Dizem que o hábito faz o monge e a coroa, o rei. Mas na história da realeza britânica nem todos os monarcas tiveram a oportunidade de usar essa emblemática peça.
Desde o ano de 1066, cerca de 39 monarcas foram coroados como reis ou rainhas da Inglaterra, sempre na tradicional Abadia de Westminster.
Naquele ano, foi coroado Guilherme 1º, mais conhecido como Guilherme, o Conquistador, que deu início a uma tradição que terá seu próximo (e muito aguardado) capítulo no dia 6 de maio, data da cerimônia de coroação de Charles 3º após a morte de Elizabeth 2ª em setembro do ano passado.
Em geral, é tradição que se aguarde algum tempo após a morte de um rei ou rainha antes da realização da cerimônia de coroação do sucessor.
Com isso, nem todos que serviram oficialmente como reis da Inglaterra tiveram o privilégio de serem formalmente coroados.
Um dos casos mais conhecidos é o de Edward 8º, que depois de quase um ano como soberano britânico decidiu abdicar em 1936 em favor de seu irmão mais novo - mais tarde conhecido como George 6º -, basicamente por amor.
Também há registros de outro rei que nunca foi coroado: Edward 5º, que em 1483 e depois de passar três meses no trono britânico com apenas 12 anos de idade, foi deposto e depois desapareceu (presume-se que tenha sido assassinado).
Os Príncipes da Torre
O século 15 viu o Reino Unido mergulhar em um dos mais sangrentos conflitos pelo poder real: a Guerra das Rosas.
Dentro dos inúmeros capítulos do confronto entre as casas de Lancaster e York pelo trono, um evento muito particular e cruel é sempre lembrado: o desaparecimento de um rei e seu irmão pelas mãos de seu próprio tio.
O rei era Edward 5º. Segundo a BBC History, ele era o filho mais velho de Edward 4º, que havia conquistado uma das principais vitórias na Guerra das Rosas e, portanto, mantido a coroa britânica.
Edward4º morreu em junho de 1483 e seu filho mais velho foi imediatamente proclamado rei com o nome de Edward 5º, com apenas 12 anos de idade.
A Inglaterra ainda não havia alcançado a estabilidade política após o longo e custoso conflito interno.
Por ser menor de idade, o tio do novo rei e irmão do recém-falecido, o duque de Gloucester, foi nomeado protetor do jovem soberano até a maioridade.
Porém, como aponta o historiador britânico Anthony James Pollard em seu livro Os Príncipes da Torre, o protetor começou a ter conflitos com os nobres da corte e três meses após a ascensão de Edward 5º decidiu organizar um golpe: ordenou a prisão dos nobres e levou Edward 5º e seu irmão - e então herdeiro do trono - Richard e os trancou na famosa Torre de Londres.
Traçou-se então um complô documentado em ato parlamentar de 26 de junho daquele ano: os parlamentares aceitaram a denúncia do duque de Gloucester de que tanto Edward 5º quanto seu irmão Richard eram filhos ilegítimos de Edward 4º e, portanto, não tinham direito a herdar a coroa.
Tanto Edward 5º quanto seu irmão Richard, então duque de York, nunca mais foram vistos com vida. Muitos historiadores acusam o duque de Gloucester de tê-los assassinado, embora nunca tenham sido encontrados evidências ou documentos conclusivos para provar tal hipótese.
Dessa forma, Edward 5º nunca foi coroado. E até agora seus restos mortais não foram identificados.
No mesmo ato parlamentar de 26 de junho de 1483, o duque de Gloucester foi proclamado o novo rei da Inglaterra.
Ele adotou o nome de Richard 3º.
Edward 8º, o rei apaixonado
Quase 500 anos e dezenas de monarcas depois, outro rei também passou pela experiência de servir oficialmente sem nunca ter sido coroado.
Em 20 de janeiro de 1936, aos 70 anos, George 5º, rei da Inglaterra, que estava no trono há 26 anos, morreu em Sandringham House, uma das propriedades da famílias real em Norfolk, no sul da Inglaterra.
Ao mesmo tempo, seu filho mais velho ascendeu ao mais alto cargo da monarquia britânica e adotou o nome de Edward 5º.
Mas houve um problema: nos anos que antecederam a morte do pai, o então príncipe Edward teve diversos romances, alguns com mulheres casadas.
Foi assim que ele se apaixonou pela americana Wallis Simpson, que na época em que oficializou seu namoro com o futuro rei ainda era legalmente casada com seu ex-marido, Ernest Simpson.
No entanto, em outubro de 1936, nove meses após a ascensão de Edward 8º ao trono, Wallis concluiu o divórcio.
A ideia era que ela pudesse se casar com o monarca e se tornar rainha da Inglaterra.
Foi então que os problemas começaram. Em seu livro Primeiros-ministros britânicos de Balfour a Brown, o historiador Robert Pearce observa que tanto o então primeiro-ministro Stephen Baldwin quanto os líderes religiosos da época o aconselharam a não se casar com uma mulher recém-divorciada.
Eles argumentaram que, como rei da Inglaterra, ele era o chefe da Igreja Anglicana, cujos seguidores teriam dificuldade em aceitar que seu rei se casasse com uma mulher recém-divorciada.
Edward propôs várias alternativas, mas nenhuma convenceu seus conselheiros e líderes religiosos.
Depois de pouco mais de um mês de diálogo e tentativas de negociação, o próprio Edward 8º decidiu que iria abdicar se não pudesse se casar com Simpson. Essa episódio se concretizou em 11 de dezembro de 1936.
Seu irmão, o príncipe George - e pai da futura rainha Elizabeth 2º -, ascendeu ao trono.
Eduardo 8º perdeu todos os seus privilégios como nobre, embora tenha sido nomeado duque de Windsor, e teve que se mudar para outro país.
Ele morreu em 1972 em sua residência no sul da França, onde morava com sua esposa.