Menos de duas semanas depois da participação na cúpula do G7, em Hiroshima (Japão), o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, tornou a apostar na diplomacia e participou de uma reunião de 50 líderes da Comunidade Política Europeia (CPE) na comuna de Bulboaca, na Moldávia. Durante o encontro, o ucraniano pediu aos governantes que intensifiquem o apoio a Kiev e tornou a defender a entrada de seu país na União Europeia (UE) e na Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Simbólico, o local do encontro — a apenas 20km da fronteira com a Ucrânia e próximo à Transnístria, região separatista moldávia de população formada por russos étnicos — representou uma mensagem desafiadora ao governo do presidente russo, Vladimir Putin.
"A Rússia de Putin se excluiu desta comunidade ao lançar esta guerra contra a Ucrânia", avisou Josep Borrell, alto representante da UE para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança. "Queremos enviar uma mensagem firme de união contra a guerra de Putin na Ucrânia", acrescentou o primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sánchez. O presidente francês, Emmanuel Macron, e Zelensky conversaram e anunciaram a disposição em estabelecer um cronograma para o treinamento de pilotos ucranianos de aviões de combate.
Dionis Cenusa, especialista do Centro de Estudos sobre o Leste Europeu, em Vilnius (Lituânia), explicou à reportagem que a guerra na Ucrânia "contradiz todos os valores europeus, que se baseiam na paz e no respeito ao direito internacional". "A Comunidade Política Europeia e sua segunda cúpula, na Moldávia, são uma resposta geopolítica da UE e dos líderes europeus à agressão militar russa. A Ucrânia e a Moldávia se beneficiam do maior apoio da UE à luz do conflito. No entanto, isso não significa que o bloco aceitará um processo de adesão acelerado para esses países. A UE adota as decisões de adesão com base na unanimidade entre os Estados-membros", comentou.
O estudioso vê os planos da UE de forjarem um cronograma de ajuda financeira de quatro anos à Ucrânia como algo natural. Cenusa frisou que um fundo de apoio será essencial nos esforços de reconstrução do pós-guerra. Professor da Universidade Fairleigh Dickinson e da Universidade de Nova York, e ex-embaixador da Moldávia na ONU, Vlad Lupan admitiu ao Correio que a solidariedade para com a Ucrânia é "uma questão de valores e um tema existencial".
Ele lembrou que a UE foi criada após a Segunda Guerra Mundial para evitar a reincidência de conflitos, por meio de um sistema de Estado de Direito e de comércio mútuo. "Em 2014, os ucranianos saíram 'em massa' para protestar contra a retirada desses valores. A guerra contra a Ucrânia viola as liberdades pelas quais os ucranianos morreram durante as manifestações de nove anos atrás. Se a Rússia ocupar outro território da ex-União Soviética, Putin se sentirá encorajado a continuar as conquistas por meio da subversão e da ocupação, o que seria uma ameaça à Europa", advertiu Lupan.
O ex-embaixador moldávio entende como simbólico o fato de a cúpula da Comunidade Política Europeia ter sido organizada em Moldávia, um país que sofreu com uma guerra com forças pró-Moscou. "É um claro sinal de apoio à Ucrânia em direção à UE. A cúpula e os encontros entre EU, Moldávia e Ucrânia representam um indício de apoio político a ambos", disse. Lupan afirmou que, bem antes da guerra, alertou políticos de um "grande país da UE" a manterem um "diálogo realista" com o Kremlin. "Nações europeias tentarão ajudar países do Leste que aspiram o Estado de Direito e a democracia, e que sofrem os resultados das ações hostis da Rússia."
Ataques
Era Dia das Crianças em muitas ex-repúblicas soviéticas. Por volta das 3h de ontem (21h de quarta-feira em Brasília), Anton Suslov — especialista da Escola de Análise Política (em Kiev) — foi despertado pelo som de várias explosões. "Eu me encontrei com vizinhos no corredor e discutimos se deveríamos nos refugiar na estação de metrô. Enquanto escutava os estrondos, olhei pela janela e vi gente entrando na galeria subterrânea. Decidimos permanecer em casa, ainda que as sirenes aéreas não tenham cessado", relatou ao Correio.
Uma menina de 9 anos e a mãe, além de outro adulto, morreram durante o impacto de um míssil, no bairro de Desnianski. Dez pessoas ficaram feridas. Na região de Belgorod, no lado russo da fronteira, a Rússia alegou ter frustrado uma invasão de tanques e de 70 homens armados à cidade de Shebekino. Vídeos divulgados pelas redes sociais mostravam prédios em chamas.