacial, a paisagem tornou-se mais seca e as florestas recuaram. Em La Brea, as populações de herbívoros diminuíram, provavelmente devido a uma combinação de caça humana e perda de habitat. Espécies associadas a árvores, como camelos, desapareceram completamente.
No milênio que antecedeu a extinção, as temperaturas médias anuais na região 5,5 graus Celsius e o lago começou a evaporar. Então, 13,2 mil anos atrás, o ecossistema entrou em uma seca de 200 anos. Metade das árvores restantes morreram. Com menos grandes herbívoros para comer, a vegetação morta se acumulou na paisagem.
Ao mesmo tempo, as populações humanas começaram a se expandir pela América do Norte. E à medida que se espalharam, as pessoas trouxeram consigo uma nova e poderosa ferramenta — o fogo.
Os humanos usaram o fogo por centenas de milhares de anos, mas o fogo tem impactos diferentes em diferentes ecossistemas.
Registros do Lago Elsinore revelam que, antes dos humanos, a presença de fogo era baixa no litoral sul da Califórnia. Mas entre 13,2 mil e 13 mil anos atrás, com o crescimento da população humana, o fogo na região aumentou muito rapidamente.
Nossa pesquisa sugere que a combinação de calor, seca, perda de animais herbívoros e incêndios provocados pelo homem levou esse ecossistema a um ponto crítico.
No final desse período, o sul da Califórnia estava coberto de chaparrais (bioma de vegetação baixa que consegue se recuperar após um incêndio), que prosperaram após os incêndios. Um novo regime de fogo se estabeleceu e a icônica megafauna de La Brea desapareceu.
Lições para o futuro
Estudar as causas e consequências das extinções do Pleistoceno na Califórnia pode fornecer um contexto valioso para a compreensão das atuais crises climáticas e de biodiversidade. Hoje, está acontecendo novamente uma combinação semelhante de aquecimento climático, expansão das populações humanas, perda de biodiversidade e incêndios provocados pelo homem que caracterizaram o intervalo de extinção da era do gelo no sul da Califórnia.
A diferença alarmante é que as temperaturas hoje estão subindo 10 vezes mais rápido do que no final da era glacial, principalmente por causa da queima de combustíveis fósseis. Essa mudança climática causada pelo homem contribuiu para um aumento de cinco vezes na frequência e intensidade dos incêndios e na quantidade de área queimada no estado da Califórnia nos últimos 45 anos.
Embora a Califórnia seja agora famosa pelos incêndios extremos, nosso estudo revela que o fogo é um fenômeno relativamente novo nesta região. Nos 20 mil anos que antecederam a extinção, o registro do Lago Elsinore mostra uma incidência muito baixa de qualquer incêndio, mesmo durante períodos comparáveis de seca. Somente após a chegada humana o fogo se torna uma parte regular do ecossistema.
Ainda hoje, linhas de energia derrubadas, fogueiras e outras atividades humanas iniciam mais de 90% dos incêndios florestais na costa da Califórnia.
Os paralelos entre as extinções da megafauna do final do Pleistoceno e as crises ambientais atuais são impressionantes.
O passado nos ensina que os ecossistemas dos quais dependemos são vulneráveis ao colapso quando pressionados por múltiplas pressões. Redobrar os esforços para eliminar as emissões de gases de efeito estufa, evitar incêndios imprudentes e preservar a megafauna remanescente da Terra pode ajudar a evitar outra transformação ainda mais catastrófica.
*Emily Lindsey é curadora do sítio paleontológico de La Brea e professora da Universidade da Califórnia UCLA
*Lisa N. Martinez é doutorando de geografia da Universidade da Califórnia
*Regan E. Dunn é professor do USC Dornsife College of Letters, Arts and Sciences
**Este artigo foi publicado no site de divulgação científica The Conversation e reproduzido aqui sob a licença Creative Commons. Clique aqui para ler a versão original em inglês.
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