Ucrânia

Zelensky nega envolvimento da Ucrânia em suposto atentado contra Putin

Rússia afirma que dois drones sobrevoaram o Kremlin, residência do presidente, e foram "desativados" por "sistemas de guerra eletrônica". Zelensky nega envolvimento e diz que tribunais julgarão o líder russo. EUA pedem "cautela"

Rodrigo Craveiro
postado em 04/05/2023 06:00
 (crédito: Milkhail Klimentyev/Sputnik/AFP)
(crédito: Milkhail Klimentyev/Sputnik/AFP)

A Rússia acusou a Ucrânia de um "ataque terrorista" contra o presidente Vladimir Putin, na noite de terça-feira. "O regime de Kiev realizou uma tentativa de desferir um ataque com veículos aéreos não tripulados à residência do presidente, no Kremlin", afirmou o governo russo, por meio de um comunicado à imprensa. Segundo a nota, dois drones atingiram o Kremlin, no coração de Moscou. "Como resultado de ações oportunas tomadas pelos militares e pelos serviços especiais, usando sistemas de guerra eletrônica, os drones foram desativados. A queda dos aparelhos e de fragmentos, espalhados pelo território do Kremlin, não provocaram vítimas ou danos materiais", acrescentou o comunicado.

Putin escapou, ileso, e manteve sua agenda oficial. "Consideramos estas ações como uma tentativa de ação terrorista e um atentado contra a vida do presidente. (...) A Rússia se reserva o direito de tomar medidas de represália onde e quando considerar apropriado", advertiu o Kremlin.

Vídeos divulgados pelas redes sociais mostram um pequeno drone sobrevoando a cúpula do Kremlin, antes de uma explosão. Nas imagens, também se vê uma coluna de fumaça sobre o prédio. O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, refutou as acusações. "Não atacamos Putin. Isso será uma tarefa dos tribunais. Nós vamos lutar no nosso território, estamos defendendo nossos povoados e cidades", declarou  o ucraniano, durante visita a Helsinque. Zelensky viajou à capital da Finlândia para participar de uma cúpula de cinco países nórdicos. Em 3 de abril, a Finlândia oficializou sua adesão à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). 

Em Moscou, autoridades reagiram ao suposto atentado com pedidos de assassinato de Zelensky e a eliminação do governo ucraniano. O ex-presidente Dmitry Medvedev afirmou que, "depois do atentado terrorista, não há outra opção que não seja a eliminação física de Zelensky e de sua camarilha". Vice-chefe do Conselho de Segurança da Rússia, ele disse que "nem mesmo é necessária a assinatura de um instrumento de rendição incondicional".

Sem conversa

Membros do Duma — a Câmara Baixa do Parlamento — defenderam o uso de "armamentos capazes de deter e destruir o regime terrorista de Kiev". "Não deve haver conversa com o regime de Zelensky", comentou Vyacheslav Volodin, presidente do Duma, segundo a agência de notícias russa Tass. 

Os Estados Unidos recomendaram "extrema cautela" ante as acusações da Rússia. "Vi a informação. Não posso validá-la, não sabemos disso", declarou o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, durante um evento em Washington. "Veria qualquer coisa que sai do Kremlin com muito cuidado."

"A alegação de que foi uma tentativa de asssassinato contra Putin soa ridícula. A Ucrânia sabe muito bem que um ataque ao Kremlin demanda capacidade militar maior do que drones de fumaça. Além disso, Kiev sabe que Vladimir Putin nunca permanece muito tempo no Kremlin. Dmitri Peskov, porta-voz do governo russo, admitiu que ele estava na residência oficial de Novo-Ogaryovo, na noite de terça-feira. É tudo uma mentira", afirmou ao Correio o ucraniano Peter Zalmayev, diretor da organização não governamental Eurasia Democracy Initiative (em Kiev).

Ele considerou sintomático o fato de propagandistas do Kremlin e alguns parlamentares aparecem na televisão russa chamando Zelensky de "assassino sanguinário" e pedindo ataques à sede do governo da Ucrânia. 

Para Zalmayev, caso as acusações contra Kiev sirvam de pretexto para Moscou lançar alguma ação dramática contra a capital ucraniana, isso mostraria o "desespero" de Putin, às vésperas da contraofensiva de Zelensky. "A Rússia precisa mudar a narrativa para responder a ataques e sabotagens dentro de seu território, pois transmite a imagem de fraqueza de Putin", disse.

