Jornal Correio Braziliense

África

Confronto entre governo e paramilitares do Sudão entra na 2ª semana; entenda

Cessar-fogo de 72 horas não é respeitado e países — entre eles, Estados Unidos, França e Arábia Saudita — resgatam seus cidadãos do território sudanês. Confronto entre o Exército e paramilitares entra na segunda semana sem sinais de trégua

Em meio a violentos confrontos, Estados Unidos, França e Reino Unido, entre outros países, retiraram seus cidadãos e diplomatas do território sudanês. O país africano enfrenta, desde o último dia 15, embates sangrentos entre as forças de dois generais rivais, com mais de 420 mortes e sem sinais de trégua. Nem o cessar-fogo de 72 horas negociado com as Nações Unidas para o Eid al Fitr, celebração que marca o fim mês do Ramadan, e a chegada de serviços humanitários no último fim de semana foi respeitado.

Os conflitos se concentram na capital, Cartum, e na região de Darfur, no oeste do Sudão, entre o Exército do general Abdel Fatah al-Burhan, governante do país desde o golpe de 2021, e seu rival, o general Mohamed Hamdane Daglo, líder das Forças de Apoio Rápido (FAR). Especialistas avaliam que não há sinais de que os líderes estão abertos ao diálogo, o que levou os países a realizarem as operações de retirada de seus cidadãos.

A primeira foi protagonizada pela Arábia Saudita, que repatriou 91 nacionais e 66 pessoas de outros países no sábado. Ontem, dezenas de veículos das Nações Unidas foram vistos saindo da capital rumo a Porto Sudão, cidade às margens do Mar Vermelho, de onde 150 pessoas partiram no dia anterior.

A França anunciou, também ontem, ter feito uma "operação de evacuação rápida", incluindo o resgate de cidadãos europeus e de países aliados. Pelo Twitter, o primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak, informou que o Exército de seu país realizou uma "retirada complexa e rápida" de diplomatas britânicos e suas famílias. No texto, Sunak também enfatizou que a operação se deu em um "contexto de violência crescente e ameaças contra funcionários da embaixada".

Os Estados Unidos, por sua vez, retiraram seus diplomatas da capital usando helicópteros, informou, em comunicado, o presidente Joe Biden. Além disso, as operações de sua embaixada foram suspensas temporariamente. A mesma medida foi anunciada pelo Canadá. "Tomamos a decisão de suspender temporariamente nossas operações no Sudão. Nossos diplomatas estão seguros e trabalhando de fora do país", disse a chanceler Mélanie Joly, também no Twitter.

A Itália indicou que está tentando tirar seus moradores, assim como a Turquia, que foi forçada a interromper a intervenção devido a uma explosão perto do ponto de encontro no bairro de Kafuri, ao norte de Cartum. Egito, Índia, Nigéria e Líbia também anunciaram estar trabalhando para tirar seus cidadãos do território sudanês. Na sexta-feira, o Exército anunciou que havia "acordado um cessar-fogo de três dias" para "permitir que a população celebrasse o Eid al Fitr e facilitasse a chegada de serviços humanitários", conforme solicitado pela ONU. Os combates de rua diminuíram em partes da capital, e, na manhã seguinte, recomeçaram com rajadas de tiros.

Crise humanitária

A violência também deslocou dezenas de milhares de pessoas para outros estados no Sudão ou nos vizinhos Chade e Egito — a estimativa é de que entre 10 mil e 20 mil pessoas, a maioria mulheres e crianças, fugiram do país nos últimos dias. O Programa Mundial de Alimentos alertou que milhões podem passar fome devido aos sangrentos conflitos no Sudão, onde um terço da população precisa de ajuda humanitária — o país é o terceiro maior da África, com 45 milhões de habitantes.

Em Cartum, onde moram cerca de 5 milhões de pessoas, civis relatam que estão encurralados entre os combates e ainda precisam lidar com falta de água, comida e eletricidade. Fontes relatam que prisões têm sido atacadas e presos, soltos. A penitenciária em Kober, que abriga todos os presos políticos, incluindo o ditador deposto Omar al-Bashir, seria um dos alvos.

Exército e FAR atuaram juntos para derrubar o governante autocrático al-Bashir. Porém, os generais se desentenderam durante as negociações para integrar os dois grupos e formar um governo civil. Os paramilitares reivindicaram, no último dia 15, o controle do palácio presidencial e do aeroporto internacional da capital, após tiroteios e explosões. Desde então, os confrontos têm se acirrado, com ao menos 420 mortes e 3.700 feridos, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).

De acordo com Cyrus Paye, médico da ONG Médicos Sem Fronteiras, a situação no país é "catastrófica". A onda de violência destruiu ou forçou o fechamento de 72% dos hospitais nas zonas de combate, segundo o sindicato dos médicos, e fez com que organizações humanitárias suspendessem as operações. Diretor-geral da OMS, Tedros Ghebreyesus descreveu vários ataques mortais a instalações de saúde. "Paramédicos, enfermeiras e médicos da linha de frente, muitas vezes, não conseguem acessar os feridos, e os feridos não conseguem chegar às instalações", tuitou.

