Horas depois de a imprensa norte-americana divulgar a descoberta de nova leva de documentos confidenciais na garagem e em um cômodo contíguo da casa do presidente Joe Biden, em Wilmington (Delaware), o secretário de Justiça dos EUA, Merrick Garland, nomeou um procurador independente para investigar o caso.
Os dossiês datam da época em que o democrata era vice de Barack Obama. Na segunda-feira, o próprio Biden tinha admitido que uma dezena de documentos do tipo havia sido encontrada em seu escritório, no Penn Biden Center, um think tank localizado em Washington. Os incidentes colocam pressão sobre o inquilino da Casa Branca, que atribui a situação ao "descuido". O magnata republicano Donald Trump, seu antecessor, enfrenta problemas com a Justiça também por ter mantido a posse de arquivos presidenciais.
O escolhido de Garland para assumir o inquérito é Robert Hur, procurador federal em Maryland nomeado por Trump, em 2017 — quatro anos depois, ele renunciou; desde então, trabalhava como autônomo em Washington. "Conduzirei a investigação designada com julgamento justo, imparcial e desapaixonado. Eu pretendo seguir os fatos de forma rápida e completa, sem medo ou favor, e honrarei a confiança depositada em mim para realizar este serviço", declarou, por meio de nota.
Advogado de Biden, Richard Sauber afirmou estar confiante de que "uma revisão completa mostrará que esses documentos foram extraviados inadvertidamente, e que o presidente e seus conselheiros legais agiram prontamente, após perceberem o erro". Garland afirmou "acreditar firmemente que os processos normais do Departamento de Justiça são capazes de lidar com todas as investigações com integridade".
"De acordo com os regulamentos, as circunstâncias exigem a nomeação de um procurador especial para esse caso", explicou. O secretário destacou que a nomeação de Hur evidencia o compromisso "com a independência do Poder Judiciário em casos particularmente delicados e seu compromisso em tomar decisões orientadas unicamente pelos fatos e pela lei".
Por e-mail, Steven Aftergood, especialista em segredos de governo da Federação dos Cientistas Americanos, explicou ao Correio que o rótulo de "classificados" de documentos indica que eles são confidenciais e poderiam causar algum dano à segurança nacional, de alguma maneira, se fossem divulgados. "Sempre que esses documentos forem encontrados em um local inseguro, como um resort particular ou uma garagem, isso é algo com o que as autoridades devam se preocupar", afirmou. "Quão sério é do ponto de vista da segurança? Depende da natureza da informação e da possibilidade de divulgação indevida."
Para Aftergood, a aferição sobre possíveis danos políticos para Biden está associada ao resultado das investigações. "Para o presidente, isso pode ser apenas um constrangimento, pois até agora não há evidências de comportamento ilegal deliberado. Para Trump, a situação é mais complicada, pois ele se recusou a voluntariamente cumprir com os pedidos para devolver os documentos.
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Por sua vez, Mitchell Epner — ex-procurador federal para o Distrito de Nova Jersey e advogado da firma Rottenberg Lipman Rich P.C. (em Nova York) — considera "muito surpreendente" saber que documentos classificados estavam no escritório e na garagem da casa de Biden. "É prematuro avaliar o impacto do caso na carreira política de Biden. Muito dependerá da investigação sobre as circunstâncias nas quais os documentos foram levados para esses locais e como os fatos vieram à tona", disse à reportagem.
Epner admite que a nomeação de um investigador representa um passo "muito grave". "Isso torna muito mais difícil para Biden desqualificar o tema como sendo algo trivial", comentou. Segundo ele, o procurador-geral Garland precisou fazer uma avaliação de limite para justificar a indicação. "Se houver atividade criminal envolvendo o transporte ou a retenção de documentos secretos, uma sentença significativa de prisão será possível."
Por sua vez, Roland Riopelle, ex-procurador federal para o Distrito Sul de Nova York, avalia os fatos como "preocupantes", mas descarta o enfraquecimento de Biden ou do governo, ao menos que ocorram graves desdobramentos. "É uma situação embaraçadora, não um crime", disse ao Correio. Segundo ele, Robert Hur parece ser "muito bem qualificado" para a investigação.
"Se houver processo em algum momento, será por fatos desconhecidos até o momento. Se um processo criminal for apresentado, o crime poderá variar de contravenção a delito grave. No primeiro cenário, a pena máxima é de um ano de detenção. No caso de delito grave, cinco anos." Riopelle acredita que a situação de Biden é muito diferente da de Trump. "O ex-presidente escondeu os documentos e se recusou a devolvê-los."
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"No mínimo, esses eventos serão uma distração para o governo Biden. O presidente, provavelmente, contratará um advogado particular, o que exigirá tempo para as reuniões e para a discussão sobre o tema. É muito prematuro para dizer se houve alguma violação cometida pelo presidente. Caso exista, será 'algo grave'."
Mitchell Epner, ex-procurador federal para o Distrito de Nova Jersey e advogado da firma Rottenberg Lipman Rich P.C.
(em Nova York)
"Vejo essa situação mais como um embaraço, que dará ao Partido Republicano alguma munição política. Duvido de qualquer processo criminal decorrente dessa descoberta. Com base no que sabemos, parece que a posse de documentos por Biden ocorreu de modo inadvertido. Ele próprio teria relatado a existência desses papéis às autoridades e feito o que podia para se certificar de que os documentos fossem tratados de forma adequada e entregues aos Arquivos Nacionais."
Roland Riopelle, ex-procurador federal para o Distrito Sul de Nova York
Hipertexto - Remoção obrigatória
Nos Estados Unidos, uma lei de 1978 obriga os presidentes e vices a enviarem todos os seus e-mails, cartas e outros documentos de trabalho aos Arquivos Nacionais. Esses registros devem permanecer armazenados em locais seguros, durante o mandato presidencial. Antes da troca de comando do país, os documentos têm que ser repassados à instituição.