França

França em alerta após mais grave onda de protestos em 18 anos

Macron adia viagem à Alemanha e ministros ficam de sobreaviso, em meio à onda de distúrbios deflagrada pela execução de um jovem pela polícia. Corpo de Nahel, de 17 anos, foi enterrado em cerimônia privada no subúrbio de Paris

Correio Braziliense
postado em 02/07/2023 06:00
 (crédito:  AFP)
(crédito: AFP)

A onda de distúrbios que varre a França — a mais grave em 18 anos — se instalou no Palácio do Eliseu a ponto de alterar a agenda do presidente Emmanuel Macron e gerou um clima de forte apreensão em todo o país. A violência teve início após o assassinato do jovem Nahel, 17 anos, morto com um tiro à queima-roupa por um agente durante um blitz em Nanterre, subúrbio de Paris. O corpo do rapaz foi enterrado ontem, após uma madrugada de protestos e saques, que terminou com 1.311 detenções.

Ontem, novas manifestações ocorreram, sobretudo em Marselha, a segunda maior cidade do país. Diante da gravidade da situação, Macron adiou a visita de dois dias que faria a partir de hoje à Alemanha.

O governo organizou uma nova reunião de crise e a premiê Elisabeth Borne pediu aos ministros que permanecessem em Paris durante o fim de semana. Um efetivo de 45 mil agentes antidistúrbios foi mobilizado para conter os manifestantes, a maioria adolescentes. Macron, ainda na sexta-feira, chegou a pedir que os pais mantivessem seus filhos em casa.

A rotina dos franceses sofreu um forte revés. Os distúrbios afetaram a vida social, enquanto comerciantes contabilizam os prejuízos causados pela destruição de lojas e saques. "Na segunda-feira, coloco tudo à venda, já chega", desabafou a proprietária de uma loja em uma rua de pedestres cheia de destroços no centro de Lyon.

A marca de moda Céline cancelou seu desfile de moda masculina programado para hoje. Ao anunciar a decisão, o diretor criativo da grife, Hedi Slimane, citou "a evolução incerta desses graves distúrbios", além da "inadequação" de realizar um desfile de moda em um momento em que a França e sua capital estão de luto e desoladas.

Há o receio de que os distúrbios prejudiquem a temporada turística, a apenas um ano dos Jogos Olímpicos de Paris-2024. Reino Unido, Alemanha, Noruega, entre outros países, alertaram seus cidadãos na França para evitarem áreas de tumulto e tomarem precauções extras.

As autoridades impuseram toques de recolher em pelo menos três localidades da região metropolitana de Paris e em várias outras cidades do país. Além de Marselha, as manifestações têm ocorrido com mais violência em Lyon, terceira maior cidade francesa, e em Grenoble.

Segundo o Ministério do Interior, entre sexta-feira e sábado foram registrados 50 ataques a delegacias e uma dezena a quartéis da Gendarmeria — 79 policiais e gendarmes ficaram feridos. Os incidentes resultaram em 1.350 veículos incendiados ou danificados e 1.234 edifícios incendiados, de acordo com o balanço oficial.

Funeral

O funeral de Nahel foi realizado em Nanterre, município ao noroeste de Paris onde ele residia, sem presença de câmeras a pedido da família. Centenas de pessoas se reuniram em frente à funerária em uma mesquita e depois seguiram para o cemitério de Mont-Valérien para o enterro. "Foi uma cerimônia muito tranquila, recolhida e sem incidentes", disse uma testemunha à agência de notícias France Presse.

Nahel, de origem argelina, foi baleado durante uma abordagem policial quando dirigia um carro alugado em Nanterre, na última terça-feira. O incidente reabriu o debate sobre o racismo policial no país. No ano passado, 13 pessoas morreram em circunstâncias semelhantes.

A versão inicial da polícia indicava que o jovem, que já havia se envolvido com agentes em casos semelhantes, havia tentado atropelar os policiais com seu veículo. No entanto, um vídeo amador amplamente divulgado mostrou que ele foi executado à queima-roupa.

Em entrevista à emissora France 5, Mounia, mãe de Nahel, disse que não culpava a polícia como um todo pelo crime, apenas o agente que matou seu único filho. O policial de 38 anos, cujo nome não foi divulgado, teve prisão preventiva decretada por homicídio doloso. Ele pediu desculpas à família do jovem.

A Organização das Nações Unidas (ONU) pediu às autoridades francesas que lidem seriamente com os "profundos" problemas de "racismo e discriminação racial" em suas forças de segurança. Em resposta, o Ministério das Relações Exteriores da França afirmou que essas considerações eram "totalmente infundadas".

 

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