A novela sobre o acordo para a elevação do teto da dívida do governo dos Estados Unidos está perto do fim. Na noite de quarta-feira (31/5), a Câmara dos Representantes aprovou o aumento, por 314 votos a 117, a cinco dias do prazo estipulado pelo Tesouro. A medida suspende o teto da dívida até o próximo ano e reduz levemente as despesas do governo para 2024. "A aprovação é um primeiro passo crucial para colocar os Estados Unidos de volta aos trilhos", disse o presidente da Câmara, Kevin McCarthy, principal republicano no Congresso. "Faz o que é responsável para os nossos filhos, o que é possível em um governo dividido e o que nossos princípios e compromissos exigem." A expectativa é de que o texto passe pelo Senado e seja finalizado até o fim desta semana para a promulgação do presidente Joe Biden.
De acordo com o site The Hill, o único obstáculo no Senado é a ação de um grupo de republicanos que faz um lobby por medidas de financiamento da guerra na Ucrânia. Existe o temor de que a aprovação na Casa deixe o Pentágono em situação vulnerável, sob o ponto de vista orçamentário. Biden comemorou o aval da Câmara como um "passo crítico" no sentido de resguardar a retomada da economia nacional após a pandemia da covid-19 e destacou o fato de o acordo sobre o aumento ser fruto de um "compromisso bipartidário".
Alguns senadores pressionam a Casa Branca a adotar um pacote de gastos suplementares em defesa, a fim de assegurar o apoio militar à Ucrânia, como contrapartida para o aval final. Chuck Schumer, líder da maioria democrata no Senado, exortou os colegas a não fazerem mudanças na legislação de 99 páginas, o que exigiria o retorno do texto para a Câmara. "O tempo é um luxo; o Senado não o tem, se queremos evitar um default (calote)", declarou.
Jornalista vencedor de dois prêmios Pulitzer, David Wessel — diretor do Centro Hutchins sobre Política Monetária e Fiscal na Brookings Institution — afirmou ao Correio esperar que o Senado aprove o acordo para elevar o teto da dívida federal. "A questão aqui não era o shutdown, algo que ocorre quando se expira a autoridade do governo para os gastos. Uma falha em aumentar o teto da dívida deixaria o Tesouro sem dinheiro para bancar as obrigações que foram aprovadas pelo Congresso", explicou. Por ser algo inédito, o não pagamento dessas contas surtiria efeitos em cascata que nunca foram vistos. "Certamente, seria algo perturbador para o mercado financeiro e corroeria a confiança nos EUA e no funcionamento da democracia."
"Culpa republicana"
Diretor do Programa de Estudos Econômicos da Brookings Institution, Willam Gale também aposta na aprovação pelo Senado e sustenta que um default ou um shutdown seria culpa única e exclusivamente dos congressistas republicanos. "Este tem sido um processo longo e desnecessariamente difícil, com os republicanos promovendo medidas muito austeras apenas para permitir que o governo pague por programas que o Congresso havia autorizado", lembrou à reportagem, por e-mail.
Ainda segundo Gale, o teto da dívida é uma questão exclusivamente americana. Ele sustentou que a maioria das pessoas não compreendem que aumentar o limite da dívida não significa criar novos gastos ou cortes de impostos. "Trata-se de pagar programas que tinham sido autorizados pelo Legislativo. Estranhamente, nos EUA, a legislatura pode aprovar um programa, mas não o financiamento do mesmo. Isso pode colocar o governo em posição impossível: ele deve gastar o dinheiro no programa exigido pelo Legislativo, mas é incapaz de levantar os fundos para bancar esse programa", comentou. Gale defende que o limite da dívida seja abolido e substituído pela regra de que, se o Congresso autorizar um programa, ele avalizará o governo a arrecadar a verba.