As duas maiores potências mundiais tiveram uma conversa aberta sobre temas espinhosos. O encontro entre o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, e o presidente chinês, Xi Jinping, no Grande Salão do Povo, no coração de Pequim, terminou em promessas de estabilização das relações bilaterais e na sensação de progresso. Tanto que o ministro das Relações Exteriores da China, Qin Gang, aceitou o convite do homólogo norte-americano para viajar a Washington, em data ainda a ser definida. A guerra na Ucrânia também foi discutida por Xi e Blinken. Pequim se comprometeu a não enviar armamentos para Moscou. "Nós — e outros países — recebemos garantias da China de que não está (fornecendo) e não vai fornecer assistência letal à Rússia para uso na Ucrânia", disse o enviado do presidente Joe Biden.
"Vim para Pequim com o objetivo de fortalecer os desafios de comunicação de alto nível, para deixar claras nossas posições e intenções em áreas de desacordo e para explorar áreas onde podemos trabalhar juntos quando nossos interesses se alinham em desafios transnacionais compartilhados. E nós fizemos tudo isso", assegurou Blinken. O chefe da diplomacia de Washington reconheceu preocupações da Casa Branca no que diz respeito às "ações provocadoras" da China no Estreito de Taiwan, ao "tratamento injusto" dispensado por Pequim às companhias norte-americanas e às violações dos direitos humanos na província de Xinjiang (noroeste) contra a minoria muçulmana uigur, no Tibet e em Hong Kong.
Cooperação mútua
"Também abordei a questão dos cidadãos dos EUA detidos injustamente e aqueles que enfrentam proibições de saída do país", relatou o secretário. "Enquanto trabalhamos para resolver nossas diferenças, os EUA estão preparados para cooperar com a China em áreas onde temos interesses mútuos, incluindo o clima, a estabilidade macroeconômica, a saúde pública, a segurança alimentar e o combate aos narcóticos", sublinhou Blinken. Ele afirmou não ter ilusões sobre os desafios de administrar a relação com os chineses. "Há muitas questões sobre as quais discordamos profundamente, inclusive de forma veemente. Fizemos progressos e seguiremos adiante. Mas nenhuma dessas questões será resolvida em uma única visita", acrescentou.
A agência de notícias estatal chinesa Xinhua informou que o presidente Xi defendeu uma relação estável entre China e EUA em um mundo em desenvolvimento. "Os interesses comuns dos dois países devem ser valorizados, e seu respectivo sucesso é uma oportunidade, em vez de uma ameaça um ao outro", declarou o anfitrião do encontro. Ele sublinhou a Blinken que a comunidade internacional não quer ver um confronto entre as duas nações nem escolher lados. "Ela espera que os dois países coexistam em paz e tenham relações amistosas e cooperativas. (...) Espero que o secretário Blinken, por meio desta visita, traga um resultado positivo para a estabilização das relações entre China e Estados Unidos", acrescentou. Xi também reconheceu que "os dois lados fizeram progressos e encontraram terrenos comuns em vários pontos específicos", sem, no entanto, detalhá-los.
"Em relação a Taiwan, eu gostaria de reiterar a posição de longa data dos Estados Unidos sobre a política de 'Uma só China'. Essa política não mudou. (...) Nós não apoiamos a independência de Taiwan e nos opomos a qualquer mudança unilateral no status quo por parte de qualquer lado. Continuamos a esperar resoluções pacíficas para as diferenças ao longo do Estreito de Taiwan", garantiu Blinken.
Bonnie Glaser, diretora do Programa Ásia do think tank German Marshall Fund of the United States (em Washington), afirmou ao Correio que tanto a China quanto os EUA concordaram em explorar a possibilidade de estabilização das relações bilaterais. "Se esse objetivo será alcançado, é algo incerto. Esta é uma trégua frágil, na melhor das hipóteses, que poderia facilmente ser descarrilada." A especialista disse nada ter visto de novo nas declarações sobre Taiwan. "Os EUA repetidamente forneceram garantias sobre não apoiar a independência de Taiwan."
"Sinal ruim"
Para Glaser, a negativa de Pequim de retomar os canais de comunicação entre os exércitos dos dois países é um sinal ruim. "Ela sugere que a China não quer reduzir o risco entre as duas forças armadas. Em vez disso, deseja que os EUA parem de operar aeronaves e navios de guerra na periferia da China. Isso não ocorrerá", alertou. "Parece que os chineses acreditam que, ao aumentar o perigo de acidentes na região, eles induzirão os operadores militares norte-americanos a agirem com mais cautela."
Professor de relações internacionais da Universidade de Harvard, Stephen M. Walt concorda que a viagem de Blinken pode ajudar a aliviar um pouco as tensões. "Ela deve auxiliar cada lado a entender o ponto de vista do outro, mas não eliminará a profunda rivalidade entre as duas nações", admitiu ao Correio, por e-mail. Ele explicou que as relações sino-americanas se mantêm tensas por envolverem as duas principais potências do planeta, e cada uma se preocupa com o que a outra possa fazer. "A China gostaria de reduzir gradualmente o papel dos EUA na Ásia, enquanto os Estados Unidos estão determinados a ficar na região."
Walt considera inevitável a competição entre Pequim e Washington. "Chineses e americanos têm se preparado para a possibilidade de o outro se tornar hostil. Mas acho que essa disputa pode ser gerenciada se houver sabedoria de ambos os lados. Nenhum país pode eliminar ou conquistar o outro, o que significa que a coexistência não é apenas desejável, mas inevitável."
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"Os Estados Unidos e a China estão envolvidos em uma competição intensa, e é improvável que isso diminua. A questão é saber se ela pode ser limitada e administrada ou se levará a um conflito militar. Não vejo os chineses buscando uma supremacia militar. Isso não é algo alcançável pelas próximas duas ou três décadas, e Xi Jinping sabe disso. Ele estabeleceu 2049 como uma data-alvo para alcançar um exército de 'classe mundial' e pode tentar atingir esse objetivo ainda mais cedo."
Bonnie Glaser, diretora do Programa Ásia do think tank German Marshall Fund of the United States (sediado em Washington)
"Sobre Taiwan, Blinken reiterou o que tem sido a política dos EUA desde a década de 1970. Ela não apoia a independência taiwanesa, mas não quer que Pequim imponha sua autoridade por meio da força ou se Taiwan não desejar a reunificação. No âmbito da economia, os EUA tentam retardar ou limitar a aquisição de certas tecnologias avançadas pela China, mas não destruir ae economia chinesa ou colocar um fim às relações econômicas."
Stephen M. Walt, professor de relações internacionais da Universidade de Harvard
O medo da independência
O governo comunista chinês considera Taiwan uma ilha rebelde, que não conseguiu reunificar com o restante de seu território desde o fim da guerra civil chinesa em 1949. Pequim teme que Taiwan, a qual classifica como parte inalienável de seu território, tente promulgar a independência. Um ponto de tensão entre Pequim e Washington é o fato de que Taiwan compra armas dos EUA. Por várias vezes, o Partido Comunista Chinês (PCC) ameaçou usar a força para recuperar a ilha capitalista e democrática.