O crime atribuído a eles: corrupção sobre a Terra. O campeão de caratê Mohammad Mehdi Karami, 22 anos, e o treinador de crianças Mohammad Seyyed Hosseini, 39, foram enforcados ontem. Um tribunal de primeira instância considerou ambos culpados de matar Seyed Ruhollah Ajamian, membro da milícia paramilitar Basij, em Karaj, a oeste de Teerã. Em 3 de novembro, eles participavam de um protesto contra a morte de Mahsa Amini — jovem de 22 anos assassinada pela polícia da moralidade por não usar o hijab (véu islâmico) de forma adequadada — quando reagiram à repressão.
"Meu coração está com os familiares deles, enlutados e chocados com as notícias. É algo devastador, além de nossa tolerância. Não podemos mais aceitar o regime do Irã e sua brutalidade. Basta!", desabafou ao Correio, por telefone, a ativista iraniana curda Halaleh Taheri, fundadora da Organização para Mulheres e para a Sociedade do Oriente Médio (em Londres). "Os iranianos, especialmente mulheres e trabalhadores, que têm lutado por tantos anos contra a opressão, a pobreza, a fome, a injustiça, decidiram fazer a coisa certa e protestar."
De acordo com ela, os protestos que irromperam em várias cidades do Irã mostram que as pessoas não podem mais suportar a brutalidade. "A mudança precisa dar início a uma revolução. O regime sabe disso e contra-ataca, por meio de prisões e de execuções de jovens, inclusive de crianças. Mais de 20 mil pessoas foram detidas e cerca de 600, mortas nos protestos. Quatro manifestantes foram executados, e 20 estão no corredor da morte", afirmou Taheri. "O medo convive com a ira. Não existe escolha para os iranianos. Se pararem com os protestos, o regime começará a matar mais gente. A única solução é pôr fim a esse regime."
Ameaça
Taheri acredita que as autoridades de Teerã veem os manifestantes como uma ameaça. "Os protestos são uma reação incrível à morte de Mahsa Amini. Em todo o mundo, cantores, políticos, ativistas, cineastas e outras personalidades lançaram luz sobre a situação das mulheres no Irã e a brutalidade da República Islâmica", avaliou. Ela considera essencial o protagonismo da comunidade internacional em pressionar Teerã e cita o fechamento de centros culturais e religiosos mantidos pelos aiatolás.
Diretor da ONG Iran Human Rights (em Oslo), Mahmood Amiry-Moghaddam entende que as execuções de manifestantes são contraproducentes. "Ao contrário do objetivo do regime iraniano, de fazer com que as pessoas percam a esperança, elas levarão mais raiva aos iranianos. Isso aumentará o custo das execuções para o regime", alertou, em entrevista ao Correio.
Amiry-Moghaddam explicou que as autoridades de Teerã escolhem punir pessoas oriundas de setores marginalizados da sociedade. "Um dos mortos hoje (ontem), Seyyed Hosseini, não tinha pais nem parentes próximos. Karami era do Curdistão. Ambos não representavam alto risco político para Teerã."
Ele defende que a comunidade internacional intensifique as condenações ao Irã. "É hora de colocar a Guarda Revolucionária e entidades afiliadas na lista de terrorismo, impondo-lhes pesadas sanções. É muito importante que as execuções tenham consequências práticas reais."