Em visita surpresa a Kiev, o secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), Jens Stoltenberg, reuniu-se com o presidente Volodymyr Zelensky e enviou um recado velado ao russo Vladimir Putin de que o Ocidente está unido em solidariedade à Ucrânia. "Uma honra estar de volta a Kiev e me encontrar com o presidente Zelensky. O lugar certo da Ucrânia é a Otan. Com o tempo, nosso apoio tornará isso possível. Estamos ao seu lado hoje e a longo prazo", escreveu Stoltenberg em seu perfil no Twitter, depois do encontro. Durante entrevista coletiva conjunta, Zelensky cobrou um convite para a adesão da Ucrânia à aliança militar, além do fornecimento de caças, de armas de longo alcance, de artilharia e de veículos blindados para ajudarem no combate às forças de Moscou.
O chefe da Otan foi explícito ao desejar que os ucranianos derrotem Moscou. "O futuro da Ucrânia está na família euro-atlântica, o futuro da Ucrânia está na Otan. Ao mesmo tempo, o principal objetivo da aliança, dos aliados, é garantir que a Ucrânia vença", disse o norueguês. Foi a primeira viagem de Stoltenberg à ex-república soviética desde o início da invasão russa. "Nós consideramos isso como um sinal de que a aliança está pronta para começar um novo capítulo nas relações com a Ucrânia. Um capítulo de decisões ambiciosas", declarou. "Toda a Europa e o mundo precisam de uma compreensão clara de que somente uma vitória da Ucrânia salvará outros Estados e povos de tão terrível destruição, das perdas e das mortes que a Rússia trouxe ao à nossa terra."
Nesse sentido, o líder ucraniano disse entender que a cúpula da Otan marcada para 11 e 12 de julho, em Vilnius, capital da Lituânia, pode ser "histórica". O evento é visto como uma oportunidade para ensaiar uma estratégia unificada da aliança em relação à defesa da Ucrânia. Dmitri Peskov, porta-voz de Putin, repetiu a teoria de que uma das metas da Rússia na Ucrânia é impedir a entrada da ex-república na Otan. "Isso constituiria uma séria ameaça ao nosso país e à sua segurança", advertiu.
Especialista em política externa e defesa do Centro de Estudos sobre os Estados Unidos da Universidade de Sydney, Blake Herzinger disse ao Correio que a presença de Stoltenberg em Kiev é "um importante sinal, depois de um ano de guerra, de que os aliados da Otan permanecem comprometidos em apoiar Zelensky e a Ucrânia contra a invasão russa". "A Europa ainda está trabalhando para acelerar sua produção de defesa, a fim de continuar abastecendo as forças ucranianas. A visita também chega no momento em que provavelmente veremos a planejada contraofensiva da Ucrânia", observou. O norte-americano minimiza o envio de armas aos ucranianos como um produto da passagem de Stoltenberg por Kiev. "Vejo isso mais como um lembrete de que a Otan permanece engajada e comprometida com o apoio contínuo à Ucrânia."
O cientista político ucraniano Artem Oliinyk — diretor do Instituto para Relações de Governo (em Kiev) —, concorda que a visita de Stoltenberg pode ser classificada como interessante por ocorrer às vésperas da contraofensiva das tropas da Ucrânia para a liberação do território. "O secretário-geral da Otan expressou claro apoio a Zelensky nesse sentido. Ambos falaram sobre mais fornecimento de armas, equipamentos e munições que permitirão expulsar os russos do país. Ao mesmo tempo, a Ucrânia demanda progresso no tema da integração à Otan, à qual a Rússia mostra forte oposição. Há pouco tempo, o Kremlin declarou que a principal razão da guerra é esfriar as perspectivas de adesão da Ucrânia ao sistema de segurança euro-atlântico", disse ao Correio.
Os países-membros da Otan se pronunciaram a favor da entrada de Kiev na organização assim que a guerra terminar. Oliinyk entende que a decisão a ser tomada pela aliança, durante a cúpula de julho, é uma incógnita. De acordo com ele, como Zelensky se candidatou à adesão no outono de 2022, uma solução lógica seria um compromisso entre os países-membros, baseado em votação preliminar, para viabilizar a entrada. "Tudo em conformidade com os princípios da integridade territorial e da soberania imediatamente depois do fim formal dos combates", defendeu.
Oliinyk sugere que os parlamentos dos países da Otan votem em apoio às aspirações da Ucrânia de ser parte da aliança. "Esse mecanismo legal é possível e poderia ser um passo político importante para a segurança atlântica", acrescentou. O especialista destacou que, dessa forma, o Ocidente enviaria um sinal inequívoco para Moscou sobre a derrota no campo político.