Quando chegou ao endereço em North Dighton, uma cidade de 8 mil habitantes situada no estado de Massachusetts, 70km ao sul de Boston, a equipe de reportagem do jornal The New York Times conversou com a proprietária da casa, que deu a dica. Ela confirmou que o filho era membro da Guarda Nacional Aérea e, até recentemente, trabalhava em plantões noturnos em uma base militar de Cape Cod. Segundo a mulher, o rapaz precisou trocar o número de telefone nos últimos dias.
Mais tarde, ao retornarem à residência, os repórteres do NY Times viram a mesma mulher e um homem do lado de fora, na entrada da garagem. Questionada se o filho estava no local, o homem respondeu: "Ele precisa de um advogado, se as coisas estão fluindo assim. Os Feds (agentes federais) estarão por perto em breve, tenho certeza".
Por volta das 13h30 (14h30 em Brasília), Jack Douglas Teixeira, 21 anos, o suspeito de vazar mais de 100 documentos secretos e ultrassecretos do Pentágono, deixou a casa sob a mira de armas de grosso calibre, escoltado por agentes do FBI, a polícia federal norte-americana. De bermuda vermelha e camiseta, Jack caminhava com as mãos sobre a cabeça. Ao lado de um carro blindado, ele foi algemado.
"Hoje (Ontem), o Departamento de Justiça prendeu Jack Douglas Teixeira, em conexão com a investigação sobre a remoção não autorizada, a posse e a transmissão de informações secretas de defesa nacional. Teixeira é empregado da Guarda Nacional da Força Aérea. O FBI o levou sob custódia, na tarde de hoje (ontem), sem incidentes", declarou Merrick Garland, procurador-geral dos EUA.
O Gabinete da Guarda Nacional dos Estados Unidos confirmou que Jack Teixeira alistou-se, em setembro de 2019, como especialista em tecnologia da informação e comunicação. Ele alcançou o posto de aviador de 1ª classe, o terceiro mais baixo para membros da Força Aérea.
Minutos antes de ser preso, Teixeira foi flagrado lendo, na área externa do imóvel. Depois da detenção, agentes do FBI fizeram uma varredura na casa, em busca de provas em computadores, discos rígidos, pen drives, câmeras e celulares. O jornal Observador, de Portugal, divulgou que o suspeito é descendente de segunda geração de portugueses. Os avós paternos de Jack Teixeira são naturais dos Açores, mas o rapaz nasceu em Massachusetts e não tem dupla cidadania.
Saiba Mais
- Mundo De cachoeira a show da Disney, as atrações do 'melhor aeroporto do mundo'
- Mundo Jovem brasileiro morre após cair do 6º andar de prédio em Portugal
- Mundo Quem é homem preso pelo FBI acusado de vazar documentos secretos
- Mundo A disputa sobre pílula do aborto que pode chegar à Suprema Corte dos EUA
Armas e Deus
Teixeira comandava a sala de bate-papo intitulada "Thug Shaker Central" (ou "Central do Bandido Agitador") no aplicativo de mensagens Discord, bastante popular entre adeptos de jogos eletrônicos. Ele teria compartilhado os documentos confidenciais com um pequeno círculo on-line de amigos. Naquele ambiente, Jack usava os apelidos "OG" e "jackthedripper" ("Jack, o gotejador"). Entre os 24 integrantes, havia cidadãos da Rússia e da Ucrânia. O grupo se dizia unido em torno da "paixão mútua por armas, por equipamentos militares e por Deus". O "Thug Shaker Central" não aceitava a participação de pessoas que não fossem convidadas.
Na segunda-feira, o Pentágono reconheceu que o vazamento representava um risco "muito grave" para a segurança nacional dos Estados Unidos. O presidente norte-americano, Joe Biden, recebeu informações atualizadas sobre a prisão de Jack Teixeira, durante sua viagem à Irlanda. Mais cedo, ao falar sobre o caso, ele se disse "preocupado".
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.
O que se sabe até agora sobre o vazamento de informações sensíveis para os Estados Unidos
O suspeito
Jack Teixeira, 21 anos, formou-se em julho de 2022 na 102ª Ala de Inteligência da Guarda Nacional Aérea. Líder de um servidor da rede social Discord, ele compartilhou dezenas de documentos secretos e ultrassecretos do Pentágono. Jack cresceu em Providence (Rhode Island) e vivia com os pais em North Dighton (Massachusetts), a 33km.
Anos de vazamentos
As autoridades acreditam que ele tenha publicado informações secretas há anos. Jack trabalhou em uma base militar de Cape Cod (Massachusetts), onde teria começado a transcrever notas de inteligência secreta com o servidor do Discord chamado de "Thug Shaker Central", que abrigava 30 membros.
O teor dos documentos
Contraofensiva da Ucrânia
As informações secretas e ultrassecretas divulgadas por Jack Teixeira colocavam em dúvida a capacidade da Ucrânia de reconquistar o território perdido para a Rússia, além de apontarem a degradação do sistema de defesa de Kiev e deficiências no treinamento das tropas. A capacidade de Kiev para manter defesas aéreas de médio alcance para proteger a linha de frente "se reduzirá a zero até 23 de maio", indicam os documentos.
Baixas no front
Um dos documentos faz um balanço do conflito na Ucrânia em 1º de março de 2023 e avalia as perdas de vidas da Rússia entre 35.500 e 43.500 pessoas, frente às 16.000 a 17.500 da Ucrânia. Moscou também teria perdido mais de 150 aviões e helicópteros, frente aos mais de 90 de Kiev.
Uso de drone
Segundo um documento sem data, o presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, teria lamentado, em 28 de fevereiro, diante do mais alto general, que o seu exército não teria mísseis de longo alcance que permitiriam atacar as forças inimigas em território russo, e sugeriu realizar um ataque com drones.
Protestos em Israel
Outro documento não datado afirma que os líderes do Mossad, o serviço secreto israelense, incentivaram funcionários da agência e cidadãos a protestarem contra a reforma judicial proposta pelo governo.
Vigilância do Mar Negro
Um documento de 27 de fevereiro analisa os voos de vigilância do Mar Negro por parte de EUA, Reino Unido, França e Otan, usando drones e aviões. Cerca de duas semanas depois da data desse documento, Washington acusou a Rússia de interceptar um dos seus drones MQ-9 Reaper sobre o Mar Negro e de destruí-lo.