Lisboa — Diante da fuga cada vez maior de fiéis da Igreja — o Censo de 2022 deve mostrar, pela primeira vez, que os católicos são menos de 50% da população no Brasil —, o papa Francisco aproveitou uma multidão de 500 mil pessoas para tentar conter esse êxodo. Em discurso na primeira missa que rezou na Jornada Mundial da Juventude (JMJ), ele repetiu, por diversas vezes, que há espaço para todos na Igreja, “para quem erra, para quem cai, para quem sente dificuldades”.
São fortes as críticas de que a estrutura encravada no Vaticano mantém os dois pés no atraso, não se adequando ao mundo real, sobretudo aquele vislumbrado pelos jovens, os que lotaram o Parque Eduardo VII para ouvir o pontífice nesta quinta-feira (03/08).
“Na Igreja, há espaço para todos e, quando não houver, por favor, façamos que haja”, afirmou Francisco a um público que não quer ser julgado por suas escolhas, pela opção sexual, por sua cor, se são ricos ou pobres. A palavra mais ouvida na multidão era diversidade. É isso o que todos querem ver na Igreja, sem que seja preciso quebrar todas as tradições.
Há o reconhecimento de que o papa tem promovido avanços importantes, mas há uma clara resistência na ponta. Os padres, os mais próximos dos fiéis, ainda cultivam preconceitos que assustam os mais jovens, que, quando buscam a Igreja, esperam acolhimento e solidariedade, mas quase sempre não têm esse retorno. “A juventude precisa ter voz e ser ouvida”, afirmou o brasileiro Luiz Fernando, 20 anos, de Salvador.
A convocação do papa explicitou, também, a enorme preocupação da Igreja com a competição de sofre das redes sociais. O mundo virtual, ressaltou o pontífice, está tirando muita gente de dentro dos templos. O compromisso da presença nas missas está rareando.
Não à toa, Francisco atacou a força dos algoritmos e dirigiu-se aos jovens: “O teu nome aparece nas redes sociais, é processado por algoritmos que lhe associam gostos e preferências, para pesquisas de mercado. Quantos lobos se escondem por trás de sorrisos de falsa bondade, dizendo que conhecem que és, mas sem te querer bem, prometendo que serás alguém, para depois te deixarem sozinho, quando já não lhes fores útil? São ilusões do mundo virtual”, disse.
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Abusos sexuais
Segundo o papa, ninguém da Igreja tem o direito de apontar o dedo a quem quer que seja. “Somos todos pecadores, todos cheios de limitações. Portanto, que as portas da Igreja sejam abertas, sem muros”, ressaltou. Anteontem, ele se encontrou com 13 vítimas de abusos sexuais quando ainda eram menores de idade cometidos por clérigos católicos.
Francisco pediu perdão. A falta de punição aos pedófilos e a hipocrisia dos que estão à frente da Igreja têm sido dois principais motivos para a fuga de fiéis. “Somos amados como somos. Todos devem ser o que são, não o que a sociedade quer que sejam”, frisou.
A imperfeição da Igreja, na avaliação do papa, deve ser motivo de constantes questionamentos, em especial por parte dos mais jovens. “Nunca deixem de perguntar, pois isso é muito bom, muitas vezes, é melhor que dar respostas. Quem pergunta permanece inquieto, um remédio contra a normalidade rasteira que anestesia a alma”, enfatizou. Francisco sabe que não há espaço para meias palavras ante a ansiedade dos jovens. Assim como milhares cruzaram o mundo para participar da Jornada em Portugal, podem, a qualquer momento, romper todos os laços que mantêm com o catolicismo.
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