Assim que Joe Biden desembarcou no Aeroporto Internacional Ben Gurion, em Tel Aviv, a 9.437km dali, os Estados Unidos enfrentavam a maior inflação em 40 anos e meio — 9,1%. Foi nesse cenário, de popularidade e economia em queda, que o presidente democrata começou o seu primeiro tour pelo Oriente Médio com os objetivos de reafirmar o apoio "inabalável" a Israel, forjar uma coalizão internacional contra o Irã e se aproximar da Arábia Saudita, no momento em que a guerra entre Rússia e Ucrânia põe em xeque o acesso ao petróleo. A visita, hoje, a Belém (Cisjordânia) e o encontro com o colega palestino Mahmud Abbas também sinalizam uma tentativa de Biden de debater uma solução para o conflito entre árabes e judeus. Segundo o jornal israelense Haaretz, como os assessores de Washington e de Ramallah não chegaram a um consenso sobre uma declaração única, os dois líderes discursarão em separado.
"Maior paz, maior estabilidade, maior conexão. É algo crítico, é fundamental, se posso acrescentar, para todas as pessoas da região. Por isso discutiremos meu apoio contínuo, mesmo sabendo não ser no curto prazo, por uma solução baseada em dois Estados", declarou Biden. "Essa continua a ser, na minha opinião, a melhor forma de garantir o futuro de igual medida de liberdade, prosperidade e democracia para israelenses e palestinos." O presidente dos EUA também citou o processo de reaproximação entre Israel e algumas nações árabes. "Vamos continuar avançando para a integração de Israel na região", prometeu. "Reafirmamos o nosso compromisso inabalável dos Estados Unidos com a segurança de Israel, incluindo a parceria nos sistemas de defesa mais avançados do mundo."
Ainda no aeroporto, ele assistiu a uma apresentação sobre o Domo de Ferro, o sistema antimísseis de Israel, e o Feixe de Ferro, um dispositivo de resposta a laser antidrone. Na passagem pelo Memorial de Shoah (genocídio dos judeus na Alemanha nazista), em Jerusalém, Joe Biden se emocionou. Usando um quipá preto, depositou flores no local e abraçou duas sobreviventes do Holocausto. "Nunca devemos esquecer porque o ódio nunca perece", escreveu o presidente democrata, no livro de visitas.
O primeiro-ministro de Israel, Yair Lapid, classificou a visita de Joe Biden como "histórica e profundamente pessoal". "É histórica por expressar o vínculo inquebrável entre nossos dois países. Nosso compromisso com valores compartilhados: democracia, liberdade e o direito do povo judeu a um Estado próprio", afirmou, ao lembrar que o presidente dos EUA intitulou-se "sionista". Lapid confirmou que conversaria com Biden sobre a ameaça das armas atômicas desenvolvidas por Teerã. "Nós debateremos a necessidade de renovar uma forte coalizão global que detenha o programa nuclear iraniano."
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"Liderança renovada"
Professor de ciência política da Universidade Bar Ilan, em Ramat Gan (subúrbio de Tel Aviv), Gerald Steinberg explicou ao Correio que Biden busca demonstrar uma liderança renovada no Oriente Médio. "Ao realizar a primeira escala em Israel, os EUA reforçam o compromisso com a segurança do Estado israelense, por meio da expansão da cooperação regional contra a ameaça iraniana." Ele aposta que Biden repetirá o apoio da Casa Branca a uma solução para o conflito israelo-palestino baseada em dois Estados, apesar de reconhecer que não existem condições de progresso.
Para Gerald Steinberg, a mudança de prioridade da política externa de Washington em direção ao Oriente Médio tem relação com a crise econômica e o alto custo da energia — consequência da invasão russa à Ucrânia. "Isso exige a reconciliação norte-americana com a Arábia Saudita, a fim de aumentar a produção petrolífera e defender os sauditas de ataques iranianos", disse o professor.
Especialista em Oriente Médio pela Universidade de Princeton, o iraniano Seyed Hossein Mousavian afirmou à reportagem que o ex-presidente Donald Trump vinculou a aliança entre EUA, Israel e países árabes a uma política de "pressão máxima". "Em troca, o Irã ampliou sua influência, ao expandir o programa nuclear e ao investir em aliados regionais, o que levou a um aumento de 400% no número de ataques às tropas americanas somente no Iraque", lembrou o especialista. Para alcançar a paz sustentável na região, os EUA precisam envolver os atores regionais, apoiar as negociações entre Riad e Teerã e reviver o JCPOA, o acordo internacional sobre o programa nuclear iraniano firmado em 2015.