Morador de Cartum, o pesquisador Ibrahim Alhaj Alduma, 30 anos, ironiza o cessar-fogo que nunca foi respeitado. "O engraçado é que as Forças de Apoio Rápido (FAR) anunciaram a expansão da trégua por 72 horas enquanto ainda estão combatendo", afirmou ao Correio. Desde 15 de abril, os paramilitares do FAR, comandados pelo general Mohamed Hamdan Daglo, e o Exército sudanês, sob a liderança do general Abdel Fatah al Burhan, travam uma luta pelo poder que deixou pelo menos 512 mortos e 4.193 feridos.
"Durante todo o dia, têm ocorrido bombardeios pesados e disparos de artilharia nos bairros de Burry e de Alreyad, além de confrontos nas imediações do quartel-general das Forças Armadas, aqui em cartum. Pelo menos dois civis morreram. Houve explosões e incêndios em propriedades civis", acrescentou Alduma.
Depois de o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, anunciar que trabalhava "ativamente" para prorrogar o cessar-fogo, o Exército anunciou a extensão da trégua por mais 72 horas. No entanto, os paramilitares silenciaram sobre o assunto.
De acordo com Alduma, as FAR começam a expandir o controle de Omdurman, a 20km de Cartum. "Durante todo o dia de hoje (ontem), ouvimos o barulho de combates com armas pesadas. Em Darfur, na região ocidental do Sudão, a luta começa a se transformar em uma guerra civil, com combates ininterruptos pelo terceiro dia consecutivo e um número desconhecido de mortos", disse. Na capital El Geneina, foram registrados saques, assassinatos e incêndios em casas, segundo a ONU. A área foi cenário de uma guerra extremamente violenta na década de 2000. Alduma acrescentou que as partes envolvidas na disputa pelo poder respondem às pressões da comunidade internacional e fazem anúncios de cessar-fogo na mídia, sem aplicar a medida no terreno.
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Êxodo em massa
A guerra entre Exército e paramilitares forçou a fuga de milhares de pessoas. O Ministério das Relações Exteriores egípcio anunciou que mais de 14 mil sudaneses e 2 mil cidadãos de outras nações chegaram ao Egito desde 15 de abril. Ontem, nove brasileiros que estavam em Omdurman — cinco membros da comissão técnica e quatro atletas do time de futebol Al-Merreikh — desembarcaram em segurança no Brasil, depois de uma viagem que durou quatro dias.
Aqueles que não conseguiram fugir do Sudão enfrentam desabastecimento de alimentos, interrupções no fornecimento de água e de energia elétrica, além de instabilidade nos serviços de telefonia e de internet. De acordo com o sindicato dos médicos, 14 hospitais foram bombardeados e 19 foram esvaziados por falta de material e funcionários ou porque os combatentes assumiram o controle de áreas próximas.
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Fome letal se espalha pelo continente, alerta ONU
A fome se espalha pelo Chifre da África e por Sahel, uma região árida que faz fronteira com o sul do Saara, devido à seca, às mudanças climáticas e aos conflitos, segundo as Nações Unidas e várias organizações não governamentais (ONGs). O total de mortes por fome contabilizadas na Etiópia, Somália e no Quênia, juntos, chegam em uma a cada 36 segundos, segundo um relatório feito pelo Unicef e as ONGs Care e Oxfam.
No Sahel (que atravessa o Senegal, Gâmbia, Mauritânia, Guiné, Mali, Burkina Faso, Níger, Chade, Camarões e Nigéria), cerca de 18,6 milhões de pessoas vivem em situação grave de insegurança alimentar. A seca excepcional, as mudanças climáticas e os conflitos explicam a gravidade da crise, apontaram os autores do relatório em uma entrevista coletiva em Paris.
Em Burkina Faso, desestabilizado por uma insurreição jihadista, três vezes mais crianças morreram entre janeiro e setembro de 2022 do que no mesmo período de 2021. O número de crianças tratadas por desnutrição aguda aumentou 50%, segundo o Unicef. A seca, as inundações e os conflitos no Níger complicam cada vez mais as colheitas, o que causa uma "queda na produção de cereais de quase 40%", lamentou Louis-Nicolas Jandeaux, da Oxfam France.
Na vizinha Nigéria, 430 mil crianças sofrem de desnutrição aguda e espera-se que 154.000 grávidas e lactantes sofram com isso neste ano, um aumento de 141% em relação a 2022, disse Lucile Grosjean, porta-voz do Unicef. Na vasta península oriental do continente conhecido como Chifre da África (Etiópia, Eritreia, Somália, Djibuti, Quênia e Sudão), cinco temporadas de chuvas insuficientes dizimaram o gado e destruíram as colheitas. A ONU indica que 22 milhões de pessoas estão ameaçadas pela fome na Etiópia, no Quênia e na Somália.