Pelos próximos dois meses, as fronteiras do Peru com Brasil, Chile, Equador, Colômbia e Bolívia ficarão sob o controle das Forças Armadas peruanas e da polícia. Durante o mesmo período, estará em vigor um estado de emergência para permitir operações policiais relacionadas ao controle fronteiriço, na preservação da ordem interna e dos direitos constitucionais. O decreto assinado pela presidente peruana, Dina Boluarte, é uma resposta ao agravamento da crise migratória no extremo sul do Peru, que faz divisa com o Chile. A chefe de Estado garantiu que o estado de emergência visa a combater a insegurança. "Aqueles que cometem diariamente ataques, roubos e outros atos criminosos são estrangeiros", lembrou.
O presidente do Congresso peruano, José Williams Zapata, disse esperar "que fique claro que aqueles estrangeiros contra a lei não podem ter permissão de permanecer no país". "É dever do Executivo tomar ações que garantam a soberania do Peru. Nós seguiremos fiscalizando e priorizaremos toda a iniciativa que dê segurança à nação", declarou. Há nove dias, o Chile endureceu o controle migratório, ao aprovar duas leis que permitem a prisão de migrantes em situação irregular e que estendem o período de custódia para conduzir sua expulsão.
O Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) divulgou que a maioria dos estrangeiros ilegais retidos na região é composta de haitianos e de venezuelanos. Os migrantes sustentam que desejam somente cruzar o território peruano em direção a seus países de origem ou tentar seguir viagem até os Estados Unidos, onde estão as famílias de alguns deles.
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Diretora para as Américas da organização não governamental Anistia Internacional, Erika Guevara Rosas admitiu ao Correio que a América do Sul enfrenta uma das maiores crises envolvendo pessoas com necessidade de proteção internacional. "Os governos continuam sua cruzada para violentar os direitos dessas pessoas, implementando políticas e medidas cruéis e desumanas. A militarização como resposta a uma situação desesperada de milhares de pessoas não pode ser uma solução adequada. Pelo contrário, provoca uma crise humanitária e de direitos humanos", denunciou. Para ela, impedir as pessoas de entrarem em um país pelos pontos fronteiriços formais acaba por incentivá-las a buscarem vias irregulares e a colocarem em perigo suas vidas e sua segurança, muitas vezes caindo nas mãos do crime organizado.
Rosas sublinhou que a maioria das pessoas que tentam entrar no Chile e no Peru são provenientes da Venezuela. "Elas tentam fugir de violações massivas dos direitos humanos, documentadas repetidamente por mecanismos internacionais. Calcula-se que mais de 7,2 milhões abandonaram o país nos últimos anos", disse.
Morador de Tacna, a apenas 52km da fronteira com o Chile, o engenheiro industrial Jorge Flores Durand, 37 anos, classificou a crise migratória como lamentável e admitiu preocupação dos 280 mil moradores da cidade situada no extremo sul do Peru. "Tacna se encheu de migrantes. Eles ocupam as praças e os parques. A delinquência também tem aumentado", afirmou ao Correio. "Os apelos para solucionar o problema partem dos governos regionais, como Chile, Peru, Equador, Colômbia e Venezuela", observou.
A 57km ao sul, em Arica, no norte do Chile, o projetista René Véliz, 68, contou à reportagem que a tensão na cidade envolve os estrangeiros que diariamente têm transitado pela fronteira. "Os migrantes provocam desordens em sua passagem e colocam em risco a integridade física das outras pessoas. Há muito fluxo de passageiros entre Arica e Tacna", explicou. "A viagem com visto e legalizada não dura mais do que uma hora. Os estrangeiros que estão na terra de ninguém provocam distúrbios e não permitem a passagem livre de veículos pela Rodovia Panamericana."
Véliz lembra que os migrantes entraram em territórios peruano e chileno sem qualquer controle. "É óbvio que o Peru não os aceita, e o Chile não pode conceder-lhes documentos. No Chile, os estrangeiros recebem muitas facilidades e benefícios. Por isso, entram, sem problemas, peruanos, bolivianos, equatorianos, colombianos, venezuelanos, haitianos e dominicanos."
De acordo com o jornalista e economista peruano Augusto Alvarez-Rodrich, a crise migratória é agravada pela situação de um grupo de famílias desesperadas entre um país que as expulsa (Chile) e outro que não as recebe (Peru). "Essa situação tem que ser resolvida logo, pois não se trata de um caminhão de contrabando, mas de pessoas que não podem ser abandonadas. É evidente que o problema é muito maior do que esse grupo de famílias. Por isso, deve-se buscar uma solução mais integral, capaz de recorrer à diplomacia multilateral. O que ocorre na fronteira é um problema regional", advertiu, por meio do Twitter.
Alvarez-Rodrich avalia que o governo chileno não dispensou um tratamento humanitário à crise, na medida em que não concedeu refúgio aos estrangeiros não documentados. "Isso me causa muita surpresa, vindo de um presidente supostamente progressista, como Gabriel Boric", disse.
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"Países violam obrigações"
"É obrigação dos Estados, por meio dos tratados internacionais e das leis nacionais, oferecer proteção internacional a essas pessoas. Medidas de violação de suas obrigações apenas colocam em risco as pessoas e as próprias comunidades de recepção. A situação aumenta o risco de uma catástrofe humanitária nas fronteiras. As imagens dantescas de pessoas e de famílias, muitas delas com crianças, tentando ingressar em território peruano ou chileno, ou manipuladas pelas autoridades, é uma amostra do enorme fracasso de cooperação e resposta dos governos de Peru e Chile.
Recentemente, documentamos como o Chile impôs medidas para impedir que as pessoas acessem seu direito a solicitar refúgio, impondo-lhes vários obstáculos. Em vez de recorrerem a essas medidas desumanas, os governos de Peru e Chile, e outros na região, deveriam se concentrar na cooperação para terem uma resposta integral baseada no pleno respeito aos direitos humanos e à atenção humanitária."