RÚSSIA

"Amar não é crime", diz youtuber russo sobre namorado que será deportado para a China

Gela Gogishvili, 23 anos, contou o drama ao Correio, denunciou que governo Putin promove caçada a pessoas LGBTQIAP+ e descreveu a situação de Haoyang Xu, 21

Rodrigo Craveiro
postado em 16/04/2023 11:50 / atualizado em 16/04/2023 11:51
Gela Gogishvili e Haoyang Xu -  (crédito: Arquivo pessoal)
Gela Gogishvili e Haoyang Xu - (crédito: Arquivo pessoal)

“Ele é o amor da minha vida. Nós enfrentaremos todas as dificuldades juntos. Ele é a pessoa com quem envelhecerei.” Assim o russo Gela Gogishvili, 23 anos, descreveu ao Correio o namorado, Haoyang Xu, 21, que em 2019 trocou a cidade de Chengdu, na província chinesa de Sichuan, para estudar russo em Kazan, 830km a leste de Moscou. O casal costumava publicar vídeos na rede social TikTok e no YouTube, onde contam com 67,6 mil inscritos.

Com o tempo, tornaram-se estrelas do mundo virtual. Em alguns desses vídeos, eles se abraçam, recriam cenas de beijos envolvendo bissexuais e falam sobre a primeira relação sexual. No entanto, agora Xu está preso, foi julgado e condenado à deportação para a China.

“Nós fomos detidos pela polícia sob a acusação de promovermos os valores LGBTQIAP+ e não tradicionais, e a reatribuição de gênero. Por causa de nossos vídeos inocentes e fofos no YouTube e no TikTok, onde partilhamos nossas vidas e mostramos que nosso relacionamento é o mesmo de qualquer pessoa”, afirmou Gela, em entrevista por meio do Instagram. Ele contou que Xu foi detido em 5 de abril e levado a julgamento um dia depois. “A Justiça o considerou culpado de disseminar a propaganda LGBTQIAP+ e o condenou a uma pena de sete dias de prisão, além de deportação da Rússia para a China. Meu namorado foi levado, algemado, como se fosse um criminoso, para local desconhecido”, acrescentou.

Gela descobriu que Xu estava confinado no Ministério de Assuntos Internos, em uma cela com outros criminosos. Depois de sete dias, o rapaz chinês foi transferido para um centro de detenção provisória, em outra cidade, Naberezhnye Chelny, a 237km de Kazan, onde aguarda a deportação. “Nos primeiros dois dias de detenção ali, ele não recebeu comida, apenas água suja. Os policiais até mesmo tiraram-lhe o cobertor, e ele passou frio. Agora, fui capaz de enviar-lhe comida com a ajuda de moradores da cidade que se inscreveram em nosso canal no YouTube.”

 

  • Haoyang Xu Arquivo pessoal
  • Gela Gogishvili e Haoyang Xu Arquivo pessoal
  • Gela Gogishvili e Haoyang Xu Arquivo pessoal

De acordo com Gela, em 13 de abril foi realizado novo julgamento. “Nós entramos com uma apelação, mas o juiz fechou os olhos para todas as violações da polícia, os documentos forjados e os fatos infundados. Ele também proibiu Xu de comparecer ao tribunal. A decisão foi tomada em dois minutos, e a Corte corroborou a sentença do primeiro julgamento”, disse o russo.

Gela também seria julgado em algumas semanas. No entanto, um juiz cancelou o caso porque encontrou inúmeros erros abordados pelos advogados que defenderam Xu Khaoyan. “A polícia não está feliz com isso e busca reabrir o caso contra mim”, denunciou. “Na Rússia, há uma caçada a pessoas LGBTQIAP+, porque o governo de Vladimir Putin precisa criar um inimigo interno, que são os homossexuais. Para as autoridades, somos espiões da Europa e dos Estados Unidos, estragamos as tradições e as crianças, somos um vírus gay. A Rússia está em guerra com inimigos internos e externos. Putin quer unir o povo em torno dele, os dirigindo contra nós, contra as pessoas LGBTQIAP+”, acrescentou o youtuber.

A última vez em que o casal se viu foi em 6 de abril, durante o primeiro julgamento de Xu. “Dois dias depois, eu o vi em uma ala isolada da prisão. Ficamos separados por dois vidros e um bando de barras de ferro. Pudemos nos comunicar por meio de telefones. Desde então, temos nos falado, por telefone, todos os dias, durante alguns minutos. Eu sinto tanta falta dele. Quero abraçá-lo. Não tenho dormido à noite, não como, acordo sempre muito cedo e espero por sua ligação, para ao menos ouvir sua voz. Amar não é um crime”, desabafou.

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