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Silvio Berlusconi: processos e escândalos sexuais marcaram a vida do político

"Sou o número um", costumava dizer o polêmico bilionário que esteve à frente do governo do país por nove anos. Empresário das comunicações, ex-dono de clube de futebol, amado e odiado com a mesma intensidade, o vaidoso magnata sofria de leucemia

*Correio Braziliense
postado em 13/06/2023 06:01
 (crédito: AFP)
(crédito: AFP)

Chamado de "o imortal", em razão de sua longevidade política e enorme influência na Itália, Silvio Berlusconi destacou-se por suas múltiplas facetas, bem como pelos inúmeros escândalos em que se envolveu ao longo de 86 anos de vida. A despeito da imagem forte, sofria com a saúde debilitada e lutava contra uma leucemia crônica. A morte do controverso político foi anunciada ontem de manhã, no Hospital San Raffaele, em Milão, onde estava internado desde a sexta-feira passada. Não respondia mais ao tratamento contra o câncer.

Um dos homens mais ricos da Itália, o empresário bilionário do ramo das comunicações e ex-dono de time de futebol desconhecia o meio termo. Amado e odiado na mesma intensidade, fez fortuna também no setor imobiliário e financeiro antes de iniciar a carreira política, em que se consagrou como o homem que comandou o país por mais tempo após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). "Sou o número um", costumava dizer.

O magnata liderou três governos italianos, totalizando nove anos e um mês no cargo de primeiro-ministro. Foi eleito pela primeira vez em 1994, aos 57 anos, na trilha aberta pela Operação Mãos Limpas, cruzada anticorrupção que, duas décadas depois, serviu de inspiração para a Operação Lava-Jato no Brasil.

Mergulhado em escândalos, deixou definitivamente o governo em 2011. Manteve-se influente, mas não conseguiu realizar um de seus maiores sonhos, o de ocupar a Presidência da República. Líder do partido conservador Força Itália (FI), em declínio nos últimos anos, era senador desde o fim de 2022 e foi um dos apoiadores da ascensão da primeira-ministra Giorgia Meloni.

Em um vídeo, a política de ultradireita elogiou a "coragem e determinação" de seu aliado, definido por ela como "um dos homens mais influentes da história da Itália". O funeral de Estado será realizado amanhã na Catedral de Milão, anunciou a diocese local. O governo decretou luto nacional.

Repercussão

Poucos minutos após o anúncio da morte de Berlusconi, dezenas de pessoas se reuniram diante do Hospital San Raffaele, e as reações do mundo político e esportivo começaram a ser divulgadas, ao mesmo tempo em que o corpo do magnata era levado para a luxuosa Villa San Martino, em Arcore, arredores de Milão.

O AC Milan, que teve seu período mais glorioso nos 31 anos que o bilionário foi o proprietário do clube (1986-2017), declarou-se "profundamente triste" com a morte de seu "inesquecível" ex-presidente. De Moscou, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, foi o primeiro político a lamentar a morte de Berlusconi, a quem chamou de "pessoa querida" e "verdadeiro amigo". Por sua vez, o papa Francisco destacou o "temperamento enérgico" do controverso político italiano.

Conhecido pelas orgias denominadas "bunga bunga", pelas piadas vulgares e por seus comentários inapropriados, inclusive durante reuniões internacionais — como quando fez comentários sobre o físico da então chanceler alemã, Angela Merkel —, o político foi um personagem no exterior e o símbolo de uma Itália em rápido crescimento.

De acordo com analistas, sua aura permaneceu intacta por décadas graças à sua personalidade expansiva e à sua vida conturbada. Essa combinação, porém, também o levou diversas vezes ao banco dos réus por acusações de corrupção, compra de testemunhas e fraude fiscal.

Foram muitos os processos iniciados por suas polêmicas festas eróticas durante os mandatos como primeiro-ministro, que contaram com a participação de uma menor de idade de origem marroquina, apelidada "Ruby rouba corações". Ele costumava apresentá-la como sobrinha do presidente egípcio, Hosni Mubarak. Apenas por esse escândalo, conhecido como "Rubygate", que despertou grande interesse fora e dentro da Itália, ele foi submetido a três julgamentos.

Apesar de ter sido absolvido da acusação de prostituição de menor, o bilionário foi processado por subornar as testemunhas do caso, a maioria modelos e prostitutas, julgamentos que abalaram sua imagem.

Especulações

Nascido em 29 de setembro de 1936, filho de um bancário, animador de cruzeiros na juventude e formado em direito, Berlusconi amealhou uma fortuna calculada em 6,4 bilhões de euros pela revista Forbes (em torno de R$ 33,5 bilhões). A origem dessa grande riqueza provocou todo tipo de especulação e continua incerta. Alguns jornalistas chegaram a denunciar a possibilidade de ter começado com empréstimos feitos pela máfia siciliana.

Grande comunicador e anticomunista convicto, valeu-se de ousadia para ganhar espaço nos meios de comunicação, inventando um peculiar e muito imitado formato de televisão comercial na Itália na década de 1980, época em que consolidou sua riqueza. Em seus canais privados de televisão, abusou de programas repletos de belas mulheres quase nuas, com os quais conquistou o grande público.

Também fez fortuna no setor imobiliário e financeiro antes de iniciar a carreira política, conquistando ao mesmo tempo telespectadores e votos. Com a holding Fininvest, proprietária de três canais de televisão, vários jornais e da editora Mondadori, ele acumulou ainda mais poder, e seu império se expandiu para o cenário internacional.

Na vida pessoal, marcada pela luxúria e excessos, o vaidoso Il Caimano (O Jacaré, um de seus vários apelidos) tinha obsessão pela imagem física. Passou por várias cirurgias no rosto em busca de rejuvenescimento, pintava o cabelo e recorria à maquiagem para disfarçar as rugas da idade. Com frequência, era acompanhado por uma namorada muito mais jovem. A atual companheira, Marta Fascina, de 30 anos, é ex-modelo e deputada pelo Força Itália.

Analistas políticos destacam que Berlusconi foi o precursor de um estilo de político milionário que se espalhou pelo mundo, ignorando e desrespeitando os princípios éticos e morais. O magnata nunca abriu mão de seus negócios e empresas, o que provocou um debate sobre conflito de interesses. O comportamento durou até novembro de 2011, quando se viu obrigado a renunciar ao cargo de primeiro-ministro diante das críticas em uma Itália sob grave crise financeira.

A partir daí, o período foi de grande turbulência. Em 2013, perdeu o título de Cavaliere del Lavoro (Cavaleiro do Trabalho), recebido aos 41 anos, depois da condenação definitiva a quatro anos de prisão por fraude fiscal na empresa Mediaset — a única que lhe foi imposta. Foi, então, expulso do Senado, depois de 20 anos de presença contínua no Parlamento. Conseguiu se eleger novamente senador nas legislativas de 2022.

Passava por uma fase de relativa calmaria até o diagnóstico de leucemia, revelado por seus médicos em 6 de abril, quando Berlusconi foi hospitalizado por problemas respiratórios. Pai de cinco filhos de dois casamentos e com vários netos, Silvio Berlusconi não deixou herdeiros políticos.

 


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