Especialistas ucranianos em medicina legal começaram, ontem, a exumação de 450 corpos que teriam sido encontrados em uma floresta de pinheiros de Izyum, cidade situada a 120km de Kharkiv, no nordeste da Ucrânia. O presidente do país, Volodymyr Zelensky, disse que centenas de jornalistas testemunharam o trabalho dos legistas ao desenterrar os cadáveres sepultados nas covas coletivas. "Hoje, o mundo deve ver o que o Exército russo deixou para trás. Outra fossa comum com pessoas assassinadas. Crianças e adultos, civis e militares. Torturados, executados a tiros, mortos por bombardeios", declarou, em vídeo transmitido pela internet. "Uma família inteira está enterrada ali: pai, mãe e filha. Mais de 400 túmulos estão na floresta perto de Izyum", acrescentou.
Izyum ficou seis meses em poder das forças russas e foi libertada em uma contraofensiva ucraniana recente. "Ainda não sabemos quantos corpos estão lá, pois a exumação apenas teve início. Hoje, recebemos evidências de mais atrocidades cometidas durante a ocupação russa. Encontramos o corpo de uma pessoa, estrangulada com uma corda ao redor do pescoço. Cadáveres com braços fraturados e outros sinais de abusos. Uma cova coletiva com soldados assassinados, 17 corpos. Alguns deles com indícios óbvios de tortura", afirmou Zelensky, ao denunciar um exército de "assassinos" e "torturadores".
"Vimos Bucha, vimos Mariupol. Agora, Izyum. Quanto tempo mais isso pode durar?", questionou o presidente. Ele exortou a comunidade internacional a considerar a Rússia um Estado patrocinador do terrorismo. Em entrevista ao Correio, o prefeito de Izyum, Valery Marchenko, denunciou um "genocídio do povo ucraniano" e classificou como "terror brutal e sangrento" o que ocorreu na cidade que administra há sete anos (leia ao lado).
O chefe da polícia ucraniana, Igor Klimenko, também anunciou que as autoridades encontraram dez supostos "centros de tortura" na região de Kharkiv, dois deles na cidade de Balakliya. Por meio do aplicativo de mensagens Telegram, o Defensor do Povo ucraniano, Dmitro Loubinets, estimou em mais de mil cidadãos ucranianos "torturados e assassinados nos territórios libertados".
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Reação
A comunidade internacional reagiu com indignação à descoberta das covas. "Os relatos de um túmulo coletivo com 450 homens, mulheres e crianças em Izyum, na Ucrânia, são de partir o coração e deveriam galvanizar nosso apoio aos bravos ucranianos que buscam libertar sua pátria. Nós estamos com a Ucrânia na busca da responsabilização por esses crimes", declarou o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken. O presidente da França, Emmanuel Macron, disse que condena "nos mais fortes termos possíveis as atrocidades" em Izyum. "Os autores serão responsabilizados por suas ações. Não há paz sem justiça", escreveu no Twitter.
A União Europeia (UE) externou "profunda consternação" pelas "atrocidades". O chefe da diplomacia do bloco, Josep Borrell, destacou que "este comportamento desumano das forças russas (...) deve cessar imediatamente". O Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos defendeu o envio de peritos para "determinar as circunstâncias da morte dessas pessoas".
A deputada ucraniana Inna Sovsun, vice-presidente da Faculdade de Economia de Kiev, contou ao Correio que, quando viu a foto da cova coletiva em Izyum, lembrou-se de Bucha. "Naquele momento, não poderíamos imaginar que tal coisa fosse possível. Mas vimos os corpos. Centenas. Cadáveres de civis, crianças com as mãos atadas, mulheres. O massacre de Bucha não foi um caso isolado, mas uma política proposital de extermínio de ucranianos", disse.
De acordo com Sovsun, a descoberta perto de Izyum é "prova dessa política de genocídio". "Acharemos covas similares em todos os territórios liberados", acrescentou a parlamentar. Durante cúpula no Uzbequistão, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, foi pressionado pelo colega turco, Recep Tayyip Erdogan, a encerrar o conflito "o quanto antes". O premiê indiano, Narendra Modi, repetiu o líder chinês, Xi Jinping, e mostrou preocupação com a guerra. Putin tornou a se reunir com Xi e assegurou que deseja pôr fim à invasão "o mais rápido possível", mas avisou: "Não temos pressa".