Se havia alguma esperança de paz próxima para o conflito na Ucrânia, ela se esvaneceu após as últimas declarações de Serguei Lavrov, ministro das Relações Exteriores da Rússia. "Eles (diálogois de paz) simplesmente não serão capazes de articular nada que mereceria a atenção séria de pessoas sérias", afirmou à agência France-Presse. "Não fazem nenhum sentido na atual situação." Mas foi outra declaração de Lavrov que tem o potencial de preocupar a comunidade internacional. Em discurso televisionado, Lavrov anunciou que Moscou planeja ocupar permanentemente amplas áreas do sul da Ucrânia, em um aceno de novas anexações do território ucraniano por parte da Rússia — em 2014, as forças do presidente Vladimir Putin haviam anexado a Península da Crimeia.
"Agora, a geografia é diferente. Não se trata apenas de Donetsk e e Luhansk. É Kherson, Zaporizhzhia e um número de outros territórios. Isso é um processo em andamento, consistente e insistente", anunciou Lavrov. John Kirby, porta-voz do Conselho de Segurança Nacional dos Estados Unidos, disse acreditar que as primeiras anexações possam ocorrar em setembro, quando a Ucrânia realizará eleições regionais. "A Rússia começa a lançar uma versão do que poderia chamar um 'manual de anexação', muito similar ao que vimos em 2014", advertiu. "O governo russo revisa planos detalhados para supostamente anexar um número de regiões na Ucrânia, incluindo Kherson, Zaporizhzhia, toda a região de Donetsk e Luhansk."
Para Olexiy Haran, professor de política comparativa da Universidade Nacional de Kiev-Mohyla, as declarações de Lavrov são "uma clara demonstração de que a Rússia é o poder agressor". "Ela quer conquistar partes de um Estado vizinho e deveria ser totalmente denunciada pela comunidade internacional por isso. Lavrov está revisando os planos da guerra", afirmou ao Correio. "Vale lembrar que, no início da guerra, o Kremlin havia anunciado o que chamou de 'operação militar especial' para liberar Donbass (leste) e para derrubar o presidente Volodymyr Zelensky. Isso fracassou. Foi então que decidiram continuar a 'liberar' o Donbass. Agora, Lavrov está expandindo a agressão russa."
Ainda segundo Haran, as autoridades russas estão apontando "governos" nas partes ocupadas de Kherson e de Zaporizhzhia. "Esses governos são liderados por cidadãos russos vindos da Rússia. Em vez de ocultar seus planos, a Rússia divulga suas intenções", ironizou. "É como Adolf Hitler fez. Primeiro, ele disse que defenderia os direitos dos alemães sobre a Tchecoslováquia; depois, capturou e dividiu aquele país. Então, mirou a Polônia e a França."
Ao Correio, o encarregado de negócios da Embaixada da Ucrânia em Brasília, Anatoly Tkach, lembrou que seu país sempre tratou a ofensiva russa como uma "guerra de expansão". "As confissões do ministro das Relações Exteriores da Federação Russa sobre os sonhos de conquistar mais terras ucranianas provam que a Rússia segue focada na guerra e no terror. A Ucrânia precisa continuar a se defender", declarou.
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Pedido
"Os russos querem sangue, não negociações. Peço aos parceiros que endureçam as sanções contra a Rússia e acelerem as entregas de armas à Ucrânia", desabafou Dmytro Kuleba, ministro ucraniano das Relações Exteriores. O pedido foi em resposta à desqualificação do processo de paz, por parte de Lavrov, e ao anúncio do chanceler russo de que a guerra não se concentraria "apenas" no leste. "A confissão do ministro russo das Relações Exteriores de seu sonho de se apoderar de mais terras ucranianas mostra que a Rússia rejeita a diplomacia e se concentra na guerra e no terror."
A Rússia manteve os bombardeios no leste e no sul da Ucrânia. Mísseis caíram sobre o Donbass. Em Kramatorsk, cidade de 157 mil habitantes que está na mira da ocupação russa, uma pessoa morreu. Em Kharkiv, no leste, um garoto de 13 anos morreu depois que um míssil destruiu uma mesquita e estilhaços atingiram o ponto de ônibus em que ele estava.