Em um momento crítico para a conservação das espécies, representantes de 196 países devem aprovar, hoje, um acordo para proteger 30% das terras e 30% dos oceanos globais até 2030, com o compromisso de começar a recuperar a biodiversidade a partir de 2050. Presidida pela China, mas sediada em Montreal, no Canadá, devido aos bloqueios anticovid ainda em vigor no país asiático, a COP15 é considerada um dos principais encontros internacionais recentes no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU). O evento define a agenda de metas pós-2020, depois do fracasso do plano de 2010-2020, construído no Japão, e que não atingiu quase nenhum objetivo.
O rascunho apresentado ontem pela China é a base do texto que será votado hoje e, embora ainda tenha pontos a definir, marcados nas 13 páginas por colchetes em branco, mantém a chamada meta 30 por 30, um ponto considerado chave para o sucesso da COP15. Se aprovado pelas delegações, este será o documento final mais ambicioso de uma conferência da biodiversidade desde a primeira, em 1994. "É o maior compromisso da história com a conservação dos oceanos e da terra", comemorou Brian O'Donnell, diretor da organização não-governamental (ONG) Campaign for Nature.
O cenário não poderia ser mais propício: estima-se — e o esboço divulgado na véspera do encerramento reconhece isso — que 1 milhão de espécies animais e vegetais corram risco de extinção. "Exceto que sejam estabelecidas ações para reduzir a intensidade dos motores da perda da biodiversidade, haverá uma aceleração maior na taxa global de extinção, que já é ao menos dezenas a centenas de vezes maior que a média dos últimos 10 milhões de anos", diz o texto.
Regras
O esboço agradou os observadores da COP15, mas também levantou críticas de que faltam regras claras para estabelecer o cumprimento das metas. Também foi motivo de preocupação a ausência dos chamados "mecanismos de catraca" — aparatos, como os compromissos nacionalmente determinados (NDCs) da conferência climática, que permite acompanhar os progressos das nações signatárias.
"Como os países podem aumentar a ambição e as proteções com o passar da década? Se você quer um 'momento de Paris' para a biodiversidade, precisa de um mecanismo de catraca", disse Li Shuo, conselheiro sênior de políticas da ONG Greenpeace. Havia expectativa de que o evento em Montreal tivesse um peso político semelhante ao do acordo fechado em 2015 sobre o clima, na capital francesa.
Um ponto considerado positivo no rascunho foi a inclusão do financiamento para ações de recuperação e conservação da biodiversidade, questão defendida pelo Brasil, entre outros países em desenvolvimento. As nações mais ricas, segundo o texto, devem depositar US$ 20 bilhões anuais em um fundo internacional até 2025, aumentando o valor para, pelo menos, US$ 30 bilhões por ano até 2030. O esboço do acordo prevê que as nações signatárias mobilizem, coletivamente, US$ 200 bilhões de fontes públicas e privadas nos próximos oito anos, com os mesmos fins. "O rascunho destaca a interação entre ambição das metas de proteção e ambição nas finanças. Isso já é um começo", considera Li Shuo.
Há lacunas importantes, porém, que podem comprometer o sucesso da conferência, segundo especialistas. Por exemplo, as metas de proteção podem deixar abertas as portas para continuação de atividades prejudiciais à biodiversidade. O texto fala em "uso sustentável da natureza e dos habitats", sem especificar o conceito. Também foi criticado o fato de, ao contrário do que se esperava, o rascunho não definir regras rígidas de divulgação, por parte de empresas, de seus impactos ambientais.
"Não é um documento perfeito nem que deixa todos felizes, mas é um documento baseado nos esforços de todos nós nos últimos quatro anos", disse Huang Rinqiu, ministro do Meio Ambiente da China. "Fizemos enormes progressos", comemorou ministro canadense Steven Guilbeault, co-anfitrião do evento.
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O que diz o esboço
-- Pelo menos 30% das áreas terrestres e marítimas globais conservadas por meio de sistemas eficazes, geridos de forma equitativa, ecologicamente representativos e bem conectados, de áreas protegidas;
-- Uma redução 50% maior na taxa de introdução de espécies exóticas invasoras e controles ou erradicação de tais espécies para eliminar ou reduzir seus impactos;
-- Reduzir os nutrientes perdidos para o meio ambiente em pelo menos metade, e os pesticidas em pelo menos dois terços, e eliminar o descarte de resíduos plásticos;
-- Contribuições baseadas na natureza para os esforços de mitigação das mudanças climáticas globais de pelo menos 10 GtCO2e por ano. Todos os esforços de mitigação e adaptação devem evitar impactos negativos sobre a biodiversidade;
-- Redirecionar, readaptar, reformar ou eliminar incentivos prejudiciais à biodiversidade, de forma justa e equitativa, reduzindo-os em pelo menos US$ 500 bilhões por ano;
-- Um aumento de US$ 200 bilhões nos fluxos financeiros internacionais de todas as fontes para os países em desenvolvimento.
Fonte: Pnuma/ONU