Guerra no Leste Europeu

Ucrânia descobre complô para matar o presidente Volodymyr Zelensky

Serviço de Segurança do Estado da Ucrânia anuncia prisão de mulher que teria ajudado a Rússia a coletar dados sobre a viagem do chefe de Estado à região de Mykolaiv, no sul, onde ele seria assassinado. Tentativa de magnicídio ocorreria em julho

Rodrigo Craveiro
postado em 08/08/2023 06:00
Volodymyr Zelensky, presidente da Ucrânia: vigilância reforçada e medidas extremas de segurança -  (crédito: Serviço de Imprensa Presidenical da Ucrânia/AFP)
Volodymyr Zelensky, presidente da Ucrânia: vigilância reforçada e medidas extremas de segurança - (crédito: Serviço de Imprensa Presidenical da Ucrânia/AFP)

O Serviço de Segurança do Estado da Ucrânia (SBU, pela sigla em ucraniano) anunciou ter desmantelado um plano para assassinar o presidente Volodymyr Zelensky, em julho. O magnicídio ocorreria durante visita do chefe de Estado à região de Mykolaiv (sul). "O SBU deteve uma informante dos serviços especiais da Federação Russa, que, na véspera da recente viagem de trabalho do presidente,  coletava  inteligência sobre a planejada visita", afirma o organismo do governo de Kiev. Segundo o comunicado, a mulher detida sob suspeita de contribuir com o suposto complô russo era ex-vendedora em uma loja militar na cidade de Ochakiv, por onde Zelensky passou. Ainda de acordo com o SBU, a suspeita trabalhou para traçar os horários da visita de Zelensky, os locais em que ele estaria e a rota aproximada de sua comitiva. Se for considerada culpada, ela poderá ser sentenciada a 12 anos de prisão. 

A tentativa de assassinato teria fracassado porque o SBU realizou ações para afastar a mulher, cuja identidade não foi revelada, dos locais visitados por Zelensky, impedindo-a de obter informações concretas. A prisão teria ocorrido em 1º de agosto, mas somente foi tornada pública nesta segunda-feira (7/8). No dia da visita, agentes ucranianos reforçaram a vigilância da informante e limitaram a movimentação dela. Mesmo depois da passagem de Zelensky por Mykolaiv, o SBU manteve o rastreamento da mulher e descobriu que a Rússia a incumbiu de fornecer os dados sobre a localização paióis de munição das Forças Armadas em Ochakiv, que seriam alvos de um ataque aéreo de grandes proporções. 

Agentes dos Serviços de Segurança da Ucrânia detêm suspeita  de contribuir com Moscou
Agentes dos Serviços de Segurança da Ucrânia detêm suspeita de contribuir com Moscou (foto: Serviços de Segurança da Ucrânia)

Mykola Volkivskyi — ex-conselheiro do presidente do Parlamento da Ucrânia — explicou ao Correio que tentativas de assassinato contra Zelensky tornaram-se mais frequentes após o início da invasão russa, em 24 de fevereiro de 2022. "No entanto, em setembro de 2021, Zelensky discursou na Assembleia Geral da ONU e reagiu à tentativa de assassinato de seu primeiro assistente Serhiy Shefir e prometeu uma 'resposta contundente'", lembrou. "O presidente mencionou, na época, que os responsáveis poderiam ser agentes internos ou  externos, e atribuiu o crime ao preço pelas reformas na Ucrânia." O carro de Shefir foi alvejado com dez tiros quando passava por uma área de floresta, ao sul de Kiev. O auxiliar de Zelensky acabou atingido por três disparos e teve que ser submetido a uma cirurgia. 

Para Volkivskyi, o complô mais recente contra Zelensky é "o preço pela paz e pela liberdade". "Em janeiro de 2023, a CIA (Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos) revelou que houve pelo menos 12 tentativas de assassinar o presidente ucraniano. Eles impediram duas delas. Os serviços de inteligência da Ucrânia e seus parceiros estão constantemente alertando e fazendo ataques preventivos, adiantando-se a esses crimes", sublinhou.  

Por sua vez, Anton Suslov — especialista da Escola de Análise Política (em Kiev) — assegurou à reportagem que, ainda que um dos muitos planos para matar Zelensky tivesse sido bem-sucedido, a guerra em nada mudaria. "De fato, o presidente Zelensky é um símbolo importante da luta da Ucrânia contra a Rússia e seu assassinato seria um fator desmoralizante. No entanto, o sistema político ucraniano, assim como a nação em geral, é descentralizado o suficiente para não depender de uma pessoa em particular, mesmo que ela seja o presidente."

