Tudo começou com o comentário de uma professora de dança a uma menina de nove anos: "você está gorda". Em seguida veio o assédio escolar.
O bullying é alvo da Justiça na Venezuela, onde 84 adolescentes foram acusados entre janeiro e junho de 2022, informou o procurador-geral, Tarek William Saab, que impulsiona um projeto de lei sobre o assunto.
"Eu ia para as aulas de dança para aproveitar, aprender e todos falavam: 'vejam a gorda...'", relata à AFP Iris, nome fictício para proteger sua identidade.
"Deixei de comer. De 'gorda' passei a 'fraca'", conta a jovem, agora com 15 anos.
Segundo especialistas, o bullying traz consequências sérias como insônia, ansiedade, depressão e até mesmo suicídio.
Há alguns meses, um jovem de 14 anos no estado de Mérida (oeste), assediado por problemas de dicção, tentou se suicidar tomando herbicida.
O Ministério Público registrou 341 casos de violência escolar no primeiro semestre, a maioria, 207, com lesões. Nove se desdobraram em investigações contra profissionais da educação, acusados de "omissão".
A legislação do país estabelece responsabilidade penal a partir dos 14 anos, com penas máximas de 10 anos de prisão.
Organizações defensoras de crianças e adolescentes como CECODAP celebraram o debate sobre o bullying, que piorou com a pandemia, mas alertaram para a necessidade de "políticas socioeducativas".
Elas destacam ainda que a crise econômica venezuelana aumentou a "vulnerabilidade".
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"Se pune, previne"
"Quando você pune, você previne um delito. Quando não há impunidade, conseguimos prevenir", disse Saab em entrevista à AFP. "O fato de ser menor de idade não lhe dá imunidade".
Saab propôs ao Parlamento o projeto de Lei de Convivência Pacífica Escolar, com a qual pretende desenvolver "programas de proteção".
No encerramento do ano acadêmico 2021-2022, o Ministério Público promoveu um "plano de prevenção" com conversas entre estudantes, pais, professores e funcionários de escolas com informações sobre o bullying e suas consequências penais.
"Não ao assédio escolar! Se vir algo, denuncie", diziam os panfletos distribuídos por estudantes na maior comunidade da Venezuela, a Petare, que fica na região metropolitana de Caracas.
O Ministério Público espera "massificar" estas atividades no próximo ano escolar, que começa em setembro.
No entanto, Oscar Misle, diretor da CECODAP, ONG que oferece atendimento psicológico e jurídico gratuito a crianças e adolescentes, destacou a importância da implementaçãode "políticas socioeducativas".
Mais de 50% dos estudantes na América Latina já sofreram assédio escolar, segundo a UNICEF.
Países como Argentina, Colômbia e Paraguai promulgaram leis contra o bullying. O Brasil não possui uma normativa sobre o tema e conta apenas com alguns programas preventivos.