No dia seguinte à passagem de Ian — um furacão de categoria 4 na escala Saffir-Simpson (que vai até 5) —, a Flórida começou a contar os seus mortos e os danos catastróficos em cidades costeiras devastadas pela força dos ventos e pelas inundações. "Este pode ser o furacão mais letal da história da Flórida", alertou o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, ao visitar o escritório da FEMA, a agência federal que gerencia a resposta a desastres naturais, em Washington. "Os números (...) ainda não são claros, mas recebemos informações que dão conta de uma perda substancial de vidas. (...) Diante do grave perigo, as operações de busca e de resgate se iniciaram antes do amanhecer", acrescentou.
De acordo com o governador da Flórida, Ron DeSantis, o estado "nunca tinha visto inundações como estas". "Algumas áreas como Cape Coral, na cidade de Fort Myers, foram inundadas e ficaram totalmente devastadas por esta tempestade", afirmou o governador, ao classificar a destruição como "histórica". Imagens aéreas divulgadas nas redes sociais mostravam casas praticamente arrancadas do chão, barcos empilhados e ruas submersas. O xerife do condado de Lee, Carmine Marceno, chegou a falar em "centenas de mortos", durante entrevista ao programa Good Morning America, da emissora ABC News.
Até o fechamento desta edição, mais de 2,5 milhões de pessoas permaneciam sem acesso à energia elétrica. As autoridades da Flórida anunciaram que pelo menos 500 moradores foram resgatados da porção sudoeste da península. Os prejuízos financeiros começaram a ser estimados. A empresa Fitch Ratings avaliou que as perdas cobertas pelo seguro podem variar de US$ 25 bilhões a US$ 40 bilhões.
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Retomada
A Administração Nacional Oceânica e Atmosférica (NOAA) revelou que em algumas das áreas mais afetadas, o nível de chuva foi o maior em mil anos. Na tarde de ontem, Ian voltou a ganhar força e a passar de uma tempestade tropical a um furacão, com ventos sustentados de 120km/h. A previsão é de que ele atinja a Carolina do Sul nas próximas horas.
"Perdemos todo o nosso restaurante, que funcionava em Fort Myers Beach desde 2009. Tenho quase 70 funcionários. É uma perda devastadora", lamentou ao Correio Bruce McElhone, 39 anos, gerente do Salty Crab. Ele deixou a região e se refugiou na costa oeste da Flórida. "Na terça-feira, assim que soubemos que um furacão de categoria 5 vinha em nossa direção, eu, minha esposa e minhas duas filhas fugimos. Foi muito difícil deixar nossa cidade sabendo que nem todos fariam o mesmo. Ficamos nervosos com o que encontraríamos ao retornarmos", acrescentou Bruce.
Segundo o empresário, Fort Myers Beach está sem internet, cabo, água e eletricidade. "É como um país do Terceiro Mundo. Há um toque de recolher, que manterá as pessoas em casa até as 18h de amanhã (hoje)", relatou, depois de conversar com funcionários. "Eles tiveram que ir até o estacionamento de um hospital para obterem sinal de celular." Bruce contou que todo o primeiro andar do sobrado onde vive e a garagem estão alagados.
"Eram barulhos assustadores, com escombros voando por todas as partes, portas no ar", relatou à agência France-Presse Tom Johnson, um morador de Fort Myers que testemunhou a destruição. Na pequena cidade de Iona, na costa oeste, Ronnie Sutton, que foi forçado a fugir, se disse convencido de que a água destruiu tudo. "É terrível. Penso que é o preço a se pagar quando se vive no nível do mar. Às vezes, o tiro sai pela culatra."
Diretor do Instituto de Eventos Extremos da Universidade Internacional da Flórida (em Miami), Richard Olson explicou à reportagem que alguns fatores potencializam a destruição causada por Ian. "Além do tamanho e da intensidade da tempestade, a Flórida está relativamente densamente povoada, principalmente nas áreas costeiras. Isso significa altos impactos humanos e comunitários", disse.
Olson avalia os danos am áreas baixas a oeste do Golfo do México como "castastróficos", provocados pelos fortes ventos e pelas inundações. "Ian se moveu para frente e lentamente, trazendo uma enorme quantidade de chuvas."