Horror no Quênia

Mortos em seita de jejum passam de 200 no Quênia

Fiéis da Igreja Internacional da Boa Nova, no leste do país africano, foram obrigados a fazer privação de comida até a morte e a orar, em floresta. Mortes também ocorreram por asfixia e estrangulamento

Rodrigo Craveiro
postado em 14/05/2023 06:01
 (crédito: Yasuyoshi Chiba/AFP)
(crédito: Yasuyoshi Chiba/AFP)

Igreja Internacional da Boa Nova. O nome da seita e a retórica de seu líder, o "pastor" Paul Nthenge Mackenzie, 50 anos, atraíram fiéis ávidos em descobrir na religião um suporte para a vida marcada pelas dificuldades econômicas, na região da floresta de Shakahola, no leste do Quênia. Sob a promessa de que encontrariam Jesus Cristo, Mackenzie convenceu seus seguidores a orar e a praticar jejum até a morte, enquanto se isolavam na mata. O escândalo foi trazido à tona por Hussein Khalid, diretor executivo da organização não governamental (ONG) Haki Africa, no mês passado, depois que familiares de fiéis da seita denunciaram o desaparecimento e pediram sua ajuda. Em entrevista ao Correio, Khalid afirmou que 201 corpos foram retirados de covas coletivas, distribuídas em duas áreas principais da floresta de Shakahola.

"Uma delas, descoberta na última terça-feira (9/5), está situada perto da casa de Mackenzie. Na última vez que fizemos a exumação, tínhamos encontrado 110 cadáveres. Desde então, descobrimos mais 91 corpos. Por meio da necropsia, vimos que nem todos os fiéis morreram de fome. Há sinais muito claros de que alguns deles foram assassinados por asfixia e por estrangulamento. Em um dos mortos havia marcas de mãos ao redor do pescoço."

Khalid contou que em alguns corpos há indícios de golpes com objetos contundentes. "Um grande número dos fiéis morreu de inanição, mas outros foram asfixiados ou torturados. Também encontramos cerca de 50 sobreviventes na floresta. Eles apresentavam diversas condições: alguns mostravam extrema fraqueza, outros estavam à beira da morte, por conta da fome. Também vimos  pessoas em boa situação", disse. O ativista revelou que a polícia teve dificuldades em distinguir sobreviventes de suspeitos. Isso porque alguns dos fiéis auxiliaram seus colegas a jejuarem até a morte. "Quem foi convencido a jejuar receberá o suporte das autoridades e será devolvido às suas  famílias", acrescentou. Entre os detidos, estão integrantes de uma "gangue de capangas", que vigiavam os seguidores de Mackenzie para que não violassem o jejum nem tentassem abandonar a floresta. 

A agência de notícias France-Presse informou que alguns corpos tiveram as vísceras removidas, o que sugere uma rede de tráfico de órgãos humanos. O diretor da Haki Africa demonstrou surpresa e consternação. "É chocante o fato de termos um governo e agências de segurança em atividade, e, ainda assim, tantas pessoas serem tão suscetíveis a ideologias religiosas radicais. Muitos quenianos se deixam levar por líderes religiosos que os incitam a fazer várias coisas. Precisamos encontrar meios de regular o setor religioso no Quênia, principalmente nas áreas rurais", afirmou Khalid. 

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 (crédito: Hussein Khalid, diretor executivo da ONG Haki Africa)
crédito: Hussein Khalid, diretor executivo da ONG Haki Africa

"O massacre da floresta de Shakahola mostra que os quenianos vivem em um tempos muito desesperadores e estão suscetíveis a ideologias religiosas radicais. O alto custo de vida e os desafios que enfrentamos em nosso país deveriam levar o governo a proteger os cidadãos de serem manipulados."

Hussein Khalid, diretor executivo da organização não governamental queniana Haki Africa

 

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