Naufrágio na Grécia

ONU pede ação urgente e decisiva para evitar tragédias no Mediterrâneo

Naufrágio na costa do Peloponeso, no Mediterrâneo, matou ao menos 78. Cerca de 500 migrantes seguem desaparecidos. Agências das Nações Unidas exigem coordenação entre países europeus para resgatar estrangeiros antes de catástrofes

Rodrigo Craveiro
postado em 17/06/2023 06:00
Parentes de desaparecido no naufrágio aguardam notícias em campo de refugiados de Malakasa, perto de Atenas  -  (crédito: Angelos Tzortzinis/AFP)
Parentes de desaparecido no naufrágio aguardam notícias em campo de refugiados de Malakasa, perto de Atenas - (crédito: Angelos Tzortzinis/AFP)

A maior tragédia da história do Mediterrâneo levou a Organização Internacional das Migrações (OIM), parte do sistema da ONU, e o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) a cobrarem uma "ação decisiva e urgente para prevenir mais mortes" nas rotas migratórias pelo mar. Até ea noite desta sexta-feira (16/6), 78 corpos e 104 sobreviventes tinham sido resgatados. 

Não se descarta que 568 migrantes — em sua maioria procedentes da Síria, do Egito e do Paquistão — tenham morrido no naufrágio do barco pesqueiro Pylos, que zarpou do Egito sem passageiros, atracou em Tubruk, na Líbia, e afundou na costa do Peloponeso, a 47 milhas náuticas (ou 87km) do continente, no Mar Jônico, um dos pontos mais profundos do Mediterrâneo, com 3.900m. Entre 50 e 100 crianças estão desaparecidas.

De acordo com a OIM, a tripulação reportou que estava em apuros na manhã de terça-feira (13 de junho), e a operação de busca e o resgate somente ocorreu na manhã seguinte, horas depois da catástrofe. No entanto, a Guarda Costeira Helênica (da Grécia) informou que foi notificada pela Itália, no mesmo dia,  sobre "um barco com grande número de estrangeiros a bordo". A Grécia teria mobilizado patrulheiros para tentarem localizar a embarcação. Um avião da Frontex (agência de fronteiras da União Europeia) detectou o Pylos na terça-feira à tarde e, depois, dois navios que se encontravam na área. 

Em entrevista exclusiva ao Correio, Eugenio Ambrosi — chefe de gabinete da OIM — defendeu uma coordenação mais proativa liderada por Estados nos esforços de busca e de resgate no Mar Mediterrâneo. "Os países estão legalmente obrigados a ativar missões de busca e resgate para barcos em perigo. Todas as embarcações marítimas, incluindo navios comerciais, têm a obrigação legal de prestar socorro nessas situações", explicou. Ambrosi também afirmou que as nações precisam resolver os atrasos e as lacunas nessas operações. Além disso, ele lembrou que as pessoas resgatadas precisam ser rapidamente desembarcadas em um porto seguro. 

Por sua vez, Federico Soda — diretor do Departamento de Emergências da OIM — admitiu que a abordagem atual para o Mediterrâneo é "impraticável". "Ano após ano, essa continua sendo a rota migratória mais perigosa do mundo, com alta taxa de letalidade. Os países têm que se unir e abordar as lacunas nas buscas e resgates proativos, no rápido desembarque e nos trajetos regulares seguros", declarou. "Os esforços coletivos deveriam ter os direitos humanos dos migrantes e o ato de salvar vidas no centro de qualquer resposta", acrescentou.  

Para Gillian Triggs, alta comissária assistente do Acnur, a União Europeia (UE) deve colocar a segurança e a solidariedade no coração de suas ações no Mediterrâneo". Ela destacou que, em face do aumento do fluxo de refugiados e de migrantes, uma coordenação maior entre todos os países mediterrâneos, a solidariedade e a partilha de responsabilidade, são essenciais para salvar vidas. "Isso inclui o estabelecimento de um mecanismo de desembarque regional pactuado e de redistribuição para pessoas que chegam por meio do mar, o qual continuamos a defender."

A Comissão Europeia — órgão executivo da UE — culpou as máfias de atravessadores do Mar Jônico e explicou que o número de barcos pesqueiros superlotados de migrantes aumentou 600% neste ano. Ylva Johansson, comissária para Assuntos Internos, disse que "os traficantes que embarcaram essas pessoas não as enviavam para a Europa, mas para a morte". Nove egípcios foram detidos sob suspeita de envolvimento no naufrágio.

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Papa pede orações pelas vítimas do naufrágio no Mar Mediterrâneo

 (crédito: Alberto Pizzoli/AFP)
crédito: Alberto Pizzoli/AFPgui

Papa pede orações pelas vítimas

O papa Francisco pediu a todos os católicos que "orem juntos" pelas vítimas do naufrágio no Mar Mediterrâneo. "Que o Senhor nos conceda o dom das lágrimas. Os rostos, os olhos dos migrantes, entre os quais muitas crianças, nos imploram para não desviar o olhar", escreveu o pontífice no Twitter, no início da noite de ontem. Horas antes, no início da manhã, Francisco recebeu alta do hospital Gemelli de Roma, depois de passar nove dias internado por uma cirurgia no intestino. O jesuíta argentino deixou a Policlínica Gemelli sorridente em uma cadeira de rodas (foto) às 8h45 (3h45 em Brasília). "Ainda vivo", respondeu  o papa, de 86 anos, a um jornalista que perguntou como se sentia.

 

O que se sabe até o momento sobre o naufrágio do Pylos

A fotografia do barco pesqueiro tirada apenas duas horas antes do naufrágio, na costa do Peloponeso  -  (crédito: Guarda Costeira Helênica/Reprodução)
crédito: Guarda Costeira Helênica/Reproduçãogui

A operação de resgate 

A Guarda Costeira grega informou, na quarta-feira (14/6), que foi notificada na véspera pelas  autoridades italianas sobre "um barco com um grande número de estrangeiros". Após o aviso, patrulheiros gregos foram mobilizados para achar a embarcação. "Um avião da Frontex foi o primeiro a localizar a embarcação na terça-feira à tarde e, depois, dois navios que estavam na área", segundo a Guarda Costeira. Às 19h40 (em Brasília), o barco notificou falha no motor. O barco-patrulha que estava próximo "tentou se aproximar", afirmou a Guarda Costeira. 

 

O naufrágio

Apenas 24 minutos depois, o barco-patrulha anunciou no rádio que a embarcação havia virado.

 

Recusa de ajuda

Segundo a Guarda Costeira grega, "não houve pedido de ajuda" por parte das pessoas a bordo. "Após inúmeras ligações do centro de operações da Guarda Costeira grega para resgatá-los, a resposta do barco de pesca foi negativa", disse o comunicado. "Das 9h30 às 15h (horário de Brasília), a sala de operações (...) entrou diversas vezes em contato com o barco de pesca", acrescenta o documento. 

 

Corda para estabilização

O porta-voz do governo grego, Ilias Siakantaris, explicou, ontem, que "os agentes da Guarda Costeira se aproximaram do navio, jogaram uma corda para estabilizá-lo, mas os migrantes recusaram ajuda". "Diziam 'No help, Go Italy' ("Ajuda não, vamos para a Itália", em inglês)", completou. "Não houve nenhuma tentativa de rebocar o barco", disse Nikolas Alexiou, porta-voz da polícia portuária grega. 

 

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