Quênia

Diretor de ONG que descobriu jejum extremo de seita no Quênia fala ao Correio

Hussein Khalid alertou as autoridades quenianas sobre fiéis do "pastor" Paul Mackenzie que morreram de fome. Ativista afirma que 90 corpos foram resgatados, mas adverte que centenas de seguidores estão desaparecidos na floresta de Shakahola

Rodrigo Craveiro
postado em 25/04/2023 21:22 / atualizado em 25/04/2023 21:47
 (crédito: Haki Africa)
(crédito: Haki Africa)

Foi graças a Hussein Khalid, diretor executivo da organização não governamental queniana Haki Africa, que o mundo tomou conhecimento do massacre atribuído à Igreja Internacional das Boas Novas (Good News International Church), na floresta de Shakahola, leste do Quênia. Paul Mackenzie Nthenge, um taxista que virou pastor em 2003 e fundou a seita, convenceu seus seguidores a respeitarem um jejum extremo. A justificativa: a fome lhes possibilitaria "conhecer Jesus". A prática levou à morte pelo menos 90 pessoas. De acordo com a Cruz Vermelha do Quênia, 212 fiéis estão desaparecidos e não se descarta que jejuam no meio da mata. Em entrevista ao Correio, Khalid falou sobre o caso que chocou o país do leste da África e comoveu o planeta. 

  • Funcionários carregam saco mortuário depois de exumar corpos na cova coletiva de Shakahola Yasuyoshi Chiba/AFP
  • Integrante da Cruz Vermelha conforta membro da Igreja Internacional das Boas Novas, em Shakahola Yasuyoshi Chiba/AFP
  • Cova coletiva encontrada na floresta de Shakahola, no leste do Quênia Haki Africa

Quantas covas vocês encontraram até o momento? E qual o total de corpos resgatados?

Foram encontradas mais de 60 covas. Até o momento, cerca de 20 foram abertas. Nas covas abertas, nós recuperamos 82 cadáveres. Também localizamos oito corpos antes que fossem sepultados. Com isso, o total de mortos até o momento é de 90. 

Como o senhor tomou conhecimento do jejum extremo realizado por essa seita?

Foi por meio de nosso escritório, na cidade de Malini. Familiares que buscavam seus entes queridos vieram até nosso escritório. Uma família nos procurou e reportou que uma criança tinha sido levada. Temiam que estivesse morta. Queriam nossa ajuda para que procurássemos o pastor (Paul Mackenzie Nthenge) e perguntássemos sobre o paradeiro da criança. Nós levamos a família à polícia, que não quis ajudar, em um primeiro momento. Então, fomos até a área onde estavam. Ali, nos deparamos com corpos e com outros fiéis, que ainda estavam vivos. Aqueles que foram resgatados nos revelaram que outras pessoas tinham morrido e nos levaram até o local onde foram sepultados. Ao vermos as covas coletivas, alertamos as autoridades, e o tema ganhou repercussão nacional. 

Procede a informação de que muitos fiéis ainda jejuam na floresta? 

Sim, acreditamos que há centenas de fiéis ainda na floresta, mantendo o jejum. É por isso que desde o primeiro dia temos insistido para que a missão de busca e retomada seja priorizada, a fim de salvarmos mais vidas. Cada dia que passa que os seguidores são deixados na floresta pode significar mais vidas perdidas. Sim, esperamos que o número de pessoas encontradas mortas na floresta aumente.

Em que situação foram encontrados os sobreviventes?

A maioria dos sobreviventes não queriam ajuda. Eles disseram que desejavam continuar com o seu jejum. Eles queriam morrer jejuando e "ir para o céu". Nós encontramos uma senhora muito fraca, à beira da morte. Ela recusou ajuda, não aceitou nem a água que lhe demos. Queria ser abandonada para morrer.

Ela morreu?

Nós a enviamos ao hospital. Ela ainda está sob medicação. Está viva, mas em condição crítica. 

O que mais chocou o senhor nesse caso?

Crianças, crianças inocentes morrendo de fome. Depois, enterradas em valas comuns.

O senhor conhecia Paul Mackenzie Nthenge?

Eu nunca estive com o pastor Mackenzie. Apenas o vi na televisão. A impressão que tenho dele é a de um indivíduo com boas capacidades de oratória e capaz de convencer facilmente qualquer pessoa.

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