Nos Andes peruanos, a cidade mineira de La Oroya, no passado um dos locais mais poluídos do planeta, tenta reativar a fundição de metais pesados que foi o motor de sua economia, mas também fez seus moradores adoecerem.
"A grande maioria da população deseja e espera há muito tempo que volte a ser reativada porque é fonte de vida", disse à AFP Hugo Enrique, um taxista de 48 anos.
La Oroya, localizada 175 km a leste de Lima, agoniza desde 2009, à medida que perde moradores e o comércio declina pela quebra, este ano, do enorme complexo metalúrgico que foi o eixo de sua economia desde 1922.
Em quase um século, processou-se na fundição cobre, zinco, chumbo, prata, ouro, bismuto, telúrio, antimônio e selênio, procedentes de minas vizinhas.
Hoje, nesta cidade de cerca de 20.000 habitantes, casas abandonadas e lojas vazias se reúnem ao redor da emblemática chaminé de 167 metros, uma das mais altas da América do Sul. Morros sem vegetação cercam a área urbana, construída 3.750 metros acima do nível do mar.
A economia de La Oroya pode reviver em 2023 se o complexo metalúrgico reabrir, como anunciaram seus ex-funcionários em outubro, após terem se tornado os novos proprietários.
Mas a que custo?
Manuel Enrique Apolinario, um professor de 68 anos, que mora em frente a uma fundição em uma casa de madeira e tijolos desde 1975, disse à AFP que tem em seu organismo níveis elevados de chumbo, arsênico e cádmio.
"Aqui, parecia que o trabalhador ou o comerciante tinha se acostumado a esta modalidade de vida dentro de fumaça e gases tóxicos", afirmou. "Nós que vivemos aqui passamos mal toda uma vida com casos gripais e bronquite, sobretudo [problemas] respiratórios".
Segundo a Federação Internacional de Direitos Humanos (FIDH), em 2013, 97% das crianças com idades entre os seis meses e os seis anos e 98% das de sete a 12 anos, tinham níveis altos de chumbo no sangue.
'Responsabilidade ambiental'
A fundição de La Oroya começou a operar em 23 de novembro de 1922, sob a gestão da americana Cerro de Pasco Corporation. Foi estatizada em 1974 e privatizada em 1997, passando para as mãos de Doe Run, do grupo americano Renco.
Em junho de 2009, Doe Run paralisou os trabalhos por descumprir um programa de proteção ambiental e se declarou insolvente.
Agora, sob o nome de Metalurgia Business Perú, 1.270 ex-funcionários de Doe Run apostam em reabrir em março o complexo de 19.000 hectares, com o compromisso de não poluir.
"Vamos operar com o consentimento da nossa população, com responsabilidade social e ambiental", disse à AFP Luis Mantari, o novo proprietário.
"O que queremos é que este complexo único na América do Sul faça mais 100 anos", enfatizou José Aguilar, chefe de Recursos Humanos.
Cerca de 14 milhões de toneladas de rejeitos ou escória de cobre e chumbo são armazenados no local à espera de conversão.
"Nós, que temos lutado contra a contaminação, nunca nos opusemos ao funcionamento da empresa. Que seja reativada com um plano ambiental", afirmou Pablo Fabián Martínez, de 67 anos.
"Gostaria que reabrisse porque, sem a empresa, La Oroya perdeu toda a sua economia", acrescentou Rosa Vílchez, uma comerciante de 30 anos, cujo marido precisa trabalhar em outra cidade por causa do fechamento.
Respeitar a saúde
Em 2011, La Oroya era a segunda cidade mais contaminada do mundo e dois anos depois tinha caído para o quinto lugar, segundo o Instituto Blacksmith, uma ONG conservacionista com sede em Nova York. Equiparava-se a Chernobyl, na Ucrânia, após o desastre nuclear, ou com o depósito de rejeitos químicos de Dzerzhinsk, na Rússia.
Mas, desde o fechamento da fundição, as concentrações de gases tóxicos diminuíram significativamente, segundo grupos ambientalistas.
José de Echave, diretor da ONG CooperAcción, considerou "legítima a expectativa dos trabalhadores", mas advertiu que "não se pode pensar em criar uma fonte de trabalho às custas de um impacto importante nos ecossistemas".
Em 2006, um grupo de moradores de La Oroya denunciou o Peru à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) por violar seu direito à saúde. Em 2021, a CIDH responsabilizou o Estado peruano e remeteu o caso à Corte Interamericana (CorteIDH), cujas sentenças são vinculantes, e que ainda deve se pronunciar.
Os demandantes alegam que as empresas que controlam a fundição não foram fiscalizadas, permitindo altos níveis de contaminação em detrimento da população.
"Somos conscientes de que o complexo metalúrgico é uma fonte de trabalho. Nós não negamos isso", disse à AFP Yolanda Zurita, uma das litigantes, que planta árvores para mitigar a contaminação. "Mas deve ser uma fonte de trabalho, respeitando a saúde da população", afirmou.
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