Bombardeio

Bombeiros socorrem moradora de Pokrovsk, em Donetsk, ferida durante ataque aéreo russo
Bombeiros socorrem moradora de Pokrovsk, ferida em ataque aéreo (foto: Serviço de Emergência da Ucrânia/AFP)
 

No início da tarde desta segunda-feira (hora de Brasília), Zelensky publicou um vídeo sobre um novo bombardeio, atribuído à Rússia, contra um prédio residencial de Pokrovsk, na região de Donetsk, no leste da Ucrânia. "Cidade de Pokrovsk, no Donbass, onde a Rússia tenta deixar apenas pedras quebradas e queimadas. Dois ataques de mísseis. Um prédio residencial comum atingido. Infelizmente, há vítimas", lamentou o presidente. "Temos que parar o terror russo. Todos os que lutam pela liberdade da Ucrânia salvam vidas. (...) A Rússia será responsabilizada por tudo o que fez nesta terrível guerra." 

O ataque aéreo deixou pelo menos cinco mortos e 31 feridos, segundo um balanço divulgado pelas forças oficiais de Kiev. Entre os mortos, está um socorrista que participava das operações de resgate e foi atingido em cheio pelo segundo míssil. Pokrovsk está localizada a cerca de 70km a noroeste da cidade de Donetsk, sob comando russo e a 50km do front. Depois de invadir a Ucrânia, a Rússia fracassou em controlar Kiev, mas assumiu regiões no leste e no sul do país. As forças ucranianas tentam recuperar essas áreas com a contraofensiva iniciada em junho. 

Depois de uma reunião com a Arábia Saudita sobre o conflito com a Ucrânia, a Rússia avisou que somente a rendição de Kiev colocará fim à guerra. "Estamos convencidos de que um acordo verdadeiramente global, duradouro e justo é possível apenas se o regime de Kiev puser fim às hostilidades e aos atentados terroristas", declarou a porta-voz da diplomacia russa, Maria Zakharova, em um comunicado. "As novas realidades territoriais (no leste e no sul da Ucrânia) devem ser reconhecidas, e a desmilitarização e a desnazificação da Ucrânia (...), garantidas", acrescentou.

 

EU ACHO...

Mykola Volkivskyi, 27 anos, ex-assessor do presidente do Parlamento (2014-2021) e cientista político, morador de Kiev
Mykola Volkivskyi, ex-conselheiro do presidente do Parlamento da Ucrânia (foto: Arquivo pessoal )

"Por causa das ameaças de assassinato, as viagens de Zelensky ao exterior são planejadas com o máximo segredo. As autoridades da Ucrânia ficaram insatisfeitas quando os dados sobre uma visita planejada do presidente a Bruxelas vazaram em fevereiro, três dias antes da viagem. Formalmente, de acordo com a Constitituição ucraniana, a linha de sucessão no país é bem estruturada: se algo ocorrer ao presidente, o chefe do Parlamento, Ruslan Stefanchuk, assume suas funções."

Mykola Volkivskyi, ex-conselheiro do presidente do Parlamento da Ucrânia

 

Anton Suslov, especialista da Escola de Análise Política (naUKMA), em Kiev
Anton Suslov, especialista da Escola de Análise Política (naUKMA), em Kiev (foto: Arquivo pessoal)

"É muito interessante o fato de que os russos não possam compreender a diferença entre a Rússia e a Ucrânia, e considerem o Estado em termos muito personalistas. Eles acreditam que, se o líderfor assassinado, a nação fracassará. Isso não é algo válido para a Ucrânia.Em vez disso, esse modo de pensar é sintomático da sociedade russa."

Anton Suslov, especialista da Escola de Análise Política (em Kiev)

 

 

 

"É muito interessante o fato de que os russos não possam compreender a diferença entre a Rússia e a Ucrânia, e considerem o Estado em termos muito personalistas. Eles acreditam que, se o líderfor assassinado, a nação fracassará. Isso não é algo válido para a Ucrânia.Em vez disso, esse modo de pensar é sintomático da sociedade russa."

Anton Suslov, especialista da Escola de Análise Política (em Kiev)

  • Agentes ucranianos detêm suspeita de contribuir com Moscou
    Agentes dos Serviços de Segurança da Ucrânia detêm suspeita de contribuir com Moscou Foto: Serviços de Segurança da Ucrânia
  • Bombeiros socorrem moradora de Pokrovsk, ferida em ataque aéreo
    Bombeiros socorrem moradora de Pokrovsk, ferida em ataque aéreo Foto: Serviço de Emergência da Ucrânia/AFP
  • Mykola Volkivskyi, 27 anos, ex-assessor do presidente do Parlamento (2014-2021) e cientista político, morador de Kiev
    Mykola Volkivskyi, ex-conselheiro do presidente do Parlamento da Ucrânia Foto: Fotos: Arquivo pessoal
  • Anton Suslov, especialista da Escola de Análise Política (naUKMA), em Kiev
    Anton Suslov, especialista da Escola de Análise Política (naUKMA), em Kiev Foto: Arquivo pessoal
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