Jornal Correio Braziliense

COLÔMBIA

Governo da Colômbia anuncia cessar-fogo com grupos armados no país

Governo anuncia uma trégua de seis meses com o Exército de Libertação Nacional (ELN) e os outros quatro principais grupos armados em atividade no país. Oposição critica iniciativa, celebrada pelas Nações Unidas, que vão fiscalizar o cumprimento do pacto

O ano novo começou na Colômbia com a expectativa de um período de pacificação. Nos últimos minutos de 2022, o presidente Gustavo Petro anunciou um cessar-fogo de seis meses, pactuado pelo governo com os cinco principais grupos armados que atuam no país. "Acordamos uma trégua bilateral com o ELN (Exército de Libertação Nacional), a Segunda Marquetalia, o Estado-Maior Central, o AGC (Autodefesas Gaitanistas da Colômbia) e as Autodefesas de Sierra Nevada de 1º de janeiro a 30 de junho de 2023, prorrogável segundo os avanços nas negociações", tuitou Petro.

Trata-se da maior trégua acertada desde as negociações de paz que resultaram em um acordo assinado, em 2016, entre as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) e o governo do então presidente Juan Manuel Santos. O acerto divulgado no fim da noite de sábado era um dos principais objetivos de Petro, ele próprio um ex-guerrilheiro, do Movimento 19 de Abril (M-19).

"Esse cessar-fogo bilateral obriga as organizações armadas e o Estado a respeitá-lo. Haverá um mecanismo de verificação nacional e internacional", assinalou o presidente, classificando o pacto como um "ato audacioso".

A oposição criticou a iniciativa. Para o congressista Andrés Forero, do Centro Democrático, partido do ex-presidente de direita Álvaro Uribe (2002-2010), "a trégua bilateral é uma inaceitável claudicação do Estado perante os grupos armados ilegais" e uma decisão para "atar as mãos da força pública".

Em nota divulgada ontem, a Casa de Nariño, sede do governo, anunciou que expedirá "um decreto específico para cada uma das organizações, onde será determinado a duração e as condições desse cessar-fogo". A Organização das Nações Unidas (ONU), a Defensoria do Povo e a Igreja Católica verificarão o cumprimento da trégua.

As Nações Unidas saudaram o entendimento. "Os esforços orientados a reduzir a violência nos territórios, a proteger as comunidades afetadas pelo conflito e a construir a paz na Colômbia", tuitou Carlos Ruiz Massieu, representante no país do secretário-geral da ONU, António Guterres.

"Paz total"

Sob sua política de "paz total", o governo pretende pôr fim a seis décadas de conflito armado mediante o diálogo com guerrilheiros, narcotraficantes, paramilitares e gangues. A última insurgência reconhecida do país, o Exército de Libertação Nacional (ELN) negocia com representantes de Petro desde novembro. Já os grupos Segunda Marquetalia e Estado Mayor Central — que não aderiram ao pacto de paz assinado pelas Farc — mantêm "diálogos exploratórios" em separado com delegados do Petro.

Sob a liderança — no passado — do capo (chefão) Otoniel, extraditado para os Estados Unidos, as AGC são a maior quadrilha de traficantes do país. Assim como as Autodefesas de Sierra Nevada, são formadas por remanescentes dos paramilitares de extrema direita que se desmobilizaram no início dos anos 2000.

Juntos, esses grupos somam mais de 10 mil homens armados, que disputam a receita gerada pelo tráfico de drogas e por outros negócios ilícitos no maior produtor de cocaína do mundo, conforme dados do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento e a Paz (Indepaz).

A política de "paz total" se tornou lei em novembro, depois que o Congresso, de maioria governista, apoiou a ambiciosa proposta de Petro de negociar a desmobilização de guerrilheiros e acordar benefícios judiciais para traficantes e outros grupos ilegais. "Estaremos atentos para verificar, nos diferentes territórios, que se cumpra o cessar das ações armadas por parte dos grupos armados ilegais", informou, no Twitter, a Defensoria do Povo.

Embora o histórico acordo de 2016 com as Farc tenha transformado a guerrilha mais poderosa do continente em um partido político, o conflito continua depois de seis décadas e de mais de nove milhões de vítimas.

Primeiro presidente de esquerda da história da Colômbia, Petro chegou ao poder em 7 de agosto. Paralelamente à sua política de "paz total", o ex-guerrilheiro também deu uma guinada ao que considera uma guerra "fracassada" contra as drogas após décadas de apoio americano.

O governo abandonou a erradicação forçada de pequenos cultivos de folha de coca e pediu à força pública que se concentrasse na perseguição dos elos mais lucrativos do negócio ao invés dos camponeses. A Colômbia é o maior produtor de cocaína do mundo e os Estados Unidos, os maiores consumidores desta droga.

Apesar da aproximação com os diferentes grupos armados, Petro ainda não conseguiu conter a espiral de violência que assola o país. O centro de estudos independente Indepaz registrou quase uma centena de massacres no país em 2022.