Um impasse envolvendo uma promessa da Alemanha em fornecer tanques de guerra Leopard 2 à Ucrânia evidenciou fraturas na aliança ocidental formada para suprir Kiev com armamentos. Especialistas consideram que o equipamento (veja foto) tem o potencial de mudar os rumos do conflito, depois de uma série de reveses sofridos por Moscou. A Rússia insiste que queimará os tanques inimigos e garante que a entrega dos armamentos não mudará "nada" no campo de batalha.
No início de uma reunião dos países aliados, na base americana de Ramsterin (Alemanha), o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, disse que precisa proteger o seu povo dos bombardeios russos e fez um apelo, por meio de videoconferência: "Temos que acelerar (o recebimento de ajuda); o tempo deve se tornar nossa arma em comum, assim como a defesa área, a artilharia, os blindados e os tanques". "Está em suas mãos poder lançar esta importante entrega que vai deter o mal", acrescentou Zelensky.
Apesar da resistência de Berlim, o ministro da Defesa da Polônia, Mariusz Baszczak, admitiu estar convencido de que os aliados ocidentais conseguirão superar as diferenças e formar uma coalizão para despachar os tanques Leopard 2 para a Ucrânia. Ontem, a Alemanha explicou que avalia os "prós e contras" de repasse dos equipamentos. "Não estamos hesitando, apenas estamos pesando os prós e os contras (...) Temos a responsabilidade de pensar, detidamente, nas consequências para todas as partes no conflito", comentou o ministro da Defesa da Alemanha, Boris Pistorius.
O ministro das Relações Exteriores polonês, Zbigniew Rau, advertiu que vidas serão perdidas por conta da relutância da Alemanha. "Armar a Ucrânia para repelir a agressão russa não é o tipo de um exercício de tomada de decisão. O sangue ucraniano tem sido derramado de verdade. Este é o preço da hesitação sobre as entregas do Leopard. Precisamos de ação, agora", escreveu no Twitter. Além da Polônia, a Finlândia sinalizou que pode enviar os Leopard que tem à disposição, caso Berlim autorize. No entanto, o consentimento alemão é uma incógnita. O secretário da Defesa dos Estados Unidos, Lloyd Austin, recusou-se a culpar a Alemanha, um aliado histórico, mas ressaltou que "todos podemos fazer mais pela Ucrânia".
Ceticismo
Por sua vez, Mark Milley, chefe do Estado-Maior Conjunto dos EUA, demonstrou ceticismo em relação a um fim iminente do conflito. "De um ponto de vista militar, sigo sustentando que, neste ano, será muito difícil expulsar por completo as forças russas de todas as regiões ocupadas da Ucrânia." Na segunda-feira, o Reino Unido anunciou o envio de 600 mísseis Brimstone para o teatro de operações. "Isso será extraordinariamente importante para ajudar a Ucrânia a dominar o campo de batalha", afirmou o ministro da Defesa britânico.
Especialista da Escola de Análise Política, em Kiev, Anton Suslov não se surpreende com a indecisão da Alemanha em enviar os tanques à Ucrânia. Ele lembra que este tem sido o modus operandi de Berlim desde o início da invasão russa, em 24 de fevereiro passado. "No entanto, alguns suprimentos que não imaginaríamos quase 11 meses atrás tornaram-se uma realidade, o que prova que nada é impossível", lembrou ao Correio.
De acordo com Suslov, o governo de Olaf Scholz adotou uma estratégia de evitar provocações. "Os alemães acreditam que algumas armas possam atiçar o presidente russo, Vladimir Putin. No entanto, Boris Pistorius anunciou hoje (ontem) que pediu uma inspeção no estoque de tanques Leopard 2", comentou. O estudioso lamenta que a Ucrânia sempre pague com as vidas dos cidadãos pela relutância a comunidade internacional. "Alguma discussão política vale uma vida humana?", questionou Suslov.
Mercenários
O governo dos Estados Unidos designou, ontem, o grupo paramilitar russo Wagner como uma organização criminosa transnacional", aumentando a pressão sobre o grupo armado privado que combate na Ucrânia e tambén atuou na Síria. O Grupo Wagner "é uma organização criminosa que continua cometendo atrocidades generalizadas e abusos contra os direitos humanos", declarou o porta-voz de Segurança Nacional da Casa Branca, John Kirby.
Ele acrescentou que "o Grupo Wagner conta atualmente com cerca de 50 mil pessoas destacadas na Ucrânia, entre elas 10 mil mercenários e 40 mil prisioneiros". O Ministério da Defesa da Rússia tem demonstrado reservas em relação ao método de recrutamento adotado pelo Grupo Wagner, aliado do Kremlin.