Estudantes de escolas públicas dos condados Manatee e Duval, da Flórida, se depararam, no início do mês de fevereiro, com uma cena inusitada para uma instituição de ensino: as estantes de livros das salas de aulas estavam vazias ou cobertas com um pano. O “desaparecimento” das obras literárias ocorreu após entrar em vigor uma nova lei do estado, que determina uma revisão dos livros para que se enquadre em certos critérios.
A lei, que foi proposta e aprovada pela Câmara da Flórida, entrou em vigor em julho de 2022, mas não havia sido, até então, regulamentada. A legislação determina que livros escolares sejam apropriados para a idade, livres de pornografia e “adequados às necessidades dos alunos” — o último ponto é visto como abrangente e carente de definição explícita para que não haja o descumprimento da ordem sem ter a intenção disso.
Diferente do entendido quando a lei foi sancionada, bibliotecas privadas construídas por professores para as turmas que ensinam também devem obedecer às regras.
Os títulos devem ser analisados e aprovados por um especialista em mídia escolar qualificado, que, de acordo com a lei, deve passar por um treinamento fornecido pelo estado. No entanto, até janeiro, o Departamento de Educação da Flórida não promoveu o treinamento, o que prejudicou a renovação de livros para centenas de escolas do estado.
O “cerco” contra os educadores foi apertado em janeiro, quando ordens do governo de cada condado, enviadas por ofício obtido pelo The Post, ordenou que professores que mantêm bibliotecas nas salas de aula deveriam “remover ou cobrir todos os materiais que não foram examinados”.
Uma porta-voz do Departamento de Educação da Flórida afirmou que o descumprimento da ordem configura crime de terceiro grau, no qual o professor pode ser condenado a até cinco anos de prisão e uma multa de US$ 5 mil.
O documento do condado de Manatee diz ainda que após os títulos serem “revisados por um especialista em mídia treinado pelo Departamento de Educação da Flórida”, serão “apresentados e aprovados” em uma reunião especial da escola e, por fim, “será assinada a liberação do diretor” para as obras.
Ao receber o comunicado, os educadores do condado de Manatee enviaram à superintendente local, Cynthia Saunders, preocupações sobre a ação e perguntas sobre o período da qual a sanção iria durar.
Em resposta, Cynthia lembrou que violar a lei trará à ficha criminal do professor um crime de terceiro grau e que “estamos buscando voluntários para ajudar na verificação e compilação de uma lista de sites para que os livros possam ser devolvidos às bibliotecas de sala de aula”.
Situação semelhante ocorreu no condado de Duval. O distrito publicou um comunicado em 23 de janeiro, no qual informou como será o processo de revisão. “Após o treinamento e orientação recentes do estado, as escolas públicas do Condado de Duval agora realizaram uma revisão formal das bibliotecas de sala de aula”, disse o anúncio.
Dois dias depois, o distrito disponibilizou às escolas links de um vídeo de sete minutos, não listado no Youtube, no qual a diretora acadêmica Paula Renfro anunciou que “as bibliotecas de sala de aula serão temporariamente reduzidas para incluir apenas livros que foram aprovados por especialistas em mídia certificados e livros que estão na lista aprovada pelo estado”.
“Enquanto isso, os livros que não estão na lista aprovada pelo distrito ou não aprovados por um especialista certificado em mídia precisam ser cobertos ou armazenados e pausados para uso dos alunos”, acrescentou a diretora.
A presidente da Associação Educacional de Manatee, Pat Barber, contou ao The Post sobre inúmeras preocupações enviadas por professores à instituição. Barber diz que os educadores estão “angustiados” com a ideia de possivelmente serem multados e condenados à prisão por indicarem livros para os alunos.
“E se eles forem obrigados a examinar todos os livros em suas bibliotecas de sala de aula, de onde virá o tempo? Estamos falando, para algumas pessoas, de milhares de livros porque desenvolveram essas bibliotecas ao longo dos anos”, pontuou Barber.
Informações recebidas pelo conselho da Associação de Mídia para Educação da Flórida relatam o sofrimento de crianças que imploram para os diretores da instituição a reversão da retirada dos livros da sala de aula. “Em uma escola, as crianças começaram a chorar e escrever cartas para o diretor, dizendo: 'Por favor, não pegue meus livros, por favor, não faça isso”, contou Marie Masferrer, membro do conselho.
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