Na avaliação do pesquisador Hamid Jalafallah, a saída dos atores internacionais poderá agravar a situação do país africano. "Eles terão menos peso quando saírem do Sudão: façam o que puderem para sair com segurança, mas não deixem os sudaneses para trás sem proteção", apelou, em entrevista à agência France-presse de notícias (AFP). Segundo Jalafallah, "pedir corredores seguros para evacuar os estrangeiros sem ao mesmo tempo pedir o fim da guerra seria terrível".

Durante a missa na Praça de São Pedro, no Vaticano, o papa Francisco também pediu a concentração de esforços a favor do diálogo. "Infelizmente, a situação no Sudão continua grave. Por isso, renovo meu apelo para que a violência cesse o mais rápido possível e o caminho do diálogo seja retomado", rogou. 

Brasileiros em trânsito

Seguindo outros países, o Brasil investe no resgate dos cidadãos ilhados pela violência no Sudão. Em nota, o Itamaraty disse que a operação é uma prioridade. "O governo brasileiro segue empreendendo esforços para retirar todos os brasileiros em território sudanês tão logo quanto possível."

Segundo o órgão, havia 16 brasileiros na capital do país, e eles estão saindo da zona em que o confronto se concentra. Ontem à noite, Matheuzinho, jogador de futebol, contou ao Correio que ele, o atacante Paulo Sérgio e outros sete brasileiros, além de pessoas de outras localidades, incluindo crianças, estavam viajando em um ônibus disponibilizado pelo Al-Merreikh, clube no qual atuam, para fugir do local. "Estamos em um ônibus em destino ao Egito, precisamos sair de Cartum." Segundo ele, a viagem deve durar mais de um dia.

O ônibus, que está lotado, deve levar o grupo até a fronteira com o Egito e, a partir dali, o resgate ficaria por conta do Brasil, conta Matheuzinho. "Falaram que vão nos buscar na fronteira e levar até o Cairo. Se vai ser de trem ou avião, não sei, mas nós temos que chegar até a fronteira. Por isso, pegamos um ônibus do clube."

Paulo Sérgio narra que o caminho é difícil, demorado e há poucos pontos com sinal de telefone. "É uma sorte eu conseguir falar com você. Ficamos duas horas esperando liberação do Exército para passar, enfrentamos algumas barreiras assim que saímos de Cartum, mas, agora, já estamos distante, rumo a cidade de Assuã. Deveremos chegar apenas na segunda à tarde", detalhou à reportagem.

De acordo com o Itamaraty, entre os brasileiros no país, há três crianças que deixaram a capital na madrugada de domingo com o pai. "Outros 10 saíram esta tarde (de ontem) por via terrestre, em direção ao norte. Uma cidadã seguiu para cidade ao sul, conforme orientada pela organização da qual faz parte", informou. Um brasileiro que deveria ter sido evacuado na manhã de ontem não pôde sair do local, mas está "em segurança e aguardando orientações".

Ainda conforme o Itamaraty, o Brasil permanece em diálogo com as Nações Unidas e outros governos com nacionais no Sudão e "continua a monitorar a situação dos demais brasileiros no país que, por estarem em localidades não conflagradas, estão em situação de menor risco relativo".

Brasileiros em trânsito

Seguindo outros países, o Brasil investe no resgate dos cidadãos ilhados pela violência no Sudão. Em nota, o Itamaraty disse que a operação é uma prioridade. "O governo brasileiro segue empreendendo esforços para retirar todos os brasileiros em território sudanês tão logo quanto possível."

Segundo o órgão, havia 16 brasileiros na capital do país, e eles estão saindo da zona em que o confronto se concentra. Ontem à noite, Matheuzinho, jogador de futebol, contou ao Correio que ele, o atacante Paulo Sérgio e outros sete brasileiros, além de pessoas de outras localidades, incluindo crianças, estavam viajando em um ônibus disponibilizado pelo Al-Merreikh, clube no qual atuam, para fugir do local. "Estamos em um ônibus em destino ao Egito, precisamos sair de Cartum." Segundo ele, a viagem deve durar mais de um dia.

O ônibus, que está lotado, deve levar o grupo até a fronteira com o Egito e, a partir dali, o resgate ficaria por conta do Brasil, conta Matheuzinho. "Falaram que vão nos buscar na fronteira e levar até o Cairo. Se vai ser de trem ou avião, não sei, mas nós temos que chegar até a fronteira. Por isso, pegamos um ônibus do clube."

Paulo Sérgio narra que o caminho é difícil, demorado e há poucos pontos com sinal de telefone. "É uma sorte eu conseguir falar com você. Ficamos duas horas esperando liberação do Exército para passar, enfrentamos algumas barreiras assim que saímos de Cartum, mas, agora, já estamos distante, rumo a cidade de Assuã. Deveremos chegar apenas na segunda à tarde", detalhou à reportagem.

De acordo com o Itamaraty, entre os brasileiros no país, há três crianças que deixaram a capital na madrugada de domingo com o pai. "Outros 10 saíram esta tarde (de ontem) por via terrestre, em direção ao norte. Uma cidadã seguiu para cidade ao sul, conforme orientada pela organização da qual faz parte", informou. Um brasileiro que deveria ter sido evacuado na manhã de ontem não pôde sair do local, mas está "em segurança e aguardando orientações".

Ainda conforme o Itamaraty, o Brasil permanece em diálogo com as Nações Unidas e outros governos com nacionais no Sudão e "continua a monitorar a situação dos demais brasileiros no país que, por estarem em localidades não conflagradas, estão em situação de menor risco relativo".