Jornal Correio Braziliense

Argentina

Com a saída de Fernández, veja como fica o páreo pela presidência da Argentina

Presidente Alberto Fernández desiste de concorrer a novo mandato e defende "ciclo virtuoso" de lideranças. Macri e Cristina Kirchner também não tentarão retorno à Casa Rosada. Cientista político avalia nomes para disputa de 22 de outubro

O anúncio foi feito por meio de um vídeo de quase oito minutos publicado no Twitter. "Cabe a nós a responsabilidade histórica de fazer, com honestidade, o que nos cabe. Essa responsabilidade e esse compromisso me levam, hoje, como presidente da Nação, a estar convencido, sem espaço nenhum para dúvida, que tenho que concentrar meu esforço, meu compromisso e meu coração em resolver os problemas dos argentinos e das argentinas. (...) Desde que comecei a militar politicamente nos anos 1970, nunca coloquei uma missão pessoal à necessidade do conjunto. Como militante peronista, sempre soube que primeiro estava a Pátria, depois, o movimento, e, por último, os homens", declarou o presidente da Argentina, Alberto Fernández, 64 anos.

"É por isso que cumprirei com essa escala de prioridades. O contexto econômico me obriga a concentrar todos os meus esforços em atender aos difíceis momentos que a Argentina atravessa", acrescentou. Pressionado pelo peronismo, Fernández não disputará as eleições presidenciais de 22 de outubro deste ano.

"Creio que as PASO (eleições primárias obrigatórias) são o veículo para que a sociedade selecione os melhores homens e mulheres de nossa frente, que melhor nos representem, nas próximas eleições gerais", disse o presidente. "Necessitamos gerar um novo ciclo virtuoso, no qual outros se empoderem para voltar a conquistar os corações daqueles que seguem nos olhando como o espaço que garante que a direita não regressará, com seu pesadelo e sua obscuridade", advertiu o mandatário, cuja imagem negativa chega a 70%, apontou uma pesquisa da consultoria Poliarquía. Em 13 agosto, os partidos políticos têm que realizar as PASO. 

Surpresa parcial

O ex-presidente Mauricio Macri (centro-direita) havia tomado a mesma decisão de não disputar o posto mais alto do país, em 26 de março. Cristina Kirchner, presidente de centro-esquerda duas vezes entre 2007 e 2015, também não deseja retornar à Casa Rosada. Para Miguel De Luca, cientista político da Universidad de Buenos Aires (UBA), a desistência de Fernández à reeleição foi surpresa apenas parcialmente. "Há poucos dias, o presidente afirmou que competiria por um segundo mandato, e isso foi repetido por vários de seus dirigentes mais próximos. Havia movimentos de que Fernández buscava a reeleição, ainda que suas chances fossem reduzidas, por causa do baixo índice e popularidade", disse ao Correio. "No entanto, com o agravamento da crise e com o índice de inflação (7,7% em março e 104% anualizado), e em meio a rumores, alguns analistas antecipavam que Fernández poderia anunciar a decisão em breve."

Sem Fernández, sem Macri e sem Cristina Kirchner nas eleições deste ano, De Luca afirma que os candidatos da coalizão Juntos por el Cambio (centro-direita) que mais têm chances de almejar a Casa Rosada são Horacio Rodríguez Larreta, chefe do governo de Buenos Aires, que tem uma armação política com outros dirigentes do partido Proposta Republicana (PRO) e forma uma aliança com os radicais; e Patricia Bullrich, presidente do PRO. "Bullrich tem um discurso mais orientado à direita, de mão dura e menos amplo, a favor de reformas do mercado mais marcadas. Por parte do partido governista, o Frente de Todos, ainda não há um candidato lançado. As especulações giravam em torno de Eduardo 'Wado' de Pedro, ministro do Interior, e do governador da província de Buenos Aires, Axel Kicillof. Nos últimos dias, também se falou do chefe de gabinete, Agustín Rossi, e Daniel Scioli, embaixador da Argentina no Brasil", afirmou o especialista da UBA. 

Rossi comentou a decisão de Alberto Fernández, citando o falecido ex-presidente Juan Domingo Perón, ideólogo e fundador do peronismo. "Primeiro a Pátria, depois o Movimento e, por último, os homens. Assim entendem e fazem política quem sabe os lugares que ocupam por e para o povo", escreveu no Twitter.

 

Reação

A reação dos internautas ao vídeo de Fernández no Twitter, em uma postagem intitulada Minha decisão, funciona como um termômetro de sua popularidade. "Não! Por um momento pensei que renunciaria!", escreveu um usuário da rede social. "Até nunca", reagiu outro. "Não se preocupe, senhor presidente. Será lembrado para sempre como o pior presidente da história. Viva à pátria", afirmou um terceiro internauta. E mais: "Não voltem nunca mais, por favor, já destroçaram o país".

Alejandro Pagni/AFP - Alberto Fernández e a vice, ex-presidenta Cristina Kirchner, durante a posse, em 10 de dezembro de 2019: aspiração ao poder deixada de lado
Emiliano Lasalvia/AFP - O conservador Mauricio Macri celebra a vitória nas eleições de 2015

Alejandro Toledo será extraditado ao Peru

O ex-presidente peruano Alejandro Toledo, acusado em seu país de corrupção e lavagem de dinheiro, se entregou na manhã de ontem às autoridades americanas para iniciar seu processo de extradição ao Peru, informaram as autoridades na Califórnia. Toledo, de 77 anos, se apresentou às 9h15 locais (13h15 em Brasília) em um tribunal federal de San José e ficou à disposição do Serviço de Delegados dos Estados Unidos (US Marshals). Em Lima, a procuradora do caso, Silvana Carrión, estimou que, "em dois ou três dias", o ex-presidente será enviado ao Peru em um voo comercial. O político, que governou o Peru de 2001 a 2006, deixou sua residência em Menlo Park acompanhado de sua advogada e sua esposa, Eliane Karp. Uma ampla comitiva de meios de comunicação o aguardava desde cedo na entrada do edifício federal Robert F. Peckham, onde ele deveria se entregar. O ex-presidente, no entanto, conseguiu despistar os jornalistas e entrou discretamente por outro lugar. Toledo é acusado em Lima no âmbito do caso Odebrecht, mas sempre negou as acusações e apresentou várias petições para impedir a extradição que o Peru tentava desde 2018 e que os Estados Unidos autorizaram em fevereiro.