Ucrânia

Ucrânia denuncia tortura em porões da cidade de Kherson

Comissário de Direitos Humanos visita cidade reconquistada pelas forças de Kiev e admite que violações não têm precedente. Ao Correio, ele relatou como os presos eram mantidos em masmorras

Rodrigo Craveiro
postado em 18/11/2022 06:00
 (crédito: Bulent Kilic/AFP)
(crédito: Bulent Kilic/AFP)

A oração estava talhada na parede de concreto da masmorra descoberta em Kherson, a cidade do sul da Ucrânia que esteve sob ocupação russa por nove meses: "Deus, nos dê força. Deus, Nosso Senhor, nos salve e nos proteja". Dmytro Lubynets, comissário de Direitos Humanos do Parlamento ucraniano, contou ao Correio que visitou dois locais onde os cidadãos eram mantidos presos. "Eram lugares totalmente insalubres. Os ambientes nos porões não tinham janelas, nem ventilação. Também não havia banheiro nem suprimento de água. Até 20 pessoas eram colocadas em uma sala de 10 metros quadrados", relatou.

De acordo com Lubynets, mulheres e homens permaneciam detidos em um mesmo aposento. "Eles ficavam vários dias sem receber comida. Todos foram torturados, submetidos a espancamentos, choques elétricos, violência sexual e ameaças", disse. O comissário conversou com um homem que esteve preso em um desses porões por 45 dias. "Sob tortura, ele foi forçado a confessar que trabalhava para as Forças Armadas da Ucrânia. Mas nunca teve qualquer ligação com os militares", acrescentou.

Os soldados russos teriam praticado desaparecimentos forçados — uma forma de eliminar cidadãos de Kherson leais ao governo do presidente Volodymyr Zelensky e de intimidar a população em geral. "Depois da retirada dos militares da Rússia, o destino de muitas pessoas foi descoberto. Na região de Kherson, há sepulturas com corpos não identificados e com traços de morte violenta", explicou Lubynets.

Durante inspeções às chamadas "câmaras de tortura", o comissário ucraniano manuseou um pequeno crucifixo feito de madeira e enrolado com fita de cor azul. Uma espécie de símbolo da fé em um ambiente de solidão e de dor. Ele enviou ao Correio a foto de uma parede onde os prisioneiros rabiscavam os dias dentro do cativeiro. Mais cedo, à emissora de televisão nacional, Lubynets descreveu o nível de tortura ocorrida em Kherson como "horroroso". "Nunca vi antes algo assim", admitiu.

Especialista da Escola de Análise Política, em Kiev, Anton Suslov admitiu à reportagem que as atrocidades cometidas por soldados russos não mais causam surpresa. "Desde 24 de fevereiro, vimos o que eles deixaram em Bucha, Irpin, Izium e muitas outras cidades e vilarejos. Ainda recebemos denúncias sobre sequestros e torturas em territórios temporariamente ocupados", disse.

Incidente na Polônia

Ontem, a Ucrânia afirmou que a Rússia é "totalmente responsável" pelo míssil que caiu na localidade de Przewodow, no sudeste da Polônia. O incidente matou dois trabalhadores agrícolas na última terça-feira. "Compartilhamos a opinião de que a Rússia é totalmente responsável por seu terror com mísseis e suas consequências no território da Ucrânia, Polônia e Moldávia", escreveu o ministro das Relações Exteriores ucraniano, Dmytro Kuleba, em seu perfil no Twitter, depois de uma conversa com o homólogo norte-americano, Antony Blinken.

A duas semanas do inverno, o acordo que permite a exportação de grãos oriundos dos portos da Ucrânia foi prorrogado e ficará em vigor durante os quatro meses da estação, que costuma ser rigorosa. "A Iniciativa de Grãos do Mar Negro será prorrogada por 120 dias", disse o ministro ucraniano da Infraestrutura, Oleksandre Kubrakov, referindo-se ao acordo previsto para expirar amanhã. "Trata-se de um passo importante na luta contra a crise alimentar mundial."

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.