Olexiy Haran, professor de política comparativa da Universidade Nacional de Kiev-Mohyla, destaca que a Ucrânia não tem o costume de bombardear alvos civis na Rússia. "Houve vários casos de usos de drones ucranianos contra alvos militares. Do ponto de vista político, não creio ser do interesse do governo de meu país matar Putin", admitiu à reportagem.

Segundo Haran, a propaganda do Kremlin usou o incidente para escalar a guerra e justificar o "bombardeio total" da Ucrânia. "Parece uma provocação política da própria Rússia, com o objetivo de estimular sentimentos agressivos dentro do território russo e mobilizar o país em torno de Putin. A intenção, também, é transmitir, ante a comunidade internacional, a ideia de que a Ucrânia escala as tensões", avaliou. Na madrugada de ontem, artilharia e lança-foguetes russos bombardearam Kherson, no sul da Ucrânia, matando 21 civis.

Haran adverte que Putin pode usar o incidente em Moscou para intensificar os ataques à Ucrânia. No entanto, ele considera pouco provável que a Rússia lance mão de armas nucleares estratégicas. "Putin tem sérias limitações para fazer isso, por conta da pressão internacional. Inclusive, China e Índia o alertaram a não fazê-lo", disse Haran. 

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  • Drone se aproxima do Kremlin (na imagem, ele aparece como um ponto branco, à esquerda da Lua)
    Drone se aproxima do Kremlin (na imagem, ele aparece como um ponto branco, à esquerda da Lua) Foto: Fotos: Reprodução de vídeo
  • A aeronave não tripulada explode sobre a cúpula da residência do governo, supostamente interceptada
    A aeronave não tripulada explode sobre a cúpula da residência do governo, supostamente interceptada Foto: Reprodução de vídeo
  • Autoridades russas asseguram que sistemas de radar de guerra eletrônica frustraram o ataque
    Autoridades russas asseguram que sistemas de radar de guerra eletrônica frustraram o ataque Foto: Reprodução de vídeo
  • Coluna de fumaça é vista sobre o prédio, após a suposta interceptação do aparelho
    Coluna de fumaça é vista sobre o prédio, após a suposta interceptação do aparelho Foto: Reprodução de vídeo
  • Coluna de fumaça é vista sobre o prédio: atentado inédito provocou pedidos de assassinato de Zelensky
    Coluna de fumaça é vista sobre o prédio: atentado inédito provocou pedidos de assassinato de Zelensky Foto: Reprodução de vídeo

Kherson sob bombardeio maciço

 (crédito: Dina Pletenchuk/AFP)
crédito: Dina Pletenchuk/AFP

Forças russas bombardearam com lança-foguetes e com artilharia a cidade portuária de Kherson, no sul da Ucrânia, matando pelo menos 21 pessoas. O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, publicou em seu Twitter imagens de corpos em um mercado e de feridos recebendo atendimento médico. "O mundo precisa ver e saber disso. Uma estação ferroviária, uma casa, uma loja de ferragens, um supermercado, um posto de gasolina. Vocês sabem o que une esses locais? A trilha sangrenta que deixa com seus projéteis, matando civis em Kherson e na região de Kherson. Até agora, 21 civis foram assassinados e 48 feridos. Todos civis! Jamais perdoaremos os culpados", escreveu. Na foto, policiais socorrem garoto machucado após o bombardeio. Segundo analistas, a região de Kherson é uma das possíveis áreas de onde as tropas ucranianas poderiam lançar sua contraofensiva. A capital homônima foi retomada pelas tropas de Kiev em novembro.

 

Eu acho...

 (crédito: Arquivo pessoal )
crédito: Arquivo pessoal

"Estou inclinado a ver esse suposto ataque com drones como uma grande provocação, a fim de justificar a invasão à Ucrânia. Na madrugada de hoje (ontem), houve ataques contra a região de Kherson (sul), onde 21 pessoas morreram. Para os russos, essa histeria serve para desviar as atenções para o que eles têm feito na Ucrânia. É típico de ditadores organizar tais provocações e acusar a vítima da agressão. A União Soviética e a Rússia têm feito isso."

Olexiy Haran, professor de política comparativa da Universidade Nacional de Kiev-Mohyla

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