Na última quinta-feira (16/3), o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) da Venezuela anulou um artigo do Código de Justiça Militar que penalizava a homossexualidade dentro das Forças Armadas com até três anos de prisão. De acordo com o documento publicado no site do TSJ, a decisão foi tomada porque o texto do Código Orgânico da Justiça Militar conflita com os princípios fundamentais da Constituição venezuelana.
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“A Sala Constitucional do principal tribunal da República anulou, a pedido do Defensor do Povo, cidadão Alfredo Ruiz Angulo, o texto do parágrafo único do artigo 565 do Código Orgânico da Justiça Militar, por carecer de suficiente clareza e precisão jurídica no que diz respeito à conduta que pretendia sancionar”, anunciou o TSJ em seu site.
“A referida norma, cuja existência foi questionada por organismos internacionais, impunha pena de um a três anos de prisão ao militar que cometesse ‘atos sexuais não naturais’, sem definir o que se deve entender por tais atos”, acrescenta o comunicado.
O tribunal também considerou que “a interpretação, à luz das atuais concepções científicas, sociais e jurídicas, não é compatível com a Constituição nem com instrumentos internacionais (...) por ser contrária ao postulado fundamental da progressividade em termos de garantia dos direitos humanos”.
A decisão do TSJ, que deveria declarar a inconstitucionalidade ou não do artigo, é considerada uma vitória por integrantes do movimento LGBTQIAP+ na Venezuela, um país considerado conservador e repressivo a manifestações da comunidade.
“Depois de tantos anos de luta, nós conseguimos a nulidade do artigo do código de justiça militar", declarou o ativista Leandro Viloria, um dos líderes da campanha para abolir a norma à AFP.
A anulação do artigo, que provocou a expulsão de um número não divulgado de oficiais das Forças Armadas, também repercutiu nas redes sociais. “Vitória na Venezuela! O Tribunal Supremo do país despenaliza a homossexualidade no exército venezuelano. A comunidade LGBT da Venezuela está feliz, embora temam que isso fique apenas no papel”, escreveu um internauta.
O perfil da ONG venezuelana “Nunca dejes de soñar” também comemorou. “Histórico! O TSJ declarou anulação do artigo que punia com penas de um a três anos de prisão pessoas LGBTIQ nas Forças Armadas. O progressismo dos direitos humanos deve ser uma norma em nosso país. Basta de retrocessos”, publicou.
Histórico
No ano passado, em entrevista à AFP, um ex-capitão da Força Armada da Venezuela contou como foi o processo de repressão como militar que escondia um relacionamento com um outro homem até se tornar desertor.
“É mais grave ser gay do que ser corrupto. Há militares corruptos, ladrões, narcotraficantes, com procedimentos que os sancionam e seguem trabalhando como se nada tivesse acontecido”, lamentou ele à época.
Ele também conta que, em 2017, um grupo de militares foi investigado para "determinar quem era gay”. Não ser casado e não ter filhos já eram fatores que geravam a suspeita.
O ex-capitão afirma ter ficado detido por quatro dias enquanto era submetido a testes de polígrafo e a humilhações. “Pergutavam se eu tinha noiva; me chamaram de maricas. Como não tiveram uma prova contundente (...) se dedicaram a me humilhar”, afirmou.
Depois dessa situação, não lhe foi mais permitido comandar tropas e passou meses preso em um galpão, onde apenas cumpria seu horário. “O comandante dessa unidade me dizia que tinha nojo de maricas, que não me queria por perto”, explicou.
Hoje exilado na Espanha, ele conta que sua última atribuição antes de decidir desertar das Forças Armadas foi gerenciar a conta de um comando no Twitter. “Estava tão decepcionado que decidi sair”, contou